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Açores em destaque na COP30 com liderança na preservação de mares e oceanos

A Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas – COP30 acontecerá de 10 a 21 de novembro, na cidade de Belém, no Brasil. São esperadas delegações de mais de 190 países, a maioria signatária do Acordo de Paris e mais de 50.000 participantes de diversas entidades, ONGs e sociedade civil. A convite da Presidência da COP30, os Açores reafirmam a sua liderança internacional na restauração de oceanos e regiões costeiras e ocupam lugar de destaque na Comitiva de Portugal, país membro da UNFCCC – United Nations Framework Convention on Climate Change. O Diário dos Açores apurou qual será a missão açoriana na COP30, em entrevista exclusiva com o assessor do Presidente do Governo dos Açores com a pasta do Mar e das Pescas, o Bernardo Brito e Abreu e com o biólogo, doutorado em Geografia pela Universidade dos Açores, Adriano Quintela. Ambos atuam no Programa Blue Azores, na coordenação por parte do Governo e na gestão operacional e de informação, respectivamente.

A COP da ação

A COP30 terá como foco a apresentação de soluções, tecnologias e melhores práticas que possam servir de travão à destruição, vulnerabilidade e injustiças climáticas, principalmente entre os países em desenvolvimento. No seu discurso na abertura na sede das Nações Unidas, na celebração de 80 anos da instituição, o Presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva, enfatizou que “a COP30 em Belém, será a COP da verdade. Será o momento para os líderes mundiais provarem a seriedade de seu compromisso com o planeta”.
Os Açores farão parte do Grupo de Ativação da Agenda de Ação para Proteger e Recuperar Ecossistemas Oceânicos e Costeiros, com a responsabilidade de transmitir experiências, estratégias e instrumentos de proteção de mares e oceanos, que são os principais reguladores do clima e capazes de conter a temperatura, absorver o calor e o CO2. O apelo é plural e urgente pela própria sobrevivência humana, apelou o Presidente da COP30, o embaixador André Correa do Lago, que tem a sua carreira política focada no desenvolvimento sustentável sendo, desde março de 2023, vice-ministro do Clima, Energia e Meio Ambiente do Ministério das Relações Exteriores do Brasil

“A ação climática passa muito pelo oceano. Há um nexo oceano-clima e quem está à frente são as regiões arquipelágicas, as que mais sofrem com a subida do mar, dos eventos meteorológicos extremos e de biodiversidade. No palco do clima elas têm uma voz muito importante.”

Bernardo Brito e Abreu

Blue Azores: parceria
bem-sucedida entre Governo, academia e organizações de caráter público e privado garante vanguarda na conservação oceânica

Proteger, promover e valorizar o capital natural marinho dos Açores é a razão da existir do Programa Blue Azores. Liderado pelo Governo Regional, conta com a parceria da Fundação Oceano Azul, do Instituto Waitt e do apoio da Universidade dos Açores, tendo como representante do Governo e coordenador do Programa Blue Azores, Luis Bernardo Brito e Abreu, licenciado em Ciências Militares Navais, pela Escola Naval Portuguesa e mestre em Arquitetura pela Universidade de Lisboa. Desempenha, atualmente, as funções de assessor do Presidente do Governo dos Açores.
O Programa manteve-se por três mandatos e vem ganhando relevância e apresentado resultados, daí a participação na COP30. O início da delimitação de Áreas Marinhas Protegidas de proteção total em 15% do mar dos Açores aconteceu em 2021. No ano seguinte, deu-se o compromisso do Governo com a expansão dessas áreas para 30% durante a Conferência das Nações Unidas, em Lisboa, o que foi ratificado em Baku, na COP29 Afeganistão em 2024. A partir daí, as Áreas Marinhas Protegidas – AMP Costeiras e Oceânicas, foram reorganizadas em rede, na estratégia denominada RAMPA – Rede de Áreas Marinhas Protegidas dos Açores, que entrará em vigor sob a forma de lei a partir de 1 de janeiro de 2026.

“Do ponto de vista histórico, o Blue Azores começa a quebrar o paradigma de uma região percebida pelos próprios cidadãos como sendo ultraperiférica, de muitas necessidades, para a visão de centralidade e de oportunidades, advindas da riqueza da dimensão marítima de 1 milhão de quilômetros quadrados e ativos mundiais. Tem a ver com imensas ações produzidas nestes seis anos, mas estas ações foram possíveis porque a gestão da proteção está centralizada no chefe do governo”.

