Direitos & Deveres é a nova rubrica semanal resultante de uma parceria entre o jornal Diário dos Açores e a sociedade de advogados José Rodrigues & Associados. Neste espaço, iremos procurar esclarecer dúvidas jurídicas colocadas pelos nossos leitores bem como abordar alguns dos temas mais comuns que entretecem a comunidade jurídica. Se tiver algum tema que queira ver abordado ou alguma questão que queira ver esclarecida, não hesite em enviar-nos um mail para [email protected].
Afinal que tipos de tribunal existem?
Ao longo da minha carreira profissional não raras vezes fui confrontada por vários clientes – e até por alguns leitores desta rúbrica – com uma dúvida que, afinal, não é assim tão incomum. Existe ou não um tipo de tribunal para todos os ramos do Direito? Um juiz ou um coletivo de juízes não tratam de todo o tipo de casos desde, por exemplo, processo administrativos, divórcios, roubos, homicídios, dívidas fiscais, heranças, conflitos laborais, comerciais, etc? A resposta para um profissional de Direito é óbvia e, como, provavelmente, acontece em todas as profissões nem sempre temos presente que quem não trabalha nem domina a área muitas vezes desconhece conceitos, terminologias, procedimentos e até a organização de uma determinada área de conhecimento. Por isso, esta semana, vamos abordar de modo necessariamente breve e simples o tema da organização judiciária.
Em primeiro lugar, vamos responder à pergunta que referimos. Não, os juízes ou coletivo de juízes não julgam todo o tipo de casos de forma aleatória ou indiscriminada. O Direito é uma área de conhecimento complexa, ramificada, interdisciplinar que exige dos seus profissionais um grau de dedicação e de conhecimento muito elevados.
Para melhor esclarecimento, vamos socorrer-nos do corpo da Lei n.º 62/2013, de 26 de agosto – a Lei da Organização do Sistema Judiciário que, como o próprio diploma indica, “estabelece as normas de enquadramento e de organização do sistema judiciário”. Logo no início, no n.º 1 do artigo 2º, consagra-se que “os tribunais são órgãos de soberania com competência para administrar a justiça em nome do povo.” Para garantir a total independência da justiça face aos demais poderes, a Lei determina que “os juízes julgam apenas segundo a Constituição e a lei e não estão sujeitos a quaisquer ordens ou instruções, salvo o dever de acatamento das decisões proferidas em via de recurso por tribunais superiores”. De igual, modo a lei também consagra o princípio da irresponsabilidade dos julgadores ao determinar que “os juízes não podem ser responsabilizados pelas suas decisões, salvo as exceções consignadas na lei”. Feito este esclarecimento prévio, convém então clarificar que existem diferentes categorias de tribunais. O n.º 1 do artigo 29.º da referida Lei da Organização do Sistema Judiciário refere que “além do Tribunal Constitucional, existem as seguintes categorias de tribunais:
O Supremo Tribunal de Justiça e os tribunais judiciais de primeira e de segunda instância;
O Supremo Tribunal Administrativo e os demais tribunais administrativos e fiscais;
O Tribunal de Contas.
Por sua vez, nos n. º 2 e 3 do mesmo artigo se esclarece que:
- “Os tribunais judiciais de segunda instância são, em regra, os tribunais da Relação e designam-se pelo nome do município em que se encontram instalados.
- Os tribunais judiciais de primeira instância são, em regra, os tribunais de comarca.
O número 4 prevê, ainda, a possibilidade de existir tribunais arbitrais e julgados de paz.
Em síntese, a base da divisão da organização judiciária em Portugal é entre tribunais judiciais, que julgam a generalidade das questões e tribunais administrativos e fiscais. A lei prevê ainda quais as competências de cada tribunal, estabelecendo um conjunto de critérios: competência em razão da matéria, competência em razão do valor, competência em razão da hierarquia e competência em razão do território.
Em razão da matéria, a regra geral é a de que “os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.
Em razão do valor, a lei “determina a competência entre os juízos centrais cíveis e os juízos locais cíveis, nas ações declarativas cíveis de processo comum”.
Por último, e por manifesta falta de espaço, esclarecer que nesta rúbrica apenas aflorámos de modo muito superficial a organização judiciária. A título de curiosidade, refira-se, ainda, que “os tribunais judiciais de primeira instância incluem os tribunais de competência territorial alargada e os tribunais de comarca” e que o território nacional se divide em 23 comarcas.
Quem quiser aprofundar um pouco mais o seu conhecimento pode consultar a Lei n. º 62/2013, de 26 de agosto – Lei da Organização do Sistema Judiciário. - Beatriz Rodrigues