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HDES: “calamidade” no Governo Regional

O Governo Regional declarou o “estado de calamidade pública” na Região Autónoma dos Açores, na sequência do violento incêndio ocorrido em Maio deste ano no Hospital do Divino Espírito Santo (HDES), em Ponta Delgada, mas penso que a “calamidade” começa no próprio executivo governamental açoriano.
A Secretaria Regional do Turismo, Mobilidade e Infraestruturas (SRTMI) é um dos departamentos do Governo Regional. A muito respeitável drª Berta Cabral tutela essa Secretaria Regional, que tem à sua responsabilidade, nomeadamente, as Obras Públicas, mas, pelos vistos, não todas…
Na definição das suas missões, menciona-se, nomeadamente, o seguinte: “Com as Infraestruturas, a SRTMI atua na construção e requalificação de equipamentos públicos que beneficiam os açorianos de cada uma das nove ilhas, promovendo progresso com melhores condições de utilização de espaços impulsionadores ao seu bem-estar e qualidade de vida”.
Que se saiba, o HDES é, para todos os efeitos, um equipamento público que beneficia todos os açorianos de um modo geral e contribui para o bem-estar e qualidade de vida dos residentes nas nove ilhas açorianas, por ser a maior unidade hospitalar e com mais valências clínicas no arquipélago. Estranho, por isso, que a secretária regional das Infraestruturas (ou das Obras Públicas), drª Berta Cabral, esteja alheada, ao que parece, do que se tem passado no HDES, quando deveria estar ao lado da secretária regional da Saúde, drª Mónica Seidi, ajudando-a na ingente tarefa de recuperação do HDES e na concretização de soluções complementares. Vou realçar: a drª Mónica Seidi é secretária regional da Saúde, não é secretária regional com a tutela das Obras Públicas.
Compreendo que a drª Berta Cabral, pessoa que muito considero, já tenha abundante “lenha” para se “queimar”, principalmente com a questão da companhia aérea SATA, mas se tem a tutela das Obras Públicas não pode nem deve colocar-se de parte quanto ao problema do HDES. Desconheço, obviamente, se foi ela que se colocou de parte ou se recebeu instruções para não se envolver no grande e grave problema do HDES. Talvez a estratégia do presidente do Governo Regional, dr. José Manuel Bolieiro, seja mais ou menos assim: se é inevitável desgastar a secretária regional da Saúde, não vale a pena desgastar também a secretária regional das Infraestruturas…
Depois de uma longa e árdua carreira política, como autarca, gestora, deputada e governante, com altos e baixos, sucessos e contrariedades, mas sempre com grande empenho na causa pública, é de admitir que a drª Berta Cabral se sinta cansada. Nada mais natural e compreensível. Mas se está cansada, deve então retirar-se e ser substituída.
O PSD e a coligação que lidera, integrando também o CDS e o PPM, estão a fazer uma maldade política à drª Mónica Seidi, que é a de a deixar praticamente só na monumental tarefa de solucionar os problemas causados com o fogo no HDES. Parece que ela sente-se pressionada para tomar conta de tudo e tentar perceber de tudo, o que é pessoalmente impossível, tecnicamente impossível e politicamente impossível também. Ora vejamos. Ela fala dos problemas clínicos e da organização dos serviços, que conhece bem por ser médica. Até aqui tudo bem. Mas fala do mesmo modo das obras, que obviamente conhece menos. Fala dos problemas estruturais do edifício, temática que não domina. Fala das causas e consequências do fogo, sem ter formação nessa área. Tem-se pronunciado, igualmente, sobre outras matérias que claramente lhe escapam em termos de conhecimento técnico ou científico.
Nesse quadro, é de admitir que nem tudo esteja a decorrer da melhor forma no trabalho de recuperação do HDES e em soluções complementares. A drª Mónica Seidi não tem ninguém a dar-lhe apoio concreto e ela não é uma “super-mulher”, por muitas qualidades pessoais e profissionais que possa ter. A drª Berta Cabral, que tem maior experiência política, administrativa e governativa, deveria estar ao lado da drª Mónica Seidi. Volto a realçar: a drª Mónica Seidi é secretária regional da Saúde, não é secretária regional com a tutela das Obras Públicas.
