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“Democracias à prova”

“Cabe às forças democráticas desenvolverem ações de pedagogia política e cívica, para que a sociedade respeite os valores humanos que estão na base de uma
saudável convivência social.”

1.Uma das diferenças entre o campo e a cidade é a proximidade entre pessoas, que se traduz na entreajuda em situações difíceis, na vizinhança, no conhecimento sobre a vida da comunidade e até sobre a mundividência e opiniões de cada um.
Quanto mais pequeno é o lugar mais as conversas se tornam repetitivas. Daí os silêncios, as reservas, as poucas palavras sobretudo dos mais idosos, pois, como diz a sabedoria popular: “O silêncio é de ouro”. Todavia, ninguém ignora quem chega e quem parte.
Nesta época do ano, a presença de forasteiros “americanos”, “canadianos” e outros é sempre motivo de conversa. Todos eles despertam memórias de tempos de infância e situações e experiências de vida, por vezes complicadas, por que passaram muitos para atingir os patamares de desafogo económico de que tanto se orgulham.
Com o rodar dos anos, são cada vez menos os que regressam ao torrão natal. A geração mais velha vai ficando reduzida.
As antigas adegas, entretanto reconstruídas com o necessário conforto, vão ficando encerradas, porque os familiares da segunda e terceira gerações, sem os progenitores, já não se sentem ligados à terra de pais e avós.
Este ano nota-se, por aqui, uma diminuição de emigrantes. E fazem falta aos pequenos lugares, pois dinamizam o comércio, mobilizam a construção civil com pequenas e grandes reparações de imóveis e dão outra animação às festas religiosas e profanas de verão.
Face à nova situação política e social que se vive nos Estados Unidos, os emigrantes corroboram as notícias que por aqui vão correndo de que a América passa por um tempo difícil e a vida não está para graças.
Há dias, um casal reformado comentava, entre si, em voz audível, num minimercado local: “aqui as coisas sempre estão mais baratas que lá”.
”Lá onde?” – perguntei.
“Na Califórnia, onde vivo. Lá é tudo mais caro!”-respondeu o emigrante.
A conversa divergiu depois para a situação económica e social originada pela eleição de Trump e para os conflitos que ele prometeu em vão resolver, num abrir e fechar de olhos.
O assunto, porém, não interessou aos outros circunstantes que não ousaram participar na conversa.
Cada vez mais apercebo-me existir uma certa insatisfação e incompreensão com os emigrantes que daqui partiram há meio século e agora regressam para recuperar bens e vivências de tempos idos.
Na base dessa atitude está, julgo eu, o direito que a Constituição Portuguesa confere a qualquer cidadão nacional de poder ter acesso aos cuidados de saúde.
Conhecendo as graves limitações por que passam os que aqui vivem, quando acometidos por doenças que exigem tratamentos e cuidados médicos diferenciados, os picoenses pensam que são preteridos pelos seus conterrâneos. Alguns dizem mesmo que, como os emigrantes não pagam impostos em Portugal, (o que não é totalmente verdade) não deviam ter direito a cuidados de saúde gratuitos.
Vêm de longe os gestos de solidariedade de familiares e amigos emigrados nos Estados Unidos e Canadá.
As mudanças sociais registadas nas ilhas inverteram, felizmente, essa situação. Nesses tempos de quase penúria, os dólares e as encomendas eram uma bênção para quem passava necessidades e não teve a sorte de partir…
Nos últimos tempos, uma campanha orquestrada e destorcida, alimentada por ideologias racistas, xenófobas e antidemocráticas vem exercendo uma persistente e maléfica influência na maneira de pensar e de encarar o mundo de largas camadas da população mundial. Escondendo-se por detrás de falsas promessas e de argumentos falaciosos sobre a origem das desigualdades sociais, os poderosos financiadores dessas campanhas o que pretendem é extinguir os sistemas políticos democráticos, e substitui-los por regimes autocráticos.

  1. Sobre isto, veio mesmo a propósito o Congresso sobre “Democracias à Prova: riscos e incertezas” que decorreu esta semana na Universidade dos Açores.
    Segundo a organização, “debater as ameaças e as oportunidades que se apresentam às democracias contemporâneas” que “enfrentam desafios sem precedentes, desde a ascensão dos populismos e de movimentos conservadores e o aumento das desigualdades sociais e violências, até às ameaças cibernéticas e à crise climática” foi um espaço de reflexão importante neste tempo de crise.
    Espero que todas as instituições democráticas e respectivos representantes tenham aprendido e retirado deste Congresso as ilações necessárias para fazer face aos adversários da democracia que se aproveitam dos incautos para conseguir os seus perversos intentos.
    Alguém afirmou, recentemente, que os partidos não podem fazer o que bem entendem com os votos que receberam. Há valores e princípios de justiça, igualdade e liberdade e normas de conduta comportamentais que não podem ser desvalorizados.
    Cabe às forças democráticas desenvolverem ações de pedagogia política e cívica, para que a sociedade respeite os valores humanos que estão na base de uma saudável convivência social.
    De contrário o risco e a incerteza sobre o regime democrático agravam-se.
  2. José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

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