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A evolução da autonomia política

Vamos verificar o assunto do nosso texto, o conceito de região autónoma (RA) para percebermos a evolução da atual autonomia política.
No Estatuto Político Transitório de 1975, art.º 1.º «é criada na região dos Açores uma Junta Administrativa e de Desenvolvimento Regional, adiante designada por Junta Regional». É sobretudo no Preâmbulo do diploma que se percebe essa região autónoma: «A experiência colhida nesta fase, resultante da coordenação dos serviços dos distritos autónomos com os vários serviços da administração central, bem como as novas formas de participação popular a ensaiar, fornecerão, sem dúvida, dados preciosos para a futura elaboração do diploma sobre os órgãos da administração da região dos Açores, cujo projeto se comete à Junta agora criada». Ou seja, a ideia não é a de governar em formato político, mas a de manter os serviços da junta distrital em funcionamento até à implementação do modelo que estava sendo criado na Constituinte e de preparar o Estatuto que resultasse da Constituição que estava em preparação. Ou seja, doutro modo de dizer: o conceito de RA é funcional e preparatório, administrativo e transitório.
O Estatuto Político Provisório de 1976, art.º 1.º, n.º 1, «o arquipélago dos Açores, composto (…), constitui uma região autónoma da República Portuguesa e é pessoa coletiva de direito público». Ainda aqui não se sabe o que seja a RA; é nas disposições seguintes que se percebe qual por via das atribuídas e funções políticas: um parlamento eleito por sufrágio direto com capacidade para criar leis de origem autonómica, governo e administração próprios, orçamento e receitas próprias. Ou seja, o conceito de região autónoma, e autonomia política, está assente em parâmetros que podem variar em função de novas realidades políticas. O Estatuto Definitivo de 1980, mantém o paradigma; as alterações de 1987 e 1998 mantêm-se inalterados. E a versão de 2009 é idêntico na matriz, mas formaliza um avanço porque estabelece, desde logo, os tais elementos constitutivos da autonomia política: art.º 1.º «n.º 1, O arquipélago dos Açores constitui uma Região Autónoma da República Portuguesa, dotada de personalidade jurídica de direito público», n.º 2, A autonomia política, legislativa, administrativa, financeira e patrimonial da Região exerce-se no quadro da Constituição e do presente Estatuto».
Ou seja: na disposição concetual de autonomia política, RA, o Estatuto dos Açores nunca ofereceu uma ideia política, remetendo sempre para outras normas que a concretizavam. Nesse ponto a versão de 2009 é a melhor: 1.º, porque introduz na mesma norma os elementos constitutivos do conceito; 2.º, porque é acrescentada uma nova norma, no art.º 3.º, que institui como «objetivos fundamentais da autonomia», e concretamente «a) A participação livre e democrática dos cidadãos; b) O reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses; c) A defesa e promoção da identidade, valores e interesses dos açorianos e do seu património histórico; d) O desenvolvimento económico e social da Região e o bem-estar e qualidade de vida das populações, baseados na coesão económica, social e territorial e na convergência com o restante território nacional e com a União Europeia; e) A garantia do desenvolvimento equilibrado de todas e cada uma das ilhas; f) A atenuação dos efeitos desfavoráveis da localização ultraperiférica da Região, da insularidade e do isolamento; g) A adaptação do sistema fiscal nacional à Região, segundo os princípios da solidariedade, equidade e flexibilidade e da concretização de uma circunscrição fiscal própria; h) A efetivação dos direitos fundamentais constitucionalmente consagrados; i) A proteção do direito ao trabalho, promovendo a conciliação entre a vida familiar e a laboral; j) O acesso universal, em condições de igualdade e qualidade, aos sistemas educativo, de saúde e de proteção social; l) A promoção do ensino superior, multipolar e adequado às necessidades da Região; m) A defesa e proteção do ambiente, da natureza, do território, da paisagem e dos recursos naturais; n) O seu reconhecimento institucional como região ultraperiférica e a consolidação da integração europeia; o) O fomento e fortalecimento dos laços económicos, sociais e culturais com as comunidades açorianas residentes fora da Região». Mas a própria separação destas normas, o art.º 1.º e o art.º 3.º, a premeio com um art.º 2.º sobre a composição do território regional, mostra claramente que não existia nenhuma ideia de construção de uma ideia moderna de autonomia política de RA. Aliás, aqui quis-se copiar a Constituição, mas não se soube copiar, como veremos de seguida.
E não nos faltava exemplo, desde logo com a Constituição de 1976 e com o seu art.º 1.º: «A República soberana, baseada na dignidade da pessoa humana e na vontade popular e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária». Veja-se a beleza normativa do conceito que merece uma pausa para se ler tantas vezes quantas as necessárias para entender este monumento normativo. Ou o art.º 6.º, n.º 2, na especificação de que «Os arquipélagos dos Açores e da Madeira constituem regiões autónomas dotadas de estatutos político-administrativos e de órgãos de governo próprio», ou, ainda, nos termos do art.º 225.º, n.º 2, «A autonomia das regiões visa a participação democrática dos cidadãos, o desenvolvimento económico-social e a promoção e defesa dos interesses regionais, bem como o reforço da unidade nacional e dos laços de solidariedade entre todos os portugueses».
Em 2009, se a Região estivesse mais interessada em criar mecanismos de melhorar a autonomia política para as pessoas concretas em vez de querer ferir a Constituição e em vez de amontoar regras sobre regas que na verdade pouco adiantam e pouco adiantaram, e se se tivesse concentrado num conceito moderno e na esteira da Constituição portuguesa, teria feito um conceito mais escorreito. Afinal o arquipélago dos Açores é uma região autónoma da República Portuguesa, alicerçada na dignidade da pessoa humana, na vontade popular das suas populações e empenhada na construção de uma sociedade livre, justa e solidária, e baseada na Constituição e no seu Estatuto Político.

Arnaldo Ourique

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