Existe expetativa da minha parte e após o que semanalmente venho a escrever na comunicação social, que se verifique uma clarificação acerca da grave situação financeira da região, por parte do governo regional – em especial na pessoa do seu presidente – mas tal não se verificou, não se verifica e parece-me que não se verificará.
Nem tudo o que se escreveu ou que a comunicação social regional tenta saber/confrontar através das solicitações que faz aos diversos membros do governo regional, merece quaisquer esclarecimentos que permitam aos açorianos encarar o futuro sem nuvens negras.
Nas palavras escritas por Ney Arruda Filho, o silêncio no espaço público político nunca poderá ser pertença dos responsáveis pela governação. Não é o tipo de atuação de que quem participa eleitoralmente e/ou paga impostos, merece.
Estamos perante um silêncio ensurdecedor, por parte dos representantes governamentais regionais, que em vez de calmo e tranquilo, como merecemos usufruir, se vem a tornar angustiante ou mesmo vazio de conteúdo e no máximo doloroso.
Por outro lado fomos e nada garante que o não sejamos em termos de futuro, surpreendidos por palavras proferidas por responsáveis políticos que nos levam a assumir que financeiramente os Açores se encontram a caminho de uma situação verdadeiramente preocupante. Os potenciais esclarecimentos ocorrem apenas no contexto da assembleia legislativa regional e entre “pares”, merecendo nós, quando muito alguns superficiais “restos” de notícias com origem na comunicação, principalmente de alguns partidos da oposição.
Surgem “palavras ditas na hora errada” por membros do governo e sem quaisquer justificações – tais como “dívida galopante” ou “descontrolada” e mesmo “endividamento”, entre outras – que não são mais do que “um silêncio ensurdecedor” que nos pode atingir, na opinião da jornalista Débora Carvalho, que não permite entender o porquê da situação.
O certo é que nós, os que vivemos nos Açores, temos o direito de conhecer a realidade.
Esta semana a comunicação social regional deu a conhecer a frágil situação financeira da região, relativa a fins de dezembro de 2024, obtida através da denominada conta da região.
Mas o que se pretende com a conta da região? Segundo o descrito no documento do orçamento da região dos Açores – ORA, a conta “visa garantir a transparência na gestão dos recursos públicos”, “avaliar a eficiência da gestão financeira” e “a responsabilidade dos órgãos governamentais”.
Ficamos assim, a conhecer que a dívida comercial a fornecedores, maioritariamente empresas regionais, segundo a conta da região no fim do ano passado, atingiu os 436 milhões de euros, sendo que nos últimos quatro anos de governação social democrata e partidos anexos (leia-se coligação) a mesma subiu 182% ou seja um valor correspondente a uma responsabilidade de mais 281,7 milhões de euros.
Do total da dívida comercial cerca de 364 milhões de euros respeitam às responsabilidades assumidas pelas empresas públicas regionais e pela administração pública direta, respetivamente em percentagens idênticas do total (cerca de 42% para cada caso).
No entanto é de salientar que no período entre 2020 e 2024 se verificou um aumento de 2600% nos valores de dívida contraída pela administração pública regional, enquanto os serviços e fundos autónomos aumentaram 340% e as empresas públicas agravaram as suas responsabilidades a fornecedores em cerca de 37%.
A dívida financeira das empresas públicas, durante 2024, cresceu cerca de 12 milhões e a da administração pública direta atingiu mais 38 milhões, enquanto aquela correspondente a fornecedores aumentou 57 milhões de euros.
Daí podermos concluir que o governo regional se financiou, sem qualquer responsabilidade financeira (leia-se pagamento de juros e outros encargos contratuais), durante 2024, em mais de meia centena de milhões e à custa do setor comercial regional.
As consequências que daí resultam são principalmente o aumento das dificuldades das empresas privadas para fazer frente às suas obrigações diárias, nomeadamente no curto prazo, obrigando bastas vezes ao recurso ao endividamento e/ou redução do pessoal afeto à respetiva atividade ou mesmo origina a diminuição de stocks, fazendo que nós cidadãos tenhamos de esperar semanas pela sua receção, ao utilizar transportes que em nada são eficientes.
No entretanto é possível através da conta da região conclui-se que durante 2024 os Açores tiveram uma receita total de cerca de 1.7 mil milhões de euros, dos quais 390 e 170 milhões foram respetivamente transferências do orçamento geral do estado e da união europeia, representando o conjunto total 23,4% da receita regional.
Embora as entidades regionais refiram a miúdo a necessidade de rever a lei das finanças regionais – LFR, o que considero efetivamente necessário mas a fazer-se de modo coerente, justificadamente e não apressadamente, verificou-se um acréscimo de transferências do orçamento do estado de cerca de 28%, como resultado da solidariedade nacional, correspondente a mais 84 milhões de euros.
Contrariamente as verbas transferidas da união europeia diminuíram em 2024 cerca de 21%, num valor de menos 35 milhões de euros. Deste valor transferido da comunidade cerca de 71%, correspondente a 121 milhões, respeitava à execução dos potenciais investimentos no âmbito do, tão mal tratado, plano de recuperação e resiliência – PRR.
Tudo isto e muito mais, dado o “silêncio ensurdecedor (que) ecoa sobre nós”, nas palavras de Rafael Zafalon, deveria ser preocupação por parte dos governantes regionais para tornar público os esclarecimentos sobre o “estado da região” de modo a que saibamos a realidade da situação financeira açoriana e principalmente com que futuro poderemos contar.
Termino com as palavras de Vasco Cordeiro ao afirmar que a ambição já não é a “livre administração dos Açores pelos açorianos”, resumindo-se, “isso sim, a pedir quiçá de chapeuzinho na mão, que nos paguem ou ajudem a pagar, aquilo que gastamos” sem qualquer contenção muitas das vezes. Reflexo disto são as afirmações proferidas pelo presidente do partido socialista, na assembleia da república, que exigir mas de modo quase a esmolar apoios paternalistas de Montenegro, que já deu entender que não está para “aí virado”.
J. Rosa Nunes
Prof. Doutor