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O Capitão-General da Ilha Terceira

“Percebe-se que a coligação presidida por J. M. Bolieiro vive enredada numa teia de interesses e num “puzzle” político-partidário que cria um fosso na unidade do arquipélago e na solidariedade entre os membros do Executivo e parceiros da coligação”

Quem analisou bem o discurso do líder do CDS/PP-Açores no encerramento do 11.º congresso daquele partido, por certo não ficou indiferente às mensagens explícitas que Artur Lima (AL) endereçou ao Governo de José Manuel Bolieiro. A mais controversa foi certamente a que deita por terra toda a política do próprio Governo de que ele é Vice-Presidente: “Cinquenta anos depois da autonomia regional, é tempo de mudar estruturalmente a nossa região e o CDS não abdica de dar o seu contributo, como sempre fez, na Saúde, na Educação, nos Transportes ou em qualquer outra área da governação”. 1
Bem interpretada a frase, o líder centrista deu a entender, alto e bom som, que não consegue demover os seus pares de que “é tempo de mudar estruturalmente a nossa região”.
Mas que mudança pretende o dirigente centrista fazer “em qualquer área da governação” se ele próprio, como Vice-Presidente do Executivo, inaugurou também “uma nova forma de fazer política nos Açores”?
Pelos vistos, essa “nova forma” não está a ser bem sucedida. O dirigente centrista defende por isso a necessidade de “repensar o financiamento da autonomia” e “uma mudança de fundo” tendente ao financiamento pelo Estado Central das áreas da Saúde e da Educação, “ficando a Região como financiador supletivo”.
Esta proposta, a meu ver, abala as competências estatutárias da Autonomia Político-Administrativa definidas no actual Estatuto que se pretende rever. Seria, pois, mais sensato os partidos da coligação aprofundarem essas matérias de modo a obter-se uma proposta consensual que obtivesse um largo apoio parlamentar nos Açores e em Lisboa. Pelos vistos, esse trabalho não foi feito.
Será que o PSD apoia as ideias do CDS/PP Açores – partido cujo líder afirmou ocupar o espaço da direita, professar a filosofia personalista e defender a Doutrina Social da Igreja, como fosse possível compatibilizar as três doutrinas entre si e no terreno de uma direita fraturante? Julgo que não.
No seio da coligação há um desconcerto de posições cada vez mais evidente.
Ao criticar o falhanço da “teoria da locomotiva” e ao defender o desenvolvimento multipolar, “de que o senhor Presidente do Governo já deu exemplos disso” Artur Lima contesta quem pensa que a posição por ele defendida tem a ver com o bairrismo. “Não tem.”
O certo é que as declarações do Vice-Presidente segundo o qual é “imperioso investir noutras unidades hospitalares da região, a começar pela implementação de uma unidade de hemodinâmica em Angra do Heroísmo” abalaram as hostes social-democratas da Terceira.
Esta semana Mónica Seidi veio a terreiro mostrar serviço, informando que a Unidade de Saúde da Ilha Terceira “foi recentemente apetrechada com dois novos equipamentos para Raio-X” 2 , investimento que “demonstra o empenho nos cuidados de saúde prestado aos terceirenses, tanto no concelho de Angra do Heroísmo como no da Praia da Vitória”. A titular da Saúde anunciou também a contratação de mais um médico de família, permitindo a abertura do segundo núcleo de Saúde Familiar na Ribeirinha.
Simultaneamente os deputados do PSD eleitos pela Terceira apressaram-se também a refutar os “ataques e as críticas vis de que tem sido alvo a gestão do Serviço Regional de Saúde”, dando conta de que no Hospital de Angra foram já gastos, desde 2021, 5.6 milhões de euros em equipamentos médicos, acrescidos de 2,6 milhões do PRR em equipamentos vários para a realização de exames como o AngioTAC cardíaco.
A única leitura possível sobre estas posições é que elas pretenderam contradizer as habituais críticas de Artur Lima à tutela da saúde por, em seu entender, menorizar as capacidades do Hospital de Angra, em benefício do HDES. Foi essa – recorde-se – uma das razões que levou Clélio Meneses a demitir-se da pasta da saúde, sem que Bolieiro tomasse posição pública em defesa do Secretário terceirense, preferindo não hostilizar um dos parceiros da coligação.
A postura de independência do CDS, no entanto, mantém-se. Demonstram-no as intervenções dos dois deputados centristas no Parlamento, defendendo a atuação dos Secretários do seu partido, silenciando os restantes e raramente articulados com a bancada do PSD.
Percebe-se que a coligação presidida por J.M.Bolieiro vive enredada numa teia de interesses e num “puzzle” político-partidário que cria um fosso na unidade do arquipélago e na solidariedade entre os membros do Executivo e parceiros da coligação.
A atribuição da Vice-Presidência a Artur Lima com competências3 na Cooperação externa; Promoção da captação de investimentos de capitais externos para a Região; Promoção e divulgação no exterior, das potencialidades económicas da RAA; Assuntos euro-atlânticos; Ciência, inovação e desenvolvimento; Relações, com a Universidade dos Açores e demais instituições de ensino superior; Comunicações, transição digital, desenvolvimento e promoção da sociedade da informação; Cibersegurança; Acompanhamento do Acordo de Cooperação e Defesa celebrado entre Portugal e os Estados Unidos; Aerogare Civil das Lajes e porta-voz do Conselho do Governo Regional, fazem do líder centrista um Super-Secretário de quem se exige uma postura institucional e transversal a todas as ilhas.
A estabilidade política sustenta-se da solidariedade governamental.

1 Agência LUSA , 23-02-25 15:32h
2 “Diário dos Açores”, 26-02-25
3 DRR n.º 4/2025/A, de 22 de janeiro

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

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