Da solidariedade e da vida compartilhada à importância da empatia
na construção de uma sociedade democrática
Nas vésperas do início de mais um ano letivo, a reflexão sobre a missão da escola torna-se particularmente pertinente. O regresso às aulas não deve ser entendido apenas como o retomar de conteúdos curriculares, mas também como a oportunidade de interrogar o sentido mais profundo da educação. Se é consensual que a escola deve transmitir conhecimentos científicos e técnicos, é igualmente necessário reconhecer que a sua função se estende à formação integral do ser humano. Nesse horizonte, a empatia emerge como competência indispensável, cuja ausência compromete tanto a vida democrática quanto a convivência quotidiana na sala de aula e fora dela. A Escola deve ser repensada como espaço onde a empatia é fundamental para a formação de uma cidadania viva e democrática.
A razão primeira desta reflexão prende-se com a crescente falta de empatia que graça em múltiplos contextos, tanto no quotidiano das relações interpessoais como no espaço público, particularmente nas sociedades em que a extrema-direita têm maior expressão. A incapacidade de compreender a dor ou a perspetiva do outro abre caminho a discursos de ódio e às mais diversas formas de exclusão social.
Neste contexto, a ausência de empatia é preocupante, especialmente numa época em que o individualismo e os discursos populistas se instalam em muitas sociedades. Uma comunidade que aprende a escutar, a compreender e a responder ao sofrimento e às necessidades do outro constrói-se sobre alicerces sólidos, resistentes a extremismos, racismo, xenofobia e, por conseguinte à promoção de políticas que fomentam as desigualdades sociais. Ensinar a empatia é, portanto, preparar cidadãos capazes de habitar o mundo do outro, tornando-o simultaneamente mais justo e humano. Onde há empatia, não germinam os mecanismos de marginalização. A empatia, mais do que uma virtude moral, é uma estrutura de sustentação da vida democrática e da coesão social.
A empatia pode ser entendida como a capacidade de reconhecer e compreender as emoções e perspetivas dos outros, estabelecendo um vínculo simultaneamente afetivo e cognitivo que torna possíveis relações sociais mais justas e solidárias. Uma sociedade que cultiva a imaginação empática é capaz de reconhecer a dor e a dignidade de cada indivíduo, evitando a cegueira moral que conduz à exclusão. Por isso, a empatia não é apenas uma disposição individual desejável, mas uma condição necessária para a cidadania ativa e para a vida política assente na paz, na justiça e na igualdade.
É precisamente na escola que se deve começar a cultivar essa competência decisiva. Mais do que qualquer outra instituição social, a escola tem a responsabilidade de preparar cidadãos capazes não apenas de dominar conhecimentos técnicos, mas também de exercer uma cidadania atenta, solidária e dialogante. Ensinar empatia significa dotar as novas gerações da capacidade de reconhecer a dignidade alheia, de resolver conflitos de forma construtiva e de resistir às tentações simplistas do discurso populista.
A escola tem sido tradicionalmente vista como espaço de transmissão de conhecimento, mas no século XXI esta visão revela-se insuficiente. Para preparar cidadãos completos, a educação deve incluir a aprendizagem das chamadas competências sócioemocionais, como a empatia, cooperação, comunicação e a auto-regulação.
Neste sentido, incluir a empatia nos currículos escolares não é um luxo pedagógico, mas uma necessidade. As sociedades contemporâneas, marcadas por diversidade cultural, desigualdades e polarização política, exigem que as novas gerações cresçam com a capacidade de se colocar no lugar do outro, dialogar e resolver conflitos de forma não violenta.
As crianças que aprendem a reconhecer e a nomear as suas emoções adquirem uma consciência mais clara de si próprias, o que lhes permite regular impulsos e reagir de forma equilibrada em situações de tensão. Esse processo de autoconhecimento traduz-se em maior autocontrolo e numa relação mais saudável com os outros. Ao saberem identificar aquilo que sentem, tornam-se também mais capazes de compreender os sentimentos alheios, o que favorece a empatia, a cooperação e a competência social indispensável à vida em comunidade.
Um estudo conduzido por Jesper Juul, pedagogo dinamarquês, mostra que quando a escola reconhece o valor da empatia como competência, ela passa a ser tão essencial quanto aprender matemática ou ler e escrever. Esta abordagem reduziu significativamente casos de bullying e fomentou um clima de maior cooperação entre pares.
Não é por acaso que a Dinamarca figura consistentemente entre os países com maior índice de bem-estar social e de felicidade. A formação empática de crianças e jovens é vista como um dos pilares desse resultado.
O caso dinamarquês lança um desafio para outros países incluam a empatia nos currículos escolares. Está provado que a ausência desta competência favorece ambientes escolares competitivos, marcados por isolamento emocional e conflitos.
A empatia, ensinada com método e intencionalidade, não apenas melhora o clima escolar, mas prepara futuros adultos mais solidários, atentos ao outro e capazes de construir sociedades menos desiguais, se desenvolvermos e cultivarmos desde cedo, a imaginação empática como parte de uma educação para a cidadania mundial.
Cabe agora a outros sistemas educativos aprenderem com a experiência dinamarquesa e assumirem a empatia como prioridade pedagógica. Porque formar cidadãos competentes não é apenas formar técnicos eficazes, mas sobretudo seres humanos capazes de sentir, compreender e agir com sentido de justiça e na construção da paz.
Henrique Levy *
*Poeta e ficcionista