Diário dos Açores

A Base das Lajes como valor autonómico

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O valor geopolítico e geoestratégico das ilhas é tão antigo quanto o seu descobrimento e povoamento. Serviu ao logo dos séculos dois importantes impérios, como Portugal e Espanha e sempre foi e é uma fonte de inspiração política para Inglaterra e a partir da II grande guerra para os EUA, e a China adoraria possui-lo, assim como todas as grandes potências. Importância, não apenas em tempo de guerra, mas também e sobretudo em tempo de paz porque é neste período de defeso que os Estados se preparam para as guerras; e porque a juntar a essa ideia de guerra, outras de dimensão diplomática e económica, tecnológica e de matérias primas.
Antes da autonomia política a discussão deste valor geopolítico e geoestratégico resumia-se à questão das independências, ora de um independentismo mais político como o de S. Miguel, ora um independentismo social como nas Flores. A forma como esteve quase vendido aos EUA o Ilhéu das Cabras, quando o país se encontrava em plena assembleia constituinte para a primeira Constituição Portuguesa, é disso outro exemplo, isto é, um fortíssimo desinteresse pelos assuntos – porque pura e simplesmente não existia visão para isso, nem condições democráticas. Era uma questão menor, porque o Estado português era medíocre e porque as populações tinham mais preocupações de sobrevivência. Com a instauração da autonomia política estas dimensões internacionais ganharam relevo, quer através dos cursos da Universidade dos Açores, quer através de teses de mestrado e doutoramento, quer ainda de poucos, mas bons, intelectuais que se dedicam ao seu estudo. E, realmente, nesta fase da humanidade propícia a guerras (quanto maior o desenvolvimento tecnológico, maiores as necessidades; vai daqui que quanto maior a riqueza da geografia, maior a propensão para a sua dominação), esse debate torna-se realmente interessante e por isso impulsivo, embora pouco sistémico e organizado – apesar de nos Açores possuirmos no nosso historial instituições com tal vocação (a antiga comissão parlamentar para as relações internacionais; e o atual Conselho para o Estudo das Potencialidades Geopolíticas e Geoestratégicas dos Açores-G2A no qual é depositada grande expetativa, mas sem razão porque é um mero conselheiro do governo).
Ou seja, a autonomia política desencadeou (entre muitas outras realidades) pensamento sobre geopolítica e geoestratégia. Mas esse pensamento ainda é curto. Para o conceito de insularidade foram pensadas inicialmente fórmulas para a sua materialização (Álvaro Monjardino); também para o da ultraperiferia no contexto da União Europeia (Mota Amaral e Cavaco Silva); e tudo isso está hoje plasmado na Lei de Finanças das Regiões Autónomas (Carlos César). Isto é, o pensamento nestas duas áreas de insularidade e ultraperiferia – pode designar-se de pensamento autonómico porque se focaliza na realidade política do interesse dos insulares. A discussão interessante no registo das relações internacionais é fundamental para a compreensão dos problemas globais; mas focaliza-se nos detentores de poder e dos dividendos que estes possuem com essa res publica global. Mas essa discussão, repito interessante e importante, é só isso mesmo; não se digna descer à importância autonómica. Quando estamos a discutir a guerra da invasão da Ucrânia discutimo-la nos seus vários pontos de vista, mas todos têm em comum a essencialidade da questão, e que é o objetivo de a Ucrânia não perder a sua independência por tudo quanto isso representaria na Europa...
E qual o valor autonómico de discutir o valor da Base das Lages para os EUA? Essa pergunta, pelo que se antedisse, tem outra dimensão: parece muito mais difícil de responder e parece ainda mais trabalhoso o encontro de soluções. Não é por falta de assunto da maior importância; e não é por vivermos em democracia. Vamos arranhando aqui e ali, ora em questões caseiras (laborais, por interesse de alguma população), ora em matérias de Estado (militares, por interesse fundamental), ora em assuntos de proximidade política (financeiros, numa 1.ª fase no continente, numa fase a decorrer em S. Miguel); mas no essencial, ainda estamos longe de encontrar instituições e pessoas, e sociedade sobretudo, que se incomode com este ramo de interesses especificamente regionais.
Falta-nos, por um lado, pensamento autonómico sobre o valor geopolítico e geoestratégico do arquipélago; e por outra banda, nesse registo, também nos falta pensamento autonómico sobre as suas consequências na vida das pessoas que vivem nas ilhas, em geral para os Açores e em particular para a Terceira.

Arnaldo Ourique *

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