Edit Template

“Spitzenkandidaten”? Uma breve crítica ao Debate de Maastricht

No dia 29 de abril de 2024, ocorreu o Debate de Maastricht em que estiveram reunidos os chamados “Spitzenkandidaten”, ou candidatos líder, dos partidos políticos europeus (Partido Popular Europeu, Partido dos Socialistas Europeu, Partido dos Verdes Europeu, etc.) que concorrem para a posição da presidência da Comissão Europeia no rescaldo das eleições europeias marcadas para junho do ano presente.
Na sua íntegra, o debate funcionou como um típico debate político entre cabeças-de-lista de partidos políticos em que, normalmente, estes dispõem de um determinado período de tempo para fazer declarações de abertura, apresentar os seus argumentos e responder aos pontos de vista uns dos outros, e retorquir a perguntas e comentários dos membros da audiência. Os tópicos em debate incidiram-se em três temas gerais: alterações climáticas, política externa, e democracia na União Europeia (UE).
Antes de mais, é preciso salientar que o sistema de Spitzenkandidaten não se assemelha ao sistema de eleição de executivo nacional como entendemos. Estes candidatos agem como cabeças-de-lista do seu partido, mas os partidos políticos europeus são estruturas transnacionais compostas por partidos nacionais de cada Estado-Membro. Durante as eleições europeias, os votos são dirigidos aos partidos (ou candidatos) nacionais e não diretamente aos partidos europeus nem aos seus candidatos líder. Cada partido nacional possui uma lista de candidatos para o Parlamento Europeu (PE), tendo um cabeça-de-lista como o candidato número um para ser eleito eurodeputado.
A forma como o sistema de Spitzenkandidaten funciona é peculiar, para dizer o menos. Resumidamente, um partido europeu, como o PPE, é considerado o vencedor das eleições europeias com base nos resultados eleitorais dos partidos nacionais que o compõe. Assim, o candidato líder do PPE será nomeado presidente da Comissão e terá de receber uma maioria de apoio tanto no Parlamento Europeu como no Conselho Europeu para, efetivamente, tomar pose. O que torna este sistema mais complexo é facto de uma coisa é ser candidato a presidente da Comissão Europeia, e outra é ser candidato ao PE tendo como horizonte ser presidente da Comissão. São duas coisas diferentes. Com o aproximar das eleições europeias de 2024, os Spitzenkandidaten dos maiores partidos europeus, o PPE e o PES, não vão ser candidatos ao PE, não havendo uma ligação necessária entre ser candidato líder e ser candidato ao PE.
O debate foi transmitido online na plataforma mediática POLITICO Europe e no seu canal oficial do YouTube, não tendo sido transmitido nos meios de comunicação social nacionais. O debate foi pouco ou nada publicitado, pelo que levou a cerca de 26 mil pessoas a assistir online e, até agora, 40 mil de visualizações no YouTube. Este número é bastante insatisfatório para um debate sobre umas eleições dirigidas a 27 Estados-Membros compostos por pouco menos de 446 milhões de habitantes no total.
A baixa participação no debate revela cada vez mais que não só os cidadãos europeus desconhecem a existência destes Spitzenakandidaten, como também realça que os media nacionais prestam mais atenção a temas e candidatos nacionais para as eleições europeias. Por outras palavras, as eleições europeias são eleições nacionais num âmbito europeu. Não irei discutir todas as ideias e discussões apresentadas no debate, mas gostaria de apontar três críticas principais no seu rescaldo.
Primeiro, nenhum dos candidatos principais do debate abordou um tema muito importante sobre as eleições europeias: porque é que os cidadãos europeus se devem preocupar com eles? O debate teve muito pouca visibilidade e nenhum dos candidatos tentou apresentar soluções para corrigir o sistema de Spitzenkandidaten. Talvez introduzir a ideia de reformar a lei eleitoral da UE, que permanece praticamente inalterada desde 1976. Qualquer questão relacionada com o défice democrático na UE foi ignorada em benefício de temas sobre os quais toda a gente tem falado e ouvido constantemente: Rússia-Ucrânia, Israel-Gaza, alterações climáticas e a influência política chinesa.
Segundo, UrsulaVon der Leyen, a atual presidente da Comissão e a mais provável vencedora do resultado das eleições europeias, teve uma posição muito neutra e bastante passiva. Os candidatos líder dos Socialistas e dos Verdes encostaram-na a um canto quando uma sugestão de coligação ou cooperação entre o PPE e os Conservadores e Reformistas Europeus (ECR, um grupo eurocético conservador no PE) não estava fora de questão. Von der Leyen respondeu: “depende muito da composição do Parlamento e de quem faz parte de cada grupo”. Não esqueçamos que Von der Leyen mantém relações diplomáticas estreitas com a primeira-ministra italiana Giorgia Meloni, cujo partido nacional, o FDL, pertence ao ECR. A cooperação com os conservadores eurocéticos poderá diminuir o apoio de Von der Leyen no PE, caso vence o seu segundo mandato.
E por fim, Maylis Roßberg, a candidata líder da Aliança Livre Europeia, chamou a atenção para um aspeto com o qual concordo plenamente: a falta de temas relacionados com a juventude na UE. Muitos dos participantes no debate eram jovens, por isso, porque não abordar questões que os afetam diretamente? Alguns exemplos que poderiam ter sido incluídos na ordem de trabalhos: a idade mínima para votar deve ser reduzida para 16 anos em todos os Estados-Membros da UE, o financiamento da educação e da investigação e desenvolvimento, medidas para combater o desemprego juvenil em várias regiões da UE, debater se os estágios não remunerados devem ser proibidos, e promover programas sociais financiados pela UE ou iniciativas para combater problemas psicológicos como o esgotamento e a depressão.

Diogo Vieira Ferreira*

*Bolseiro de Doutoramento em Ciência Política, Universidade da Beira Interior / Universidade de Aveiro

Edit Template
Notícias Recentes
Hotel Hilton na Lagoa na mira de mercados de alto valor acrescentado
Padre António Rego homenageado hoje
O melhor do surf nacional arranca hoje na praia de Santa Bárbara da Ribeira Grande
Jovem detido com 16 quilos de droga
Câmara Municipal de Ponta Delgada investe 15 milhões de euros em obras nas freguesias
Notícia Anterior
Proxima Notícia

Copyright 2023 Diário dos Açores