Os consumos mínimos constituem uma afronta ao princípio da protecção dos interesses económicos do consumidor. Que se acha consagrado na Constituição da República.
De acordo com o princípio, o consumidor só deve pagar o que consome e na exacta medida do que e em que consome.
Se consumiu 10, não tem de pagar 20 só porque há uma qualquer disposição regulamentar que estabelece que qualquer consumo abaixo dos 20 obriga ao pagamento desse limite mínimo.
No que toca aos serviços públicos essenciais, há norma expressa desde que a lei se promulgou.
Eis o que diz, no seu artigo 8.º, sob a epígrafe “consumos mínimos e contadores”, a Lei dos Serviços Públicos Essenciais:
“1 – São proibidas a imposição e a cobrança de consumos mínimos.
2 – É proibida a cobrança aos utentes de:
a) Qualquer importância a título de preço, aluguer, amortização ou inspecção periódica de contadores ou outros instrumentos de medição dos serviços utilizados;
b) Qualquer outra taxa de efeito equivalente à utilização das medidas referidas na alínea anterior, independentemente da designação utilizada;
c) Qualquer taxa que não tenha uma correspondência directa com um encargo em que a entidade prestadora do serviço efectivamente incorra, com excepção da contribuição para o audiovisual;
d) Qualquer outra taxa não subsumível às alíneas anteriores que seja contrapartida de alteração das condições de prestação do serviço ou dos equipamentos utilizados para esse fim, excepto quando expressamente solicitada pelo consumidor.
…”
No entanto, desde que a lei veio a lume que as artimanhas dos fornecedores e prestadores de serviços não cessam de impressionar com as múltiplas máscaras que afivelam aos consumos mínimos:
Na água chamam-lhe quotas ou taxas de disponibilidade (fixa e variável), taxas ou quotas de serviço, taxas de volumetria, parte fixa (por contraposição com a parte variável em função dos consumos efectivos, reais ou ‘estimados’…);
Na energia eléctrica designam-na como taxa de potência, variável consoante as modalidades.
No gás, termo fixo natural (vá-se lá saber o que quer significar uma tal designação …).
O facto é que a Lei dos Serviços Públicos Essenciais, não tarda, perfará 28 anos (26 de Julho de 1996).
E jamais houve quem se propusesse extirpar do ordenamento real os consumos mínimos disfarçados, dissimulados sob inúmeros disfarces.
Com uma excepção: a ACOP – Associação de Consumidores de Portugal – instaurou uma acção, em ano recuado, contra as Águas da Figueira, S.A., que andou de Herodes para Pilatos até se definir (mal…) o tribunal competente. E a juiz titular do cargo no Tribunal Administrativo e Fiscal de Coimbra denegou razão à associação, numa desastrada decisão que de todo se não consentia num adequado enquadramento fáctico-normativo.
Os montantes de que se acham despojados os consumidores correspondem às vantagens ilícitas colhidas em espiral pelos fornecedores e prestadores de serviços: “de tostão em tostão enche a mula o vilão”!
O facto é que não há quem se apreste e alterar o “statu quo” e a lei é violada, violentada mês-a-mês pela sanha avassaladora das empresas privadas e municipais que exploram os serviços públicos essenciais.
Os consumos de água, p. e., são de 10, como o denunciava alguém há dias; as taxas (que acrescem e não se acham incluídas nos preços, como manda a lei), de 40…
Isto passa-se nas barbas das entidades reguladores com um despudor imenso das empresas e serviços e sem uma adequada solução à vista!
Ora digam lá que não é uma maravilha ser-se consumidor nestas que outrora foram as Terras de Santa Maria ungida sob as bênçãos da Virgem?
São taxas “abençoadas”… e ninguém ousa afrontá-las no regabofe reinante!
E em quanto se acham esportulados os consumidores desde 5 de Agosto de 1996, data em que a lei entrou em vigor?
Mário Frota*
*Presidente emérito da apDC – DIREITO DO
CONSUMO – Portugal