Bernardo Brito e Abreu

Adriano Quintela, licenciado em Biologia Marinha e doutorado em Geografia, é especialista em gestão integrada de zonas costeiras. Integra o Programa Blue Azores desde 2021, corrobora dessa visão e ressalta a necessidade de se avançar para índices consistentes. “São coisas muito concretas, difíceis de medir. Precisamos dar os próximos passos, nos processos de monitoração das espécies para garantir aos stakeholders que os investimentos feitos para preservar essas áreas estarão a gerar benefícios”, revela o biólogo.

Um programa
ganha-ganha

Além de pessoas e do meio ambiente, o Programa Blue Azores pretende que setores económicos como a pesca, o turismo, a ciência, a biotecnologia e outros tantos, se desenvolvam e sejam igualmente sustentáveis, participando como co-criadores. Se a proximidade com os interesses do Governo é vital, o apoio proveniente das parcerias é igualmente valorizado, não só pelos recursos alocados, como pela agilidade de execução e desburocratização quando comparadas à máquina pública, que viabilizam grandes avanços num menor espaço de tempo.

“É preciso agir agora, não podemos esperar mais. Em 2030, o Governo dos Açores quer essas áreas já a criar benefícios, com implantação efetiva. Isso terá que ser feito através do exemplo. Nós vamos cumprir esse objetivo, fazendo. E não podemos deixar ninguém para trás.”

Adriano Quintela

Os entrevistados enfatizaram que a robustez do progresso conquistado até agora vem do inventário de mais de mais de quatro décadas de investigação da ciência do Departamento de Oceanografia e Pescas (DOP) que desde 2022 atende como OKEANOS – Instituto de Investigação em Ciências do Mar da Universidade dos Açores. Essa é a composição da tríade que alimenta as bases de sucesso: governo, iniciativa privada e academia.

Green Zone: vem aí um
Mutirão Global pelo clima

Na agenda da COP30, a mobilização coletiva e voluntária por um objetivo comum tratada no Brasil como “mutirão”, acontecerá na Green Zone. A Zona Verde ocupará todo o espaço do Parque da Cidade de Belém, onde líderes globais, instituições públicas e privadas e sociedade civil estarão concertados na busca da inovação e investimento sustentável. Os participantes dos grupos de trabalho terão a tarefa de complementar de forma concreta as decisões da Blue Zone ou Zona Azul, restrita aos chefes de estado, da qual Portugal participa como país membro do Acordo de Paris. Dentre as premissas estão a troca de soluções de alto impacto e de retorno sobre o investimento para aplicação imediata; a aproximação de qualidade entre os defensores do clima e a consciencialização sobre a importância da Amazônia e de sua cultura local. Participam da Green Zone diversas entidades protagonistas nos eixos propostos para proteção às florestas, dos corais, mangais, entre outros. Um pavilhão inteiro será dedicado à temática oceânica e os trabalhos serão orientados pela investigadora e coordenadora do Laboratório de Gestão Costeira Integrada da Universidade Federal de Santa Catarina, Marinez Scherer. A articulação já está em curso, antes mesmo do encontro, com a intenção de acelerar propostas e definir índices de melhoria até 2028. É com esse propósito os Açores aceitaram o convite para contribuir na próxima COP30.

“O Blue Azores tem sido olhado internacionalmente como uma iniciativa exemplar na proteção dos oceanos e capaz de influenciar e criar modelo que possa ser replicado em outros pontos do globo.”

Adriano Quintela

A meio da “Década dos Oceanos” falta reação

Não foi por falta de aviso. Em 2017, a Assembleia Geral das Nações Unidas fez um alerta à comunidade científica e partes interessadas sobre a gravidade da poluição e aquecimento em curso nas águas e pediu agilidade de avanços de preservação e mitigação das questões do clima e viabilização dos Objetivos Sustentáveis – ODS, dentro de sua Agenda 2030. Daí surgiu a convocatória para a Década da Ciência Oceânica para o Desenvolvimento Sustentável (2021-2030).
Liderada pela UNESCO, a Década dos Oceanos também chama a atenção para o fato de 35% dos recursos de peixes mundiais estarem sendo sobre-explorados ou em estado de esgotamento, conforme estudo da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura – FAO. Desde então, a reversão do aquecimento global dos oceanos vem sendo tema primordial nas discussões e atinge seu ponto mais crítico na presente edição da COP, a primeira a se realizar depois de consolidada em 2024, a alta de temperatura em 1,5 grau centígrado.

