Penso que ninguém ficou indiferente à morte do Papa Francisco, na manhã desta segunda-feira de Páscoa.
O Pontífice que veio “ do fim do mundo”, ao estar junto da multidão na Praça de São Pedro no Domingo da Ressurreição deixara expetativas de que estava a recuperar, se bem que os sinais não fossem muito animadores.
A sua tenacidade, porém, demonstrava-se nas mensagens que deixara dias antes, durante a Via Sacra no Coliseu de Roma e que constituíam a súmula do seu Pontificado: “Construímos um mundo que funciona assim: um mundo de cálculos e algoritmos, de lógicas frias e interesses implacáveis. A lei da vossa casa, Senhor, a economia divina é outra coisa”. “A economia de Deus não mata, nem descarta, nem esmaga. É humilde, fiel à terra. O caminho de Deus propõe “a via das bem-aventuranças. Não destrói, mas cultiva, repara, guarda”.
Francisco, o Papa da Igreja Sinodal, contrário ao clericalismo (“é uma peste na Igreja”), promotor do Ano Santo do Jubileu da Esperança, da Renovação da Cúria Romana, da abertura da Igreja a “Todos, todos, todos”, atento à voz e aos problemas das periferias humanas, dos migrantes e deslocados, lutador incansável pela Paz e pela Misericórdia para com todos, desafiou a mudarem de rumo os que professam uma “religiosidade estéril”: “Viestes para mudar o mundo: e para nós isso significa mudar de direção. Deixemos brotar a esperança da Páscoa nas nossas vidas e no mundo!” afirmou, antes de partir para o Pai, em jeito de testamento espiritual.
É impossível, nesta simples crónica, resumir toda o seu pensamento, expresso nas suas encíclicas, cartas e mensagens, cujos conteúdos revelam respostas inovadoras de carácter, moral, ético e teológico, sempre baseadas em fundamentos bíblicos, patrísticos e até da própria doutrina do Concílio Vaticano II, durante largo tempo propositadamente (?) esquecido por dominantes correntes conservadoras. Essas franjas eclesiásticas fizeram escola durante os últimos pontificados e dificultaram a ação do falecido Papa, na renovação da Cúria, como ele próprio afirmou no livro “Esperança”.
É no entanto, convicção dos quatro cardeais portugueses que a rumo traçado por Francisco irá continuar no seu sucessor.
Os problemas do mundo de hoje são os que Francisco colocou na agenda das suas preocupações, o principal dos quais é a Paz, a Justiça e a protecção da Casa Comum.
É interessante analisar as mensagens das diversas personalidades nacionais e estrangeiras sobre a ação do Papa argentino. Todas elas salientam a ação de Francisco em favor da paz, da justiça, dos direitos humanos, da proximidade com os mais desprotegidos.
-Francisco foi um Papa extraordinário, que deixa um singular legado de humanismo, empatia, compaixão e proximidade às pessoas. (Luís Montenegro, 1º Ministro);
- O seu pontificado foi para a Igreja e para o mundo “um sinal de fraternidade, paz e misericórdia”. (Aguiar Branco, Presidente da Assembleia da República);
-O Papa Francisco foi uma voz corajosa em defesa da justiça social, da dignidade humana e da paz” (Pedro Nuno Santos, líder do PS); - Marcou a Igreja, os católicos e outros cristãos nesta fase da história da humanidade com uma grande proximidade às causas da Paz, de defesa dos direitos económicos e sociais e de justiça para os excluídos desta sociedade (PCP);
- Fez opção pelos pobres e pelo cuidado da Terra, casa comum. Crentes ou não crentes, a todos Francisco deu esperança. (Mariana Mortágua, BE);
-Para sempre ficará o Exemplo de Fé, o sentido de Justiça, a luta incessante contra as desigualdades e a afirmação da Paz como único Caminho. (Nuno Melo, CDS); - Francisco trouxe “alegria e esperança aos mais pobres”, além de ter unido as pessoas, não só entre elas, mas também com a natureza. (Emmanuel Macron, Presidente da França);
-“Papa do povo vai ser lembrado pelo seu amor pela vida, esperança na paz e compaixão pela igualdade e justiça social”. (Roberta Metsola, presidente do Parlamento Europeu); - Francisco inspirou milhões de pessoas com a sua “ humildade e amor sincero pelos menos afortunados”. O legado do Papa “vai continuar a guiar-nos a todos para um mundo justo, pacífico e compassivo”. (Ursula von der Leyen, presidente da Comissão Europeia);
-“Mensageiro da esperança, humildade e humanidade” e uma “voz transcendente pela paz, dignidade humana e justiça social”. (António Guterres, secretário-geral da ONU);
-“Amigo do povo palestiniano e dos seus direitos”. (Mahmoud Abbas, Presidente da Autoridade Palestiniana); - “Assim como ensinado na oração de São Francisco de Assis, o argentino Jorge Bergoglio buscou de forma incansável levar o amor onde existia o ódio. A união, onde havia a discórdia. E a compreensão de que somos todos iguais, vivendo em uma mesma casa, o nosso planeta, que precisa urgentemente dos nossos cuidados”. (Lula da Silva, Presidente do Brasil);
Sintomática foi a reacção de Donald Trump: “Pediu a Deus que abençoe o Papa e todos os que o amavam”.
Mais expressiva foi a mensagem do dramaturgo Tiago Rodrigues: “até a um ateu como eu, ele deu vontade de rezar. Defendeu os pobres, os imigrantes, as minorias.”
A sensação que fica é que os políticos e governantes, a quem compete zelar pelo bem-comum e pela promoção dos direitos humanos, relevam a ação do Papa e os valores que lhe estão subjacentes, mas agem com propósitos diferenciados, para grupos restritos. Daí o apelo feito por Carlos Moedas Presidente da Câmara de Lisboa: “Francisco foi um Papa com quem os políticos deviam aprender, deviam inspirar-se na sua moderação feita através de abrir os braços a todos aqueles que o rodeavam, mas, sobretudo, cuidar dos mais vulneráveis”.
Oxalá o legado de Francisco perdure, como afirma Ursula von der Leyen, e as instituições atuem em prol de “um mundo justo, pacífico e compassivo”.
1 Cfrhttps://rr.pt/noticia/religiao/2025/04/21 - José Gabriel Ávila*
*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com