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Desportistas açorianos do meu tempo

Prefácio:
Pediu-me o Eduardo Monteiro umas palavras para servirem de prefácio ao seu livro “Desportistas Açorianos do meu tempo” o qual certamente se tornará num best-seller açoriano. Farei o possível por me desempenhar da tarefa invocando algumas recordações relacionadas com o Eduardo e comigo ao longo da nossa já vetusta existência.
O Eduardo é um daqueles continentais que se açorianizou ao ponto de hoje ninguém deixar de dizer que ele é açoriano. Como vivia na Base da Lajes era um dos alunos do Liceu de Angra que diariamente fazia a viagem no autocarro azul, militar evidentemente, que percorria os cerca de vinte quilómetros que separam Angra da Base. Fomos colegas de turma já vão uns bons setenta anos e já então o Eduardo se distinguia pelo seu entusiasmo pelo desporto que praticava no liceu e no Sport Club Angrense, umas das glórias desportivas da cidade. Todos lhe gabavam a habilidade, o entusiasmo e a persistência. A sua modalidade de elite era já o basquetebol que na Terceira se ia tornando muito popular sobretudo por ser praticado na comunidade militar americana estacionada na Base Aérea nº 4, (a base americana, como todos lhe chamavam) onde existiam instalações desportivas de luxo, coisa que os Açores em geral nem sonhavam ter.
Eu por mim dava-me bem com o Eduardo e também o admirava, mas estava nos antípodas das suas preferências. Cumpria com a obrigação da educação física do currículo liceal, as aulas de ginástica, como se dizia na gíria estudantil, mas não se pode afirmar que isso me motivasse. As instalações do liceu, no velho refeitório e cozinha dos frades, eram péssimas, paupérrimas e inconcebivelmente desconfortáveis. O nosso professor, Monteiro Pais, era um homem afável, que devido às circunstâncias, animava os entusiastas pelo desporto (sobretudo os desportos coletivos) e simplesmente se conformava com aqueles outros que se limitavam a comparecer disciplinadamente às aulas, mas que eram pouco ou nada participativos. Era como um pacto silencioso entre o mestre e os discípulos “manhosos”. Uma santa aliança!
Com o correr do tempo, acabado o curso geral (o 5ºano) separamo-nos inexoravelmente. Eu fui para as “letras” e o Eduardo para as “ciências”, eu para a Universidade de Lisboa e o Eduardo para o Instituto Nacional de Educação Física (INEF), hoje Faculdade de Motricidade Humana da Universidade de Lisboa. Ele transformou-se numa estrela a nível nacional como praticante desportivo universitário e federado, como professor de educação física no liceu e mais tarde na universidade e ainda como treinador do Benfica e de seleções nacionais, tudo como se pode ler no seu admirável currículo.
Só com o 25 de Abril e com o entusiasmo com uma autonomia política para as nossas ilhas nos voltaríamos a encontrar. Já vos digo como.
Em 1976, aprovada a Constituição da República Portuguesa, nela se consagraram os órgãos de Governo Próprio da Região Autónoma dos Açores. Na formação do primeiro Governo Regional (1976-1980) assumi a pasta da Secretaria Regional de Educação e Cultura, cabendo-me a tarefa de estruturá-la em quatro direções regionais. Uma para os Assuntos Culturais, outra para a Educação e outra ainda para a Administração Escolar, e uma última para o Desporto. Quanto a esta desde cedo se levantaram sérias dificuldades quanto ao seu conteúdo, porque eu decidi que nela se deviam reunir todas as linhas políticas do programa do governo para a área do desporto, fosse ele o escolar ou o federado. Isto porque me parecia que se tratava de um todo. Além disso, por serem complementares as tarefas e aplicáveis a todas as ilhas açorianas em benefício dos alunos e dos cidadãos que praticavam desporto.
Publicamente discordaram da minha visão os professores de educação física que preferiam que o desporto escolar fosse integrado na área pedagógica e não articulado com o desporto federado. Os dirigentes do desporto federado também alguns se opunham, ainda que mais suavemente à política definida.
Evidentemente que enquanto o desporto escolar era da tutela da secretaria, no referente ao desporto federado ela não existia, senão nos apoios que competiam à política desportiva governamental, não cabendo a esta interferir na sua autonomia.
No primeiro governo regional tratou-se essencialmente de questões de política, da transferência dos poderes efetivos do governo da República para o Regional. Terminada essa tarefa, a meio do mandato, ensaiaram-se as novas perspetivas com altos e baixos na sua execução. Mas é preciso dizer-se que encontrei sérias dificuldades para entusiasmar colaboradores nesta área. Como voltei a ser nomeado para o Segundo Governo Regional (1980-1984) nas mesmas áreas, as críticas à politica desportiva renasceram e tive eu de assumir provisoriamente a tutela da direção regional dos desportos.
Dito isto, assim resumidamente, resolvi então pedir socorro ao Eduardo, já no auge do seu prestígio como mestre nestas áreas. Julgo poder dizer que ele era concordante com o essencial da política desportiva definida no programa do Governo.
Encontrei desde a primeira conversa entre ambos a melhor boa vontade e entusiasmo para assumir a responsabilidade como diretor regional da educação física e desporto. Foi a partir daí que tudo mudou porque as virtudes pessoais e as sólidas bases científicas do Eduardo garantiram o êxito do desporto açoriano. Ele próprio traçou na sua continuada colaboração na imprensa regional e nacional as explicações necessárias a esse percurso além das razões técnicas e políticas das várias decisões tomadas.
Basta dizer que depois de uma deriva, já fora do seu mandato, que pouco durou, de se separar a Direção Regional do Desporto da Secretaria Regional da Educação e Cultura se percebeu o erro cometido e se emendou a mão dando razão ao Eduardo, porque se deu continuidade a uma política desportiva que ele sabiamente aplicou a qual garantia uma cobertura de todas as ilhas e de todas as escolas como base da democratização no desporto dos Açores.
O reconhecimento de tudo isto na última Gala do Desporto Açoriano em 2024 acentuou-se com uma homenagem ao Eduardo Monteiro e com a atribuição de um galardão do Governo Regional. Foi um ato de justiça.

Reis Leite / Eduardo Monteiro

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