Não, não me rendi ao Natal esvaziado do sentido religioso antigo que parece pretender impor-se nestes nossos dias, reduzido a umas Festas Felizes que se desejam como se fossem apenas o assinalar de um evento de calendário, concretamente o final de um ano civil e o começo de um novo ano. Bem podem aumentar as luzes e os apelos ao consumismo mais ou menos desenfreado, que para mim o Natal será sempre a festa de aniversário do nascimento de Jesus, Deus feito homem para nos garantir a salvação eterna.
É uma questão de Fé! Mas a Fé não é um mero lenitivo para as nossas limitações humanas; traz consigo a certeza de uma orientação para a vida, enche-a de significado, até aos pormenores mais pequenos, e dá a quem a entende e dela vive uma alegria sem par.
Jesus Menino, que festejamos agora, é uma personagem da História. É ele que faz a grande ruptura da transcendência divina entrando nos afazeres do dia a dia dos seres humanos. Feito igual a nós em tudo, excepto no pecado, como na Doutrina nos ensinaram, tornou-se nosso companheiro de jornada, de cada pessoa que queira, através dos tempos, privar com ele. Não é uma personagem que passou, antes permanece vivo e ao nosso alcance; basta que nos disponhamos a aceitar a sua companhia.
Tocamos assim o grande amor de Deus pelo Homem, a sua criatura preferida, a única com quem partilhou a inteligência e portanto também a liberdade. Deus nosso Criador deixou-nos livres de o reconhecermos como tal e lhe retribuirmos com o nosso amor. Por isso há muitos que através da História livremente o recusaram, e tantíssimos os que o fazem ainda hoje, aceitando implicitamente as consequências da sua livre escolha.
Para quem opta por viver com Ele, esmera-se Deus em acompanhá-lo, dando a cada um aquilo de que mais necessita, mesmo que nem sempre se consiga compreender o que assim pretende. É a Fé que nos dá a certeza de estarmos em boas mãos!
Ao longo dos dias da quadra do Natal vamos reviver os episódios da infância de Jesus, cheios de simplicidade e por isso talvez carentes de sentido para quem não tem Fé. A deslocação do casal de Maria e José, inteirados da grandeza da missão que lhes fora confiada, para Belém, a fim de cumprirem com as determinações da autoridade do César Augusto, que ordenara o recenseamento dos cidadãos do Império, culmina no nascimento de Jesus numa gruta onde se guardava gado; e por isso o sinal dado aos pastores é que encontrarão um Menino deitado numa manjedoura.
A adoração dos pastores inspirou os artistas ao longo dos séculos. Deles se destaca São Francisco, o pobrezinho de Assis, que, faz agora 800 anos, em Greccio, pela primeira vez montou um presépio, iniciando uma tradição que persiste nas nossas casas e nas igrejas e em muitos outros sítios. Nas nossas ilhas dos Açores parece até que tal tradição passa por uma fase de euforia, e é bom que assim seja, empenhando-se as pessoas, as famílias, as empresas e as próprias autoridades administrativas do Poder Local democrático em promover iniciativas para a fortalecer e valorizar.
Tenho recebido mensagens com votos de Feliz Natal acompanhadas de fotografias dos presépios que cada um fez em sua própria casa. Também aqui temos já o presépio instalado em lugar digno da sala de estar, fazendo-nos companhia e às visitas ao longo de toda a quadra natalícia. Sentimo-nos assim mais próximos uns dos outros e vamos até de casa em casa para ver os presépios, mesmo que já os tenhamos visto nos anos anteriores e afinal sejam as mesmas figuras nos mesmos lugares que nos esperam.
O tempo passa depressa e daqui a dias estaremos já a acolher a vistosa comitiva dos Reis Magos, com os seus camelos e numerosos guardas e servidores, trazendo presentes régios para ofertar ao Menino Jesus. A Estrela do Natal, qualquer que tenha sido a sua natureza, guiou esses estudiosos dos astros até Belém, onde viram o Menino e a sua Mãe e prostrando-se o adoraram. Julgo já alguma vez ter aqui mencionado o belo alto relevo de talha dourada e policromada de um altar portátil, existente na Catedral de Estrasburgo, onde aparece também São José, guardando numa gaveta a bolsa com o ouro, trazida por um dos Magos. Mas isto seria já imaginação do artista, pois a narração de São Mateus não menciona sequer a presença do Pai adoptivo de Jesus em tal altura.
Escrevi Pai adoptivo porque o Pai de Jesus é o próprio Deus e a concepção dele por Maria foi obra do Espírito Santo. Isto mesmo proclamamos no Credo que se reza em todas as Missas de Domingo. E é para se tomar a sério e não para tergiversarmos em habilidosas explicações que só confundem as pessoas e acabam pondo em causa a Divindade de Jesus, o nosso Redentor e Salvador.
João Bosco Mota Amaral*
- (Por convicção pessoal, o Autor não respeita o assim chamado Acordo
Ortográfico)