Já quase não se passa uma semana sem que apareçam notícias sobre droga nas nossas Ilhas. Umas vezes são as autoridades policiais competentes que apreenderam uma quantidade apreciável de droga – e logo pensamos que se trata apenas da ponta do iceberg, pois o que se consegue encontrar dá a ideia do que realmente por aí anda e que é sempre muito mais… Outras vezes são casos de toxicodependentes que cometem crimes de vária natureza, inclusive sobre familiares próximos, vítimas de violência doméstica, situação repugnante e que tanto prolifera ainda entre nós, dando mau nome à nossa sociedade, sobretudo quando se vêem ultrapassados os antigos tabús de nunca levantar a mão contra qualquer dos progenitores e agora é tão frequente saber-se de pais e mães e até avós espancados pelos descendentes em estado de desespero em busca de dinheiro para adquirirem o horrível produto… Correm ainda à boca pequena, que não é tema abordado, e bem, pelos Órgãos de Comunicação Social, casos de suicídios atribuídos ao consumo de estupefacientes, seja por overdose seja para simplesmente fugir a vítima do problema e de todos os outros que a vida apresenta. E não falemos já da denúncia pública de tráfico de droga às claras nas ruas, à roda dos estabelecimentos de ensino, frequentados por jovens de tenra idade que os celerados traficantes tentam iniciar no consumo para expandirem o seu mercado de morte; ou de comportamentos abusivos dos habituais consumidores de droga, perturbando os moradores da zona por onde se vão alastrando, afectando o seu descanso e tranquilidade, quando não mesmo a limpeza das ruas e dos jardins públicos, cada vez mais procurados pelos visitantes dos Açores, sendo de duvidar que levem daqui uma boa impressão duradoura face a tantos e tão variados toxicodependentes e sem-abrigo, que parecem ter-se apoderado de certas áreas citadinas.
Já há alguns anos atrás, julgo quando estava ainda no Parlamento e o problema era muito menor, alertei um Membro do Governo Regional de então sobre a devastação que a droga estava causando nas famílias açorianas, impondo-se promover um verdadeiro sobressalto cívico que levasse toda a população a olhar para o assunto e a mobilizar-se para lhe dar combate eficaz.
Em tempos ainda mais remotos, discuti com a responsável do Ministério Público na nossa Região Autónoma, que viria a ser depois a Procuradora- Geral da República, Dr.ª Joana Marques Vidal, a proteção necessária dos cidadãos perante o abuso de alguns sem-abrigo que se colocavam sistematicamente em áreas de propriedade privada para dormir e fazerem as suas necessidades matinais, obrigando os donos das lojas a extensas limpezas antes de as poderem abrir. Argumentei que as ruas não podem ser consideradas locais próprios para dormir, incumbindo às autoridades proporcionar abrigo aos que dele necessitam, o que de resto acontecia, mas era recusado por alguns, que preferiam não se sujeitar a qualquer disciplina. Em face da argumentação produzida pela Magistrada, fundando-se no princípio da liberdade das pessoas, ainda lhe disse que iria promover que fosse algum deles dormir para a sua porta de modo sistemático, mas isso não passou de conversa e foi pena, porque penso que ela iria certamente reagir e encontrar solução para o problema.
Ora, hoje todas estas questões estão ampliadas e se tornaram penosamente visíveis e até publicitadas. O sobressalto cívico em tempos preconizado tornou-se urgente! Cada um tem de pensar no que pode fazer para melhorar o ambiente das nossas Ilhas no tocante à expansão da droga e às suas consequências, sejam elas o aumento da mendicidade e dos sem-abrigo e das correrias e gritarias noturnas, e não só, provenientes dos consumidores em busca de satisfação.
Afigura-se muito necessário incluir na lista dos estupefacientes os produtos da chamada droga sintética. Se a nossa Assembleia Legislativa não pode mesmo avançar com tal legislação, então que se recorra ao Parlamento Nacional, mas logo que abra após as eleições do dia 18 próximo e sem mais demoras. Os Deputados que vão ser eleitos não podem hesitar em avançar com a iniciativa legislativa pelos vistos necessária.
Não sou grande entusiasta das chamadas “salas de chuto”, antes preferiria ver as entidades públicas, regionais e autárquicas, gastando dinheiro nos problemas prementes da habitação, que julgo estão na origem de muitos desvios para o consumo de droga.
Em cada família, e cada pessoa individual, deveria pensar-se o que é possível fazer para minorar a problemática aqui abordada. Pensar que só as entidades oficiais com elas se devem preocupar, como aliás com todas as outras questões de interesse colectivo, é um erro comum e que explica muito da passividade da nossa sociedade e o agravamento dos problemas sociais. É que há muitos casos de queda na droga derivados do fechamento de cada um nos seus próprios interesses, reduzindo a convivência familiar a pouco ou mesmo nada. Sem uma actuação firme a esse nível, temo que a questão tenda a agravar-se.
João Bosco Mota Amaral*
- (Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo Ortográfico)