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As “obrigações” travam o turismo

Ao celebrar o cinquentenário do 25 de Abril vêm-nos à memória os graves problemas com que se confrontavam então as populações insulares, obrigando-as a um êxodo para a América do Norte, cujas consequências hoje se fazem sentir, dolorosamente, nas ilhas menos populosas.
Os baixos rendimentos da atividade e da produção agrícolas, os impedimentos em aceder a níveis médios de escolaridade, os fracos recursos dos organismos estatais para acorrer às necessidades básicas, o ancestral insulamento, constituíam motivos suficientes para aliciar famílias inteiras a rumar aos EUA e Canadá, em busca de novos, mais vastos e promissores horizontes.
A questão dos transportes era um calcanhar de Aquiles. Não havia reflexão pública que não os focasse, embora sem resultados palpáveis. Os decisores residiam no Terreiro do Paço. Pouco ou nada entendiam de mobilidade insular, como hoje se diz e não moviam uma palha para melhorar as ligações marítimas insulares.
Até os chamados Barcos do Pico que tão bons serviços prestaram às populações do Grupo Central no transporte de pessoas e mercadorias, em dada altura, foram impedidos de navegar entre Terceira e São Miguel, cavando entre os dois principais polos económicos um fosso ainda mais profundo com a imposição de restrições à venda de alguns produtos.
Depois de Abril, construiram-se portos e aeroportos em todas as ilhas e percebeu-se que a maior riqueza do todo é o desenvolvimento de cada uma das partes.
O desenvolvimento turístico, que só muito recentemente aconteceu, veio provar que os transportes são a mola real do desenvolvimento e fixação das populações à sua terra. Para isso, porém, houve que adequar as infraestruturas aeroportuárias para responderem à procura e aos meios aeronáuticos utilizados.
Decorridas algumas décadas, o tráfego aéreo já não se compadece com a dimensão das pistas dos aeroportos do Pico e do Faial, cujas limitações restringem a sua operacionalidade. Daí o reclamar-se a sua ampliação. Esse projeto, porém, está a demorar demasiado, atendendo ao significativo aumento do tráfego registado nos últimos anos.
Espero que essa demora não afete a procura pelos destinos do Triângulo: São Jorge, Pico e Faial. Seria um erro tremendo e imperdoável.
Ao contrário do que possa pensar-se, o acesso àquelas ilhas não pode passar sobretudo por escalas longas noutros aeroportos, o que encareceria o destino.
O Concurso público do contrato de concessão do serviço público de ligações aéreas entre o continente e os Açores e Madeira, para um período de 5 anos, tem um custo para os cofres do Estado de 45 milhões de euros. As exigências, no entanto, são muito restritivas e como tal inaceitáveis.
O porta voz do Grupo do Aeroporto da Horta afirmou há dias que, em 2023, houve dez voos semanais no verão, “temos a exigência de 14 voos semanais e aquilo que nos oferecem são apenas seis voos”. No inverno as ligações aéreas de serviço público são reduzidas para quatro por semana, muito abaixo da oferta existente.
Na rota Lisboa/Pico/Lisboa, as companhias terão de efetuar três viagens por semana durante o Verão, (a oferta presente já é de 5, com possibilidade de o número de passageiros crescer) e de pelo menos duas durante o Inverno, quando em abril, maio e outubro já existem quatro viagens.
Sabendo-se que o número de passageiro é muito superior ao caderno de encargos, esperava-se que o Governo dos Açores e a Secretaria da tutela tomassem uma posição firme e corajosa, tendente a alterar as cláusulas do concurso. Tal não aconteceu, infelizmente.
Essa posição foi tomada há dias – e bem! – pelos responsáveis do PSD na Ilha do Pico.
Em meu entender, eles não recearam dar publicamente um “puxão de orelhas” ao Executivo de Bolieiro que deveria, esse sim, assumir a defesa dos açorianos no seu conjunto, tal como afirma no seu programa do Governo: “A coesão territorial é uma aposta clara”(pg 13). O compromisso, é “Tratar todas as ilhas com equidade, promovendo políticas de futuro, mas sem nunca esquecermos as nossas características distintas”.
Em silêncio ficaram também outros dirigentes e deputados açorianos do PSD, sempre tão lestos em acusar o governo anterior.
Faltou solidariedade política regional para com as ilhas do Pico e do Faial.
E teria sido bom que tal tivesse existido, para que os eleitores acreditassem nas promessas e afirmações feitas no recente período eleitoral.
A postura do PS-Açores relativamente às restrições das cláusulas do concurso não é admissível.
A direção regional do PS não disse nada. Nem ao menos se pronunciou sobre a oportunidade da nova ligação entre a Terceira e o Funchal, a qual irá, certamente, penalizar outros destinos mais necessários e procurados, retirando ao bolo de 45 milhões, por cinco anos, verbas importantes.
Para o PS-Açores os maiores receios sobre o transporte aéreo recaem sobre a eventual diminuição(?) do tráfego de aviões e de passageiros no aeroporto de Ponta Delgada e os seus reflexos na indústria turística micaelense.
Esta visão parcelar de uma realidade multifacetada denota um paroquialismo na análise e um desinteresse pelos problemas daí decorrentes para passageiros e agentes económicos. A centralização em Ponta Delgada de grande parte dos voos vindos do exterior, nomeadamente do continente português e a distribuição dos passageiros pelas restantes ilhas através da Air Açores, como se depreende do numero de voos programados pela SATA para as lhas do Pico e do Faial indicia que o concurso está feito à medida. E os constrangimentos provocados pelo aumento das horas de voo, pelos atrasos e outras complicações que sempre surgem? E o turismo das outras ilhas?
Nada disso interessa?
É tempo de os partidos que são ou foram governo avaliarem cuidadosamente, as consequências das suas decisões e não desvalorizarem as “ilhas pequenas” para que o arquipélago se una e fortaleça.
Tal como está, o Concurso público do contrato de concessão do serviço público de ligações aéreas entre o continente e os Açores não serve e, durante cinco anos, irá emperrar o esperado crescimento do turismo nas nove ilhas, por não admitir o aumento do número de visitantes.
A concentração do tráfego no Aeroporto de Ponta Delgada, agravará, certamente, ainda mais a já precária e deficiente resposta ao movimento ali registado, situação que penalizará passageiros e companhias aéreas.
Só espero que esse conceito tão do agrado de certa ideologia económica não promova ainda mais o distanciamento social, o despovoamento e o envelhecimento demográfico.

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

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