Completam-se agora exactamente três meses – um trimestre! – em que já devia ter ocorrido uma Cimeira entre os Governos da República e os Regionais dos Açores e da Madeira.
A sala, no majestoso Terra Nostra, nas Furnas, até já estava decorada e pronta para o encontro.
Luís Montenegro decidiu, à última da hora, adiar o encontro quando se soube que ia haver eleições na Madeira.
Ou seja, por causa de um acto eleitoral numa das Regiões Autónomas, a outra é prejudicada na agenda de Suas Excelências em Lisboa.
Só em Portugal!
Já lá vão três longos meses, num ano crucial para acertos de investimentos ao abrigo do PRR, e os assuntos prementes, pelo menos para os açorianos, ficam nas gavetas bolorentas do Terreiro do Paço.
E um deles são as viagens entre os Açores e o Continente, que iriam passar a custar 119 euros para os açorianos residentes e 89 euros para os estudantes.
O anúncio foi feito pelo próprio Primeiro-Ministro no encerramento do Congresso do PSD/Açores, que se realizou em Outubro (cinco meses!) , em Ponta Delgada.
Luís Montenegro defendeu também, na altura, uma revisão da Lei das Finanças Regionais “que dê justiça e previsibilidade às contas da Região”, afirmando no mesmo local que “em sete meses fez mais do que o PS em sete anos”.
Já se passaram quatro meses – e não sete – e a situação é esta: nem passagens mais baratas, nem nova Lei de Finanças Regionais.
Bolieiro dizia, então, que era “um assunto prioritário”!…
É assim que anda este país, com anúncios à velocidade de um Ferrari e acção à velocidade de um carro de bois à moda do Espírito Santo.
O Presidente da Assembleia Legislativa dos Açores, Luís Garcia, fez esta semana um discurso soberbo perante o seu homólogo nacional, Aguiar Branco, justamente a alertar para a urgência da revisão da Lei de Finanças.
Havendo um consenso generalizado entre todos os partidos, não se percebe a demora, nem porque temos de esperar por uma Cimeira, que ainda aguarda o impasse madeirense.
Estamos a correr o risco de perdermos este ambiente consensual na presente conjuntura e atirarmos este e outros assuntos urgentes para os meses acalorados da campanha eleitoral autárquica e presidenciais, onde o desentendimento entre partidos é óbvio e o ambiente é propício para o apetite devorador do Tribunal Constitucional reprovar tudo o que seja em benefício das Regiões Autónomas.
Mas há mais: o líder do PS-Açores, Francisco César, ultrapassou esta semana o Governo de José Manuel Bolieiro, ao colocar-se à frente de um consenso para conseguir na República um novo modelo de transportes marítimos de mercadorias para os Açores.
Trata-se de um assunto que está na agenda há tanto tempo, mas os governos da coligação e o PSD andam a apanhar bonés, certamente ainda à espera da bendita Cimeira sempre adiada.
O Presidente da Câmara do Comércio e Indústria de Ponta Delgada veio, também esta semana, alertar para a urgência do problema, que está a afectar todas as ilhas, e não é por acaso que começam a faltar produtos nas prateleiras das lojas, inclusivé nas ilhas maiores, coisa nunca vista.
O tempo da política não é o mesmo tempo da vida do cidadão comum.
Sentados nos seus confortáveis gabinetes, os políticos precisam de um bom banho de realismo, descendo à terra dos problemas que os cidadãos enfrentam todos os dias.
É preciso mais acção e menos conversa, mais problemas resolvidos e menos cenários de espectáculo de sala.
A dita Cimeira que se realize com a Madeira quando os madeirenses resolverem quem lhes governa, mas não podemos estar nesta dependência absurda, com outra Lei em espera, a da gestão partilhada do Mar, navegando nas profundezas de um adiamento inconcebível.
A nossa Região e o nosso parlamento já deram uma imagem vergonhosa com aquela coisa a que chamaram “Reforma da Autonomia”, há quase uma década a criar bolor nas gavetas dos senhores deputados.
Não há nenhuma razão para o Governo dos Açores por-se a caminho de Lisboa e bater à porta, com estrondo, em S. Bento, dizendo ao que vem.
Afinal, são amigos ou não?!
Osvaldo Cabral
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