Ora (direis) ouvir estrelas! Certo,
Perdeste o senso!” E eu vos direi, no entanto,
Que, para ouvi-las, muita vez desperto
E abro as janelas, pálido de espanto…
E conversamos toda a noite,
enquanto a Via-Láctea, como um pálio aberto,
Cintila. E, ao vir do sol, saudoso e em pranto,
Inda as procuro pelo céu deserto.
Direis agora: “Tresloucado amigo!
Que conversas com elas? Que sentido
Tem o que dizem, quando estão contigo?”
E eu vos direi: “Amai para entendê-las!
Pois só quem ama pode ter ouvido
Capaz de ouvir e e de entender estrelas.
Olavo Bilac
O espetáculo do céu e a realidade da terra
Estes primeiros dias de Fevereiro- sob o signo das estrelas que surprendemos desde as poças dos Mosteiros até à ponta oriental do Nordeste- constituem o regresso a um dos fenómenos celestes que se repetem, se multiplicam e nos fascinam através da ilha de São Miguel.
As estrelas inserem – se na origem remota de cada terra, dos municipios, das freguesias e das paróquias inventariadas por Ernesto do Canto na« Historia das igrejas, ermidas e altares». Mas as estrelas também se encontram assinaladas nas várias épocas da História da Literatura Portuguesa. Destacam – se ao longo dos dez cantos d’Os Lusiadas», nos sonetos e nas odes de Antero, na obra ortónima e heterónima de Fernando Pessoa. Basta citar os poemas Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Alvaro de Campos Têm uma voz própria nas suas diferenças e complementaridades.
Em relação aos Açores as estrelas permanecem vivas e errantes na obra dos seus grandes poetas e escritores de expressão regional, nacional e universal .Tais como Gaspar Frutuoso, nas Saudades da Terra e nas Saudades do Céu; Roberto de Mesquita nas Almas Cativas; Vitorino Nemesio, no Bicho Harmonioso e na Festa Redonda , sem esquecer os sucessivos capítulos de Mau Tempo no Canal, onde aprofundou as raízes da nossa identidade e a nossa afirmação como cidadãos do mundo.
Ainda a propósito do inicio do mês de Fevereiro e da Festa das Candeias é possível estabelecer no trajeto da memória uma aproximação com a obra de um grande poeta brasileiro Olavo Bilac (1865-1918), autor de Ouvir Estrelas, um dos mais belos sonetos incluídos em todas as antologias da língua e da literatura portuguesas.
É evidente que A Semana de Arte Moderna de São Paulo de 1922 deu lugar ao aparecimento e à consagração de poetas notáveis poetas do Brasil como Manuel Bandeira, Osvaldo de Andrade , Mário de Andrade e, posteriormente, Carlos Droummd de Andrade. Apesar tudo, o nome e a obra de Olavo Bilac continuou a ter um lugar próprio.
António Valdemar