Não gostei de ver o recente debate de urgência sobre a Saúde realizado na Assembleia Legislativa Regional. O presidente do Governo Regional não compareceu, o vice-presidente (em alguns momentos já pareceu ser o presidente…), dr. Artur Lima, não falou e a secretária regional responsável pelas Obras Públicas também esteve calada, tanto quanto vi pela televisão. A maldade política que estão a fazer à jovem e simpática drª Mónica Seidi ficou bem patente. E parece-me que ela já percebeu isso, pois apresentou-se embaraçada, constrangida e triste, emocionada até em alguns momentos, entregue aos “lobos” parlamentares e sem ninguém do Governo Regional que lhe desse uma “mão”. É verdade que o secretário regional dos Assuntos Parlamentares interveio um pouco, mas o dr. Paulo Estêvão não tem grande força política e, portanto, o seu apoio acabou por ser fraco.
A drª Mónica Seidi diz sempre “o Governo Regional decidiu” na Saúde. Sim, tem decidido algumas coisas, mas depois diz para ela executar, se despachar e se desenrascar, mas sozinha, a orientar equipas de trabalho, no tal isolamento em que tem sido deixada. No fim de tudo, o que decorrer bem será mérito de todo o Governo Regional e o que decorrer mal será sempre da responsabilidade da drª Mónica Seidi. Isso é justo e correto?
Por tudo o que fica exposto, há uma evidente “calamidade” dentro do próprio Governo Regional dos Açores, porque, como se vê, não é um executivo unido e forte, preparado para grandes contingências. Quando ocorreu o terrível sismo na ilha Terceira em 1980, afetando também a Graciosa e São Jorge, uma situação obviamente mais grave do que o incêndio no HDES, os trabalhos de reconstrução e de apoio às populações decorreram com todo o Governo Regional envolvido e empenhado. Além disso, foi constituído o Gabinete de Apoio e Reconstrução (GAR), que muitos e bons serviços prestou. Mas nessa altura o presidente do Governo Regional era o dr. João Bosco Mota Amaral. É comparar as situações e tirar as conclusões…
Deveria ter sido criado agora também um Gabinete de Apoio e Reconstrução – com essa designação ou semelhante, integrando personalidades de várias áreas de especialidade, desde médicos a engenheiros, além de outros – para fazer face com maior prontidão ao problema surgido no e com o HDES. A opção – manifestamente errada – foi concentrar tudo na secretária regional da Saúde, que obviamente terá dificuldade por si só, como aconteceria com qualquer outra pessoa em igual situação, de chegar a todos os lados e resolver todas as questões com maior eficiência e em tempo mais oportuno. A melhor solução teria sido a secretária regional da Saúde ficar responsável pela orientação política deste processo e um Gabinete de Apoio e Reconstrução assumir as questões técnicas e logísticas.
Ser presidente do Governo da Região Autónoma dos Açores é muito diferente do que ser presidente da Câmara Municipal de Ponta Delgada, função em que, de resto, o dr. José Manuel Bolieiro não brilhou. Por exemplo, na questão da Calheta de Pêro de Teive, muito prometeu, para depois nada cumprir. Até disse que iria enviar uma queixa para a Comissão Europeia, o que nunca aconteceu. Foi talvez alertado ou percebeu que na grave questão da Calheta existiam responsabilidades quer de socialistas quer de sociais-democratas… A sorridente passividade política do dr. José Manuel Bolieiro não tem ajudado à solução da crise no HDES. Deixou a secretária regional da Saúde praticamente só no terreno e não teve a solidariedade institucional de a acompanhar no debate de urgência sobre a Saúde no parlamento regional. O presidente do Governo Regional, também líder do PSD-Açores, não pode ter comportamentos destes.
O dr. José Manuel Bolieiro nunca chegará ao patamar político e de competência do dr. Mota Amaral, o grande “patriarca” do PSD-Açores e prestigiada figura política de âmbito nacional, concordando-se ou não com as suas ideias e as suas actuações na causa pública. Evidencio a honestidade pessoal do dr. José Manuel Bolieiro, mas eu preferiria ver como presidente do Governo Regional o engº Paulo Moniz, deputado social-democrata açoriano à Assembleia da República, função em que tem revelado competência, dinamismo e talento político. Esse sim!
E o PS que não se coloque em “bicos de pés”, como tem pretendido, porque o Governo Regional socialista liderado pelo dr. Vasco Cordeiro, que é uma excelente pessoa, deixou o HDES em muito mau estado de conservação e manutenção. Uma tristeza!

Tomás Quental Mota Vieira

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