Sou descendente de imigrantes açorianos, da segunda geração que nasceu no Brasil, como “neto” da diáspora ocorrida na primeira metade do século XX. Por aqui, a maioria das memórias e saberes sobre o arquipélago chegaram e continuam chegando como peças de um quebra-cabeças incompleto.
Uns contam o que viveram, outros o que ouviram falar num desencontro de narrativas. A nossa família cruzou o Atlântico em busca de trabalho e oportunidades. Passou bons bocados em Lisboa até embarcar no primeiro navio que oferecesse disponibilidade e assim vieram a desembarcar no porto de Santos, no Estado de São Paulo, seguindo em frente, sem perder o amor pela sua terra natal.
Meu avô, nascido nas Furnas, só voltou aos Açores meio século depois de ter partido, com 8 anos de idade. E por isso, só vim a conhecer a minha “parte açoriana” há pouco mais de uma década. Desde então, estive em São Miguel três vezes, cresci encantado com as belezas naturais da ilha e com o carinho dos nossos parentes micaelenses.
Apesar de estarem longe, nunca estiveram distantes. O tempo passou, tornei-me jornalista e com algum interesse acompanho as notícias da nossa segunda pátria, que chegam pelo Diário dos Açores. A internet também me ajuda a me manter atualizado, mas a notícia com curadoria, mais confiável, mais atualizada e opinativa é outra coisa.
Por isso esse aniversário é tão importante, porque depois de mais de um século e meio acontece em plena crise mundial e contemporânea em relação aos veículos de comunicação. Os grandes conglomerados e agências de notícias dominam o cenário.
Afinal, qual o novo papel de um jornal local, frente ao bombardeio de desinformação, da audiência fragmentada, do conteúdo gratuito, entre tantos desafios, para os leitores mais jovens? Não é fácil, por exemplo, que a gente compreenda o resultado das últimas eleições, o boom turístico que está afetando a vida dos mais antigos e dos mais novos – que está dificultando até as nossas viagens, ou a invasão de proprietários estrangeiros que poderá desconfigurar uma cultura local tão rica e original.
Na minha opinião, os veículos não têm a resposta ainda, mas estão no processo de configura-la. A longevidade do Diário dos Açores mostra como sobreviver com orgulho, como navegar pelas épocas e acompanhar a mudança, que é a única certeza da vida.
Para todos que, como eu, estão do outro lado dos oceanos, na América, no continente, no Brasil, na macaronésia etc., é a constância desse trabalho que nos mantém atados ao passado, mas também próximos ao presente e confiantes no futuro. Agradecimentos sinceros.
Parabéns ao Diário dos Açores!
Tomás Furtado*
- Jornalista