Diário dos Açores

Raiz Comovida, um tratado de linguagem: um retrato antropológico (Conclusão)

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A terminar, e porque já longa vai a prosa, talvez não fosse descabido, um olhar um pouco mais acutilante por parte da Secretaria Regional da Educação e dos Assuntos Culturais sobre estas pessoas que, através do seu trabalho, reconhecido virtuosismo e talento, para além de um assinalável comprometimento que já vem de longe, souberam eternizar cabalmente o que é isto de se ser açoriano. Nesse sentido, parece-me imperioso, que sejamos um pouco mais arrojados, e sobretudo mais ecléticos, e tenhamos a coragem de conceder atenção à literatura de qualidade, atempando esse reconhecimento, para que possa ser celebrado condignamente: Não me causaria quaisquer pruridos ver o nome de Daniel de Sá como patrono da EBI da Maia, assim como o de Cristóvão de Aguiar na da Ribeira Grande ou de João de Melo na do Nordeste, como aliás já acontece em outras unidades orgânicas de região. Entre outros, Dias de Melo e Vasco Pereira da Costa merecem, há muito, uma reedição dos seus belíssimos contos, sob pena de caírem no olvido coletivo; Pedro da Silveira, Emanuel Félix e Marcolino Candeias são relembrados quase exclusivamente pela iniciativa privada, e em iniciativas que atingem um público muito reduzido. Relembro, ainda, Fernando Aires, o expoente mais cintilante da diarística nos Açores e um dos melhores do país, e não tenho conhecimento de quaisquer iniciativas governamentais, no sentido de eternizar a obra e relembrar o homem. Houve o descerrar de uma placa em sua residência, mas a cargo da família e, apenas mais tarde, uma outra da responsabilidade da autarquia. Embora abra espaço a informação que me possa ter escapado, não obstante as diligências tomadas, parece-me francamente pouco, para retribuir o tanto que o autor nos deixou. Não haverá, nas nossas escolas, leitores interessados em ler os seus diferentes diários? Que se dissemine a obra. E os virtuosos Urbano Bettencourt ou Emanuel Jorge Botelho, em que têm contribuído os responsáveis governativos no sentido de prestar o justo tributo, ou, pelo menos, legitimamente reconhecer os tão profícuos trabalhos que têm desenvolvido ao longo de décadas, seja resgatando do esquecimento nomes que merecem um pouco mais de atenção, seja pela proficiente obra que ambos têm vindo a desenvolver?
Há aqueles que, não residindo em território arquipelágico, muito se têm batido pelos Açores e pelas suas gentes, seja no Continente, seja na Diáspora, carregando muito da nossa terra até aos novos mundos, dando a conhecer, ensinando, incorporando os Açores e as vivências açorianas na mundividência alargada que se exige aos novos habitantes destes novos mundos.
Eu corroboro aquela máxima que garante que a génese de um povo reside na sua cultura, pelo que descredibilizá-la será, em última instância, desvirtuar toda a história desse povo, lançando-o a um deus-dará cultural, e substancialmente pernicioso. Estou certo de que não será a pretensão deste elenco governativo, que já mostrou bastas vezes ser capaz de tratar a Cultura com o cuidado que se impõe, por isso, é da mais inteira justeza olhar para estas pessoas e para o seu trabalho, procurando dignificar umas e outro, conforme é seu legítimo merecimento, pelo tanto que nos têm dado.

Telmo Nunes *

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