Quando falo da Sata, sinto que estou a falar de família. Sou do tempo do Ponta Delgada e do Carvalho Araújo, de doze horas de enjoo entre as Flores e o Faial para, ainda com a cabeça “mareada”, ficar cativa no colégio de Santo António por mais um período letivo.
No dia em que entrei num avião pela primeira vez, tive a certeza que nem o euro milhões me faria ser dona de um iate. Nunca. O avião é o meu meio de transporte. O batismo de vôo foi um avião militar bastante usado, mas conduzido pela perícia dos militares da Base das Lajes que sabem tudo sobre intempéries, evacuações e operações de emergência.
A Sata foi a experiência seguinte e, como já referi, passou a fazer parte da família. Os comandantes passaram a estar á mesa nas histórias de turbulência ou aterragens arrebatadoras, as assistentes de bordo amigas do coração no tempo em que seguravam a minha mão suada de terror.
Hoje em dia, a confiança é rotina. Completamente tranquila, o voo é uma fuga ás rotinas da ilha quando o inverno nos deixa claramente em modo solidão.
Estou neste momento dentro de um avião da Sata em voo para Lisboa. Escrevo no telemóvel para estar ainda sob a impressão que me provocou hoje a caixinha linda que é oferecida com um snack, a bordo da nossa companhia. Não é a primeira vez que tenho esta sensação, mas senti que devia partilhar os meus pensamentos que podem coincidir com reflexões de outros passageiros.
A caixinha de hoje era da Terceira. Bonita e colorida, acredito que seja uma surpresa muito agradável para quem visita a região pela primeira vez.
Quando a abrimos, muda tudo. Há um bolo levedo frio, muito frio e muito duro com uma fatia de fiambre e outra de queijo sem sabor. Para piorar o cenário, o dito bolo levedo vem num saquinho de papel que diz “ desfrute de um pedacinho de sabor dos Açores “.
Não gosto da frase porque o conteúdo não corresponde á promessa.
Não é uma critica barata. Em muitas companhias aéreas, já não se serve nenhum snack. Os passageiros podem comprar algo para comer ou beber produtos sugeridos pela companhia. É justo. Come quem quer, quem não quer comprar, pode levar farnel que ninguém implica.
Ao que parece, a Sata luta com problemas económicos. Podia ser mais fácil ter uma oferta de produtos regionais para venda a bordo. Mas produtos certificados com a marca Açores, daqueles que efetivamente mostram o que são os Açores.
Mas se queremos continuar a fazer de ricos, temos que mudar o menu. O bolo levedo tem que ser fresco e macio como o conhecemos. Não é fácil, eu sei.
A bordo da Sata veria com bons olhos uma sandes de massa sovada com carne assada á memória das festas do Espírito Santo que são a nossa nota identitária. Acompanhada com laranjada ou kima de maracujá.
Mas quem diz isto, diz muito mais: uma sandes de atum de Santa Catarina em pão caseiro, ananás aos bocadinhos, sei lá. Há um sem fim de possibilidades interessantes.
Era só uma coisinha diferente. E podiam manter a caixinha que é, realmente, linda.
Às vezes, não é preciso grande coisa para fazer a diferença. Para mim, seria como sair outra vez do Ponta Delgada para entrar na Sata.
Vamos aterrar. É sempre bom aterrar. E até fevereiro vai ser sempre bom aterrar uma vez ou outra. Com mais serviço público de qualidade. Com maior preocupação com os detalhes que fazem a diferença.
Gabriela Silva