Edit Template

José Enes: Ilustre Lajense

Ao fim da tarde, quando o sol quente se encobre sob o mar, os visitantes não resistem à policromia de cores que pintam as nuvens, o oceano e a Montanha, num espetáculo inolvidável que só os grandes artistas sabem descrever.
Esta Ilha está repleta de balcões, de mirantes, de miradouros. Deles se avista outras ilhas, horizontes, por vezes a Montanha, tradicional e infalível símbolo meteorológico das andanças das nossas gentes. Esses sinais desenhados pelo vento nas nuvens, tornaram-se uma linguagem de grande relevância que importa salvaguardar como património de um “saber de experiências feito” que deve perdurar para as gerações vindouras.
Sentado sobre o muro da Avenida marginal da primeira povoação da Ilha – as Lajes – tenho à esquerda o antigo e recuperado moinho do Juncal e à direita a muralha de proteção em fase final de recuperação, fortemente abalada pelo furacão Lorenzo.
Perante este quadro, absorvo-me num passado que me evoca os anos da infância.
Quantas mudanças no traçado litoral urbano da Vila e nas geografias de antigamente!… Quantas ausências de amigos e familiares, para nunca mais!…
Já não se sente o cheiro fedorento do desmanchar e derreter cetáceos na rampa da fábrica junto ao Portinho, ou odores dos escalhos que se desfaziam junto à costa. Já não há óleo retido nas casas dos botes à espera de melhor preço, nem carcaças a descarnar na Lagoa, onde permanecem afundados valiosos dentes de marfim.
Dessa importante atividade industrial que enriqueceu alguns e atenuou a pobreza em tantos lares necessitados, preservou-se as vivências da atividade dos baleeiros no mar e em terra. Esse valioso espólio está “vivo” no Museu dos Baleeiros, o mais visitado dos Açores.
Permanecem ainda no sangue e na alma desta gente, muita dela emigrada na América do Norte, receios antigos dos riscos da baleação e a inerente coragem, valentia e temor religioso dos oficiais, trancadores e remadores dos botes, expressa na Procissão em Honra de Nossa Senhora de Lourdes. Mantém-se também, pelas festas, em muitas localidades baleeiras, as regatas a remos e à vela, onde se consagrava como heróis os remadores mais potentes e os melhores mestres da arte de navegar.
Esta cultura e identidade baleeiras, foi a raiz de novas atividades empresariais, criadas, para proteger aquelas espécies marinhas.
A Observação de Cetáceos traz diariamente às Lajes centenas de visitantes e constitui aposta ganha, iniciada por Sèrge Viallelle.
Outros seguiram-lhe as suas pegadas noutros locais e noutras ilhas do arquipélago, onde os cetáceos passeiam tranquilamente a sua enormidade.

As Lajes do Pico, hoje, estão diferentes. Para melhor, certamente, se bem que tenham perdido população. Folgo com isso, embora haja muito a mudar, para que quem nos visita ou aqui vive, tenha melhores condições.
As Lajes e o concelho são, de há muito, um polo diferenciador de agentes e eventos culturais em áreas como: a História, a Literatura, a Música, a Imprensa, a Religião e outros ramos do saber.
A Semana dos Baleeiros, ao longo de mais de três décadas, teve a preocupação de ser mais do que um festival musical. Associada às celebrações religiosas em Honra da Padroeira dos Baleeiros – Nossa Senhora de Lourdes – houve a preocupação de integrar uma semana de reflexão e estudo sobre a problemática local, numa perspetiva universal com distintos académicos e investigadores açorianos, normalmente acompanhadas pela edição e apresentação de livros patrocinados pelo Município.
Vem de há muito esta apetência cultural das Lajes. Ela deve-se sobretudo à formação cultural e científica de cidadãos que se afirmaram noutros espaços de maior dimensão.
É muito vasto esse escol de personalidades nascidas no concelho das Lajes do Pico que a História sempre recordará.
José Enes Pereira Cardozo, entre muitos outros, foi um dos mais ilustres. O centenário do seu nascimento foi celebrado na Silveira, sua terra natal, no passado dia 19 de agosto, dia da Festa de São Bartolomeu e data do seu batizado.
A família decidiu assinalar a data do seu nascimento no “seu” Pico que tanto amava, com alguns eventos, entre as quais uma Eucaristia e uma cerimónia evocativa em que participou o Grupo Coral das Lajes do Pico que interpretou o poema “Montanha do Meu Destino”, com música do falecido Maestro lajense, Manuel Emílio Porto.
Dois dias depois, ocorreu o lançamento do livro “AÇORES NO CORAÇÂO – textos de crítica literária e cultural”.
Segundo afirmou na ocasião a Professora Maria Fernanda Enes, sua esposa, “pareceu-nos justo e oportuno resgatar do esquecimento um conjunto de escritos de temática açoriana que se encontram dispersos e, alguns deles, inéditos.”
Na cerimónia intervieram também os Professores Teodoro de Matos e Onésimo Almeida e a Presidente da Câmara Municipal das Lajes.
Ana Brum anunciou que a edilidade proporá ao Governo dos Açores o nome de José Enes para patrono da Escola Básica e Secundária das Lajes do Pico. Já em 1999 o Município atribuíra-lhe o título de Cidadão honorário do Concelho.
Para quem toda a vida se devotou ao ensino, à promoção da cultura e do desenvolvimento do Pico e dos Açores, é uma homenagem que se deve relevar.
Falta agora o reconhecimento da Universidade dos Açores que ele sonhou, criou e dirigiu como primeiro Reitor.

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

Edit Template
Notícias Recentes
Emigrante açoriano em risco de ser deportado nesta nova era Trump
Antigos Combatentes dos Açores já podem beneficiar de descontos nos medicamentos
Novobanco dos Açores com lucros de 10,9 milhões de euros em 2024
Bolieiro enaltece papel do Turismo Rural no crescimento do sector na Região
“First Date” de Luís Filipe Borges com sucesso internacional
Notícia Anterior
Proxima Notícia

Copyright 2023 Diário dos Açores