Nestas pacatas terras ocidentais onde a emigração fez mossa profunda e abalroou a pirâmide etária, sente-se, duramente, os efeitos da automação e da inteligência artificial (IA).
Aos poucos, o cidadão da ultraperiferia insular, nomeadamente os idosos, é confrontado com decisões ditadas por centros de decisão, cujo principal objetivo é apenas o lucro e o efémero ganho de produtividade, prejudicando quem alimenta, com as suas parcas poupanças o gigantesco sistema financeiro.
- Ainda me recordo do serviço do prospetor bancário que diariamente calcorreava ruas e canadas, indo de casa em casa, de mercearia em mercearia, de oficina em oficina, resgatando do colchão, o muito ou o pouco que se apurava das atividades agrícola, comercial e industrial e oferecendo empréstimos a quem deles carecesse. Quantos postos de trabalho, com remunerações acima da média, foram criados pela banca. Com a entrada dos sistemas informáticos e a privatização da banca operou-se uma revolução silenciosa: as instituições financeiras aumentaram, assistiu-se a uma guerra pelo lucro desenfreado dos accionistas, largamente publicitado pelos meios de comunicação social, como se de um milagre se tratasse…
Nesse sistema desumanizado em que muitos, criminosamente se serviram sem castigo, milhares de portugueses perderam poupanças. A justiça, porém, tarda em decidir restituir-lhes os proventos e não atende aos anos de vida e aos penosos e irrecuperáveis tormentos. E sempre em proveito de figuras gradas e intocáveis da sociedade.
Razão tinha o célebre escritor norte-americano Mark Twain, ao afirmar que “Um banqueiro é um homem que te empresta o chapéu-de-chuva quando faz sol e que to tira quando começa a chover.”
A introdução do dinheiro de plástico no sistema bancário foi consequência da evolução da informatização. Aos poucos, os balcões foram encerrando e o pessoal diminuindo. O que antes era uma profissão de salário médio-alto passou a ser um emprego sujeito a impiedosas exigências. De tal modo que um conceituado diretor do então BCA me confessava: “Na Graciosa temos a maioria dos clientes. Mas a administração do banco ainda quer aumentar os objetivos. Só se fomos desenterrar os mortos…”
As zonas rurais e periféricas, eventualmente, onde havia maiores poupanças, foram as mais prejudicadas.
Aqui na Ponta da Ilha existiram duas agências bancárias. Nas Lajes do Pico, sede do concelho, quatro e com vários funcionários.
Presentemente, na Piedade, restam duas caixas de multibanco; a Ribeirinha tem uma e a Calheta de Nesquim outra. Frequentemente essas ATM não disponibilizam dinheiro, que é poupança dos depositantes, que pagam comissões mensais e que serve para empréstimos e ganhos avultadíssimos.
Só para recordar, o ano passado os cinco maiores bancos portugueses tiveram lucros agregados de quase 5 milhões de euros – um valor record. À conta da Caixa Geral de Depósitos-banco público – foram registados 1.735 milhões de euros, 461 milhões só em comissões.
Cabe à CGD, segundo apurei, por acordo com o Banco de Portugal, distribuir pelo arquipélago a massa monetária para o normal funcionamento da economia e das ATM.
Por razões, alegadamente de segurança, esse serviço é deficiente.
Faltam funcionários para atender os clientes (nas Lajes do Pico, existe apenas 1) e a CGD recorre, normalmente, aos depósitos efetuados diretamente pelos clientes nos equipamentos das suas agências, o que é manifestamente pouco, dado o aumento de visitantes e à massa monetária em circulação.
Bem dizia o célebre economista canadiano John Kenneth Galbraith: A maneira como os bancos ganham dinheiro é tão simples que é repugnante.”
A situação é manifestamente preocupante. Cabe aos responsáveis governamentais, em defesa das populações, tudo fazerem junto das entidades bancárias para inverter este estado de coisas.
Não é lavando as mãos ou fingindo desconhecer o problema que os governantes se credibilizam e justificam a Autonomia e o sistema de Governo próprio. - Bons serviços têm prestado às populações as lojas do RIAC espalhadas pelas ilhas. Os funcionários são acolhedores, simpáticos e competentes, embora desempenhando múltiplas funções. Uma delas relacionava-se com os reembolsos da ADSE.
Fui, entretanto, informado que esse serviço cessou, sem que os interessados fossem prevenidos.
Atendendo a que muitos associados não possuem literacia informática, nem equipamentos que lhes permitam entregar digitalmente a documentação deveria o Governo Regional ter acautelado essas situações e dificuldades. Mesmo que haja razões de outra ordem, nomeadamente financeiras.
Se os Governos autónomos não mantiverem os serviços prestados às populações, sobretudo as mais idosas, não traz qualquer vantagem a Administração dos Açores.
A política do “não é connosco” ou do “não temos nada pr’aí “ é um argumento reprovável, sobretudo quando está em causa uma população envelhecida, sem suficiente entendimento sobre as alterações que a sociedade da informação e a inteligência artificial estão a impor ao mundo.
Que os atuais responsáveis pelos destinos da população açoriana entendam que lhes compete atenuar as necessidades e resolver os problemas para que se construa uma sociedade inclusiva, seja onde for.
José Gabriel Ávila *
*Jornalista c.p.239 A
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