O regime autonómico que continua atravessado na garganta de muitos políticos de São Bento e que, se pudessem retroceder no tempo, hoje já não seria concedido, continua a levantar fantasmas dos abismos e neurónios por entre os 230 deputados, eleitos por defeito perpetualizado pela lei eleitoral feita à medida da casa e à revelia do povo português.
O presente estatuto político-administrativo açoriano, está caduco quase desde que nasceu.
Lisboa naquela altura não teve outra alternativa para apaziguar os ânimos insulares. «Não lhes damos qualquer independência, mas fazemos de conta que terão uma autonomia que, obviamente, não poderá ser ampla em coisa alguma…» (Almeida Santos).
E assim carregamos esta espécie de autonomia, falida de Direitos e Liberdades e contrariada nos mais básicos direitos democráticos de qualquer povo.
Revisitemos a Constituição da República Portuguesa, enquanto Lei fundamental do país, no nº 1 do Artigo 51.º (Associações e partidos políticos) do Capítulo II – “Direitos, liberdades e garantias de participação política”, onde podemos ler:
“A LIBERDADE DE ASSOCIAÇÃO COMPREENDE O DIREITO DE CONSTITUIR OU PARTICIPAR EM ASSOCIAÇÕES E PARTIDOS POLÍTICOS E DE ATRAVÉS DELES CONCORRER DEMOCRATICAMENTE PARA A FORMAÇÃO DA VONTADE POPULAR E A ORGANIZAÇÃO DO PODER POLÍTICO”.
No entanto e em contradição inexplicável, pode ler-se no nº 4 do mesmo artigo o seguinte:
“NÃO PODEM CONSTITUIR-SE PARTIDOS QUE, PELA SUA DESIGNAÇÃO OU PELOS SEUS OBJECTIVOS PROGRAMÁTICOS, TENHAM ÍNDOLE E OU ÂMBITO REGIONAL”
“…este facto constitui uma flagrante violação do direito de livre associação dos cidadãos, nomeadamente os reconhecidos na Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e na Convenção Europeia dos Direitos do Homem”. (palavras ditas pelo deputado Paulo Estevão, antes de fazer parte da coligação do governo regional, pelo PPM).
Nesta questão dos partidos insulares, até o atual Presidente da República, reconhece que “…não se justifica a manutenção da proibição de partidos regionais…”.
Marcelo Rebelo de Sousa, ele próprio um constitucionalista, atribuiu a inclusão daquela proibição no texto da Constituição a Vital Moreira, já no momento da redação final, “sem ter sido precedida de debate e sem ter por base qualquer projeto ou discussão e como que caída do céu.”
As Ilhas de Cabo Verde, ou as Ilhas de São Tomé e Príncipe, eram despovoadas quando os portugueses as ocuparam. O mesmo aconteceu com a Madeira e os Açores.
Das primeiras, a independência foi levada e efeito. A Madeira foi impedida de o fazer, porque o interesse de Portugal era estratégico e nisso só contava os Açores.
Os argumentos mais variados continuam acesos e a comemoração dos 50 anos do 6 de junho, só provam que aqueles acontecimentos continuam a projetar no futuro os gritos dos açorianos através dos séculos.
O pensamento de que os Açores são “pertença inquestionável de Portugal”, sem qualquer direito à sua própria identidade, faz parte das clássicas e ultrapassadas interpretações classificadas pelo Direito Internacional como «…atentatórias do direito ao reconhecimento de qualquer povo à sua liberdade plena de convivência entre as nações.»
A férrea colonização portuguesa sobre os Açores e Madeira, com proibição de partidos e referendos insulares, é pura demonstração de exercício esclavagista, com exclusivos fins exploratórios dos seus recursos naturais e financeiros, de resto, rivalizando com o regime salazarista no procedimento e atitudes colonialistas.
Sendo o Tempo senhor de todas as coisas, o Futuro se encarregará de nos dar razão.
José Soares