A 20 de Janeiro de 2025, Donald Trump tomou posse como 47º Presidente dos Estados Unidos, marcando, como se sabe, o seu segundo mandato não consecutivo. O seu discurso de tomada de posse, proferido no interior da Rotunda do Capitólio dos EUA devido ao mau tempo, foi, na sua verdadeira essência, um comício político, marcado por confrontos narcisistas, por imensas queixas pessoais e por uma era dourada que só ele a pode trazer, exemplificando o que o filósofo Eric Hoffer escreveu: A rispidez é a imitação de força pelo homem fraco.
Os discursos de tomada de posse dos Presidentes americanos visam unir a nação, realçando os valores comuns e as aspirações coletivas. Em contraste, o discurso de 2025 do Presidente Donald Trump adotou um tom de confronto, criticando fortemente a anterior administração e o dito “establishment” político, do qual ele fez parte durante 4 anos e fará parte nos próximo quatro. Num timbre deselegante e danoso, acusou o Presidente Biden de “trair o povo americano” e de presidir a um período de declínio total, afirmando: “A maré de mudança está aqui – começa hoje. “ Estes ataques diretos aos antecessores são atípicos em discursos de ocasiões desta magnitude.
Sejamos honestos: Donald Trump não fez um discurso de tomada de posse. O que tivemos foi uma amálgama de retóricas, com as mesmas litanias que nos habituou nos seus comícios de campanha. Muito leal a si próprio, referiu, constantemente as suas próprias experiências, incluindo desafios legais (esquecendo-se, contudo, de dizer que foi condenado, com pena suspensa) e uma tentativa de assassinato. Apresentando-se como um líder resiliente escolhido por Deus para “restaurar a grandeza da América.” Esta personalização desviou a atenção da unidade nacional, centrando o discurso no seu percurso e nas suas lutas individuais, uma estratégia habitualmente utilizada durante as campanhas eleitorais para galvanizar apoio dos militantes e simpatizantes. Entrelaçou a sua narrativa pessoal com o futuro do país, dando a entender que o seu regresso ao poder era uma forma de salvação nacional: “A idade de ouro da América começa hoje”, enquadrando a sua presidência como o catalisador do renascimento da nação. Esta retórica sugere a perceção de que a sua liderança é sinónimo de prosperidade para o país, centrando assim o destino da nação em torno da sua personalidade. Nada disto nos deve surpreender. Porém, qualquer cientista político pode, facilmente, dar-nos exemplos dos perigos que estes comportamentos trazem ao processo democrático.
Esta ocasião é, normalmente, uma jornada com visões gerais para o futuro, reservando os anúncios de políticas específicas para comunicações posteriores. Não foi o caso. Trump utilizou a sua plataforma inaugural para declarar ações políticas imediatas, tais como acabar com a cidadania por nascimento e declarar uma emergência nacional na fronteira sul. Também assinou várias ordens executivas durante os eventos inaugurais, incluindo a retirada dos EUA do Acordo Climático de Paris e o perdão aos criminosos condenados em relação ao motim de 6 de janeiro de 2021 no Capitólio. Estas ações contribuíram para a atmosfera de comício e para uma constante batalha com os democratas e os republicanos (se ainda os há?) que discordam desta pessoalização.
Declarando o dia 20 de janeiro de 2025 como o “Dia da Libertação” dos americanos foi uma afronta direta a qualquer trabalho coletivo. Em vez de estender um ramo de oliveira aos adversários políticos ou de abordar a necessidade de uma “cura nacional”, Trump utilizou a ocasião para acelerar as divisões. Esta abordagem desviou a atenção a qualquer potencial mensagem de unidade, concentrando-se em justificar as suas lutas passadas e reforçar a sua narrativa de superação das suas adversidades. Nem que neste país não tivéssemos milhões de pessoas que atravessam adversidades, todos os dias.
Não há que ser ingénuo, ao adotar esta abordagem, Trump assinalou a continuação do seu estilo político combativo, dando prioridade ao envolvimento direto com a sua base em detrimento dos habituais apelos à unidade nacional que definem a maioria dos discursos da tomada de posse presidencial nos Estados Unidos. Ao conjugar a sua identidade com o destino da nação, ao dar prioridade aos seus triunfos individuais, o discurso marcou um afastamento dos discursos tradicionais, refletindo um estilo de liderança profundamente ligado à imagem pessoal, uma característica sua, mesmo antes de entrar na política.
Com a tomada de posse no dia em que se comemorou o espírito de Martin Luther King Jr., o melhor será citá-lo: “Precisamos de líderes que não estejam apaixonados pelo dinheiro, mas pela justiça. Que não estejam apaixonados pela publicidade, mas pela humanidade.”
Diniz Borges, nos EUA