Edit Template

Património Industrial

“Importa, pois, salvaguardar tudo o que nos identifica como povo, para não se perder as nossas raízes e a evolução do viver colectivo ao longo dos tempos. Esse é um contributo que os Museus proporcionam aos visitantes.”

Nos últimos dias tem-se falado muito no binómio identidade cultural/soberania, a propósito da transformação da faixa de Gaza na Riviera do Médio Oriente, uma idiotice de Trump, recusada, de imediato, por atentar contra o senso comum do mais humilde dos mortais.
A identidade cultural de um povo está ligada ao território onde ele nasceu, cresceu e se afirmou como pessoa na família e na sociedade pelo que querer alterar esta lei natural e social em prejuízo de um povo e em benefício de uns poucos é dizimar a história coletiva, por mais pequena que seja a sua dimensão.
É por isso que valorizando a nossa história nas suas mais diversas dimensões socioculturais, estamos a dignificar a nossa cultura e identidade, distintivos que, embora sujeitos à dinâmica social, se afirmam e transformam nas suas expressões literária, musical, artesanal, artística, na linguagem, na religiosidade e na atividade económica.
Importa, pois, salvaguardar tudo o que nos identifica como povo, para não se perder as nossas raízes e a evolução do viver colectivo ao longo dos tempos. Esse é um contributo que os Museus proporcionam aos visitantes.
Segundo dados recentemente publicados pelo Semanário picoense “Ilha Maior” 1, o Museu do Pico foi o mais visitado dos Açores ao longo de 2024. Registou nos três núcleos 85.621 visitantes, mais 4.617 do que em 2023. O Museu dos Baleeiros foi o mais procurado – 42.360 visitantes, 23.104 dos quais, estrangeiros -, seguido do Museu do Vinho, na Madalena, com 24.494 e o da Indústria Baleeira, em São Roque, com 18.767.
Os Museus do Pico e Carlos Machado, de Ponta Delgada, receberam 59.817 pessoas, ou seja mais de metade (56,7%) do total de visitantes de 2024.
Mesmo assim, atendendo a que o número de turistas registado o ano passado ultrapassou mais de 1,1 milhões, há ainda um longo caminho a percorrer para tornar mais atractiva a oferta museológica, diversificando ainda mais os aspectos da vida social e económica do povo açoriano.
A Ilha do Pico pode servir de paradigma para as restantes, pois os três núcleos museológicos são o espelho das vivências da população.
A salvaguarda da paisagem da Cultura da Vinha, Património Mundial e a bem sucedida e muito valorizada produção vinícola são uma extensão exemplar do património do Museu do Vinho e da História da Ilha. O mesmo se diga dos Museus dos Baleeiros e da Indústria que preservam não só o acervo baleeiro da captura de cetáceos, mas os equipamentos da produção industrial, neles integrando as mais expressivas vivências dos protagonistas da caça à baleia nas Lajes e em São Roque.
Encerrado o ciclo da baleação, iniciou-se, com sucesso, a atividade do “Whale-watching” (observação de cetáceos) e salvaguardou-se as canoas e lanchas baleeiras em todas as ilhas, utilizando-as na realização das tradicionais regatas a remos e à vela e no mais que a criatividade dos dirigentes dos clubes navais entendam empreender.
O Pico preserva e valoriza estes ciclos económicos com muito dinamismo deles retirando proveitos assinaláveis, embora publicamente não quantificados, nem divulgados.
Na ilha de São Miguel, da caça à baleia, quase tudo se perdeu. Da Fábrica dos Poços em São Vicente Ferreira, de um crime de “lesa património”, sobrou apenas a chaminé. No jardim da Vila de Capelas, um monumento evocativo da atividade baleeira e a Rua dos Baleeiros são as únicas referências existentes. Nem uma fotografia explicativa junto à rampa de varagem dos cachalotes… Nada! Não fora o Parque Atlântico que entendeu prestar homenagem a essa atividade expondo o bote “Dona Joana”, fotografias da Fabrica e um guincho, e passar-se-ia uma esponja por tão importante indústria.
O mesmo acontece com outras atividades agro-industriais.
Das fábricas onde se torrava a chicória, recordo a da Calheta, em Ponta Delgada, que o industrial Joaquim Brum pretendeu impulsionar nos anos 80 do século passado, quando esta produção já se encontrava em declínio, em favor da monocultura da vaca. O mesmo aconteceu com a cultura do Tabaco, cujos secadores também desapareceram. Todo esse património industrial desmoronou-se, sem que ninguém se preocupasse em salvaguardar o espólio dessas marcantes atividades económicas.
Isto para não recuar à tão relevante Época ou Ciclo da Laranja.
Ainda se avistam, aqui e ali, nas Fajãs, alguns mirantes donde se avistava os navios que transportavam os citrinos para os mercados europeus. Por que não instalar um centro interpretativo que atestasse a relevância desse período da nossa história socioeconómica e incentivasse a produção dessa fruta, por até as grandes quintas são abandonadas e está a recorrer-se à importação?
Nem a Fábrica do Linho da Ribeirinha, inaugurada em 1923 para rentabilizar os terrenos agrícolas, que deu trabalho a tantas mulheres daquela localidade, resistiu. O mesmo se diga da cultura da espadana.
A História micaelense não pode esquecer essas atividades agro-industriais.
Os exemplos, bem-sucedidos das Fábricas de produção de chá, da Gorreana e de Porto Formoso, demonstram que a resiliência é uma qualidade empresarial que dá os seus frutos.
O ananás de São Miguel, em aparente declínio, fez com que o industrial Cristiano Frazão Pacheco, em 1913, criasse a Sociedade Corretora. Inicialmente visava a produção e exportação de Ananases para a Europa do Norte. Depois da II Guerra dedicou-se à fabricação de compotas e conservas de atum para exportação. A Fábrica do Rosto de Cão, São Roque, encerrou e já ostenta a tabuleta “vende”, numa das paredes exteriores.
Que destino terá?
Os micaelenses, zelosos do seu passado, amantes do presente e preocupados com o futuro da sua terra têm uma palavra a dizer. Mas que não tardem!
1 Semanário “Ilha Maior”, 14 de fevereiro de 2025, nº1626

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

Edit Template
Notícias Recentes
SATA reforça voos na Páscoa e 25 de Abril
Pouco mais de 500 milhões de euros - Estrangeiros investem pouco nos Açores
Empresários de S. Miguel e Santa Maria criticam modelo de transporte marítimo
Hospital da Horta vai ter Ressonância Magnética
Pesca em Fevereiro cai para quase metade das capturas do ano passado
Notícia Anterior
Proxima Notícia

Copyright 2023 Diário dos Açores