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Politicamente (in)Correto

É histórica a dificuldade de convivência da generalidade dos dirigentes políticos nacionais com as autonomias regionais.
Seja pelo profundo desconhecimento, normalmente apenas atenuado em sede de campanha eleitoral (e mesmo assim com algumas “gaffes” geográficas a administrativas de monta…), seja pela ideia de ultraperiferia mal concebida, desenvolvida e aceite por gente que muito mais facilmente se centraliza no eixo Lisboa-Bruxelas do que procura efetivamente conhecer a realidade do seu país, as particularidades de uma região autónoma, os problemas e dificuldades que resultam da situação ultraperiférica e, no caso específico dos Açores, de uma autonomia a duas velocidades e de uma ultraperiferia díspar, do ponto de vista do desenvolvimento equitativo e harmonioso das suas comunidades.
Por isso, não surpreendeu o que Rui Rio fez, há cinco anos, no âmbito da definição das escolhas para a lista social-democrata ao Parlamento Europeu, deixando à beira de um ataque de nervos João Bosco Mota Amaral e as estruturas regionais do PSD.
Juntando este facto à fatalidade que vitimou o saudoso André Bradford (teria sido uma ótima voz açoriana em Estrasburgo…), os Açores passaram ao lado da representatividade junto das instâncias europeias, até que Paulo Nascimento Cabral, há dois anos, se juntou à respetiva Representação de Portugal, ocupando-se de assuntos relativos à Região e à Energia.
O que Luís Montenegro agora assumiu, com a constituição da lista da Aliança Democrática ao Parlamento Europeu, em 2024, é um atentado assumido à autonomia, à capacidade de representação das ultraperiferias portuguesas (até em comparação com outras regiões europeias com as mesmas dimensões e características), e é uma total falta de respeito pelas açorianas e pelos açorianos, pelos seus anseios, pelos seus direitos e pelas suas ambições.
Montenegro foi absolutamente colonialista na sua abordagem.
Não vale a pena, em sede de campanhas eleitorais, passear-se em ruas das ilhas açorianas – até em ilhas “da coesão”… – se, quando pode, deve e tem de dar sinais efetivos, evidentes e inequívocos de respeito e compreensão pelo fenómeno autonómico, vira as costas aos Açores (e à Madeira…), rende-se ao inconcebível e incompreensível critério do “mediatismo fácil” de um rapaz de 28 anos que, independentemente dos méritos e credenciais que possa exibir, está muito longe das qualidades e, sobretudo, da experiência necessária para encabeçar um projeto ao Parlamento Europeu, e deixa-se ultrapassar pelo Partido Socialista que, muito bem, coloca o candidato apontado pela estrutura dos Açores num lugar de eleição garantida.
Mais um tiro no pé dado pelo Presidente do PSD, suscitando a natural ira dos dirigentes regionais, e levantando óbvias questões relativas ao posicionamento destes quando em sede negocial com o governo da República (e tantas, e tão importantes são as matérias que se antevêem no horizonte para os próximos quatro anos).
Quer dizer: depois deste desprezo torpe, o que esperar do espinhense como Primeiro-Ministro, na sua relação institucional (e até pessoal) com a Região Autónoma dos Açores? E, sobretudo, o que esperar da reação institucional de José Manuel Bolieiro?
Conhece-se a forma e o estilo do líder do PSD Açores: dialogante, consensual, equilibrado, à procura de pontes e não de tempestades na sua relação com todos os “players” da vida pública e política regional e nacional. Mas este ataque – porque de um ataque se trata – à autonomia e à sua verdadeira representatividade além-fronteiras, exige de Bolieiro uma posição de força, pública e inequívoca, sob pena de, também ele, ser de imediato acusado de receios e subserviência.
Aguarda-se um murro na mesa. Sonoro. Estridente. Que faça perceber a Montenegro que Paulo Nascimento Cabral não é um número para preencher lugares, e que os Açores merecem muito mais da parte de alguém que, quando conveio, teve declarações curiosas e claramente defensoras da especificidade dos arquipélagos portugueses.
Por outro lado, esta questão espoletada pelo desprezo de Montenegro para com Açores e Madeira traz de novo à tona de água a importância dos círculos ultraperiféricos para o Parlamento Europeu. Uma matéria estrutural e estruturante, que os atuais responsáveis políticos açorianos (incluindo a Assembleia Legislativa Regional) têm de levar a peito como uma missão de legislatura, na sua capacidade de influenciar “lobbies” e preparar argumentos.
Independentemente da capacidade do seu candidato, o PS esfregou as mãos com esta notícia. Cumpriu, embora com o fortíssimo “handicap” de não ter em Vasco Cordeiro o (mais que óbvio) nome a indicar, as suas responsabilidades para com os Açores.
E muito bem, também, a Iniciativa Liberal, com os candidatos das regiões autónomas logo a seguir ao líder da sua lista, João Cotrim de Figueiredo.
Para que Bolieiro marque efetivamente a sua posição, importa uma reação forte, rápida e imediata. Terá o líder do PSD Açores intenções de a promover? E de que forma?…

Rui Almeida*

*Jornalista

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