“Os Açores estão a liderar de forma mundial uma agenda que também é mundial.”

Bernardo Brito e Abreu

Mais peixes, ecossistemas mais saudáveis e resilientes frente às questões do clima são os objetivos.
Destoando da inércia mundial na proteção dos mares e oceanos, a rede de proteção dos Açores acumula mais de 300mil km2: é a maior do Atlântico Norte. E não está relacionada apenas ao bem das próximas gerações por meio da proliferação de cardumes e contenção de espécies invasoras. A salubridade do ecossistema marítimo e económico também depende da restituição de minerais, da redução das fontes poluidoras, como os microplásticos. Tudo isso acontece de forma lenta, em desalinho com o ritmo frenético de exploração pelo homem e das comprovações científicas. “Os ciclos de observação e mensuração serão definidos nos planos de gestão, paralelamente a outras monitorações de diretivas europeias e exigirão alguns anos para formação dos “celeiros marinhos”, observou Quintela. Com o passar do tempo, parece óbvio que haja um imenso ganho no stock de vida marinha e de recursos por meio desses “celeiros”. Não há discussão sobre seguir as métricas protecionistas de 30% pela ONU, União Europeia e Portugal. No entanto, as projeções mais otimistas demonstram que a RAMPA esteja a funcionar na sua total capacidade, a partir de 2018. É preciso estabelecer mecanismos financeiros e de apoio que suportem essa transição, que passam por compensações, pela garantia de renda às famílias e por novas alternativas de modo de vida, preocupação que, de acordo com Quintela, “está a ser trabalhada juntamente com o Governo, no sentido de equilibrar a balança da cadeia de valor, distribuindo os ganhos de uma forma mais equitativa”. Noutra vertente, a mudança de mentalidade passa pela educação ambiental, pela capacitação de pescadores e delimitação de reservas naturais voltadas unicamente ao turismo. “Há aqui duas frentes muito importantes: a externa, internacional a nível de advocacy, visibilidade e de apoio e a dimensão interna. Porque nada se faz sem o convencimento dos pescadores, dos professores, da população em geral, das ONGs e agentes económicos”, explica Brito e Abreu, acrescentando que “é impossível haver decisões unânimes. Existem muitos setores económicos e da opinião pública que tem opiniões divergentes. Ninguém é contra a sustentabilidade. Ninguém é contra a conservação, mas existem divergências sobre como interpretar e como conquistar estes objetivos. Apesar de não haver a comprovação em todos os dados é certo de que o custo da inação é maior do que o da ação”.

“Felizmente, os açorianos têm uma visão comum ao seu mar. Parte do sucesso está nas próprias pessoas. Podem ter divergências
no método, no processo, dúvidas e receios de implementação, mas temos a grande vantagem de todos estarem alinhados nessa missão.”

Bernardo Brito e Abreu

O aquecimento médio global de 1,5 grau já é realidade.
Como era esperado, movimentações em todo o mundo não foram suficientes para evitar a elevação da temperatura, que vem sendo associada a diversos fenómenos climáticos e às suas consequências em todo o globo: desgelo, enchentes, chuvas torrenciais, incêndios de enormes proporções, terremotos, tsunamis, dizimação de recursos naturais e das espécies. O tempo para o planeamento esgotou. São necessárias cooperação e força de implantação com efeitos imediatos no combate à crise climática. Com a sua vocação de cumprir antecipadamente as metas para a Agenda 2030 da ONU, os Açores apresentam-se como um exemplo a ser seguido na capacidade de gestão do oceano. Todavia, até o momento não existe a presença jovem ou massa crítica de organizações não-governamentais no arquipélago militando pelo clima, o que traz ao Programa Blue Azores a oportunidade de estimular novas frentes pela participação ativa e mais decisores nas políticas públicas. Os mares e oceanos pertencem a todos. O debate plural será sempre mais efetivo pelo bem comum.

Acompanhe a série de reportagens sobre a COP30, diretamente de Belém, por Marisa Furtado, correspondente exclusiva do Diário dos Açores no Brasil.

Marisa Furtado
Correspondente exclusiva
do Diário dos Açores, no Brasil

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