Passou uma semana das eleições regionais e ainda não são conhecidos os contornos do funcionamento do executivo da AD.
Neste jornal, expressei a minha opinião afirmando que o PS deveria abster-se na apresentação do programa do governo. Essa decisão não significa que os socialistas abdiquem de oposição construtiva. Esse estatuto impede o protagonismo da extrema direita, cuja prática bem conhecemos e tome posições intransigentes visando a supressão de direitos sociais que não se compatibilizam nem com a denominada “Agenda para a Década 2024-2034” nem com o originário ideário social-democrata do PSD.
Bem vistas as propostas dos partidos do arco da governação – PSD e PS –, agora em posições aparentemente extremadas, parece serem mais as semelhanças políticas entre ambos do que as divergências.
Ao longo dos últimos dias, procurei analisar os programas de governo da AD e do PS. Não foi fácil descobrir esses documentos, arredados da campanha eleitoral e “escondidos” nos sites dos respetivos partidos. Sinceramente, não encontrei grandes diferenças programáticas.
Notei, sim, uma “Agenda para a Década”, pouco sistematizada, com propostas avulsas e desenquadradas, mais parecendo a elencagem de projetos de vários gabinetes governamentais, priorizando muitas ações de dimensão local e esquecendo outras também reclamadas e com maior pendor regional.
Cito duas: – Concluir a aquisição de equipamentos de som e iluminação para o Atlântida Cine, para espetáculos de maior qualidade e finalizar o processo de estabelecimento de uma exposição permanente no Museu de Santa Maria.
-Dinamizar a Casa dos Teares e a Casa da Memória, no Corvo.
Em todo a Agenda, por estranho que pareça, não encontro, por exemplo, uma única referência à ampliação da pista do Aeroporto do Pico, nem à construção do novo Centro de Saúde das Lajes do Pico, como foi prometido pelos candidatos da AD. E deviam ter constado, pois elenca-se uma série de obras com as quais o Governo da AD se compromete a executar “de forma imediata (pg 30)”:
“Construir a nova gare marítima do Porto da Graciosa;
-conclusão atempada, da construção do novo Porto das Lajes das Flores.
-implementar as obras de melhoria das condições operacionais, molhe e terrapleno, no Porto das Poças, nas Flores.
-Concluir as obras no molhe de proteção do Porto de Ponta Delgada, em São Miguel, e planeando ainda o seu desenvolvimento futuro no médio e longo prazo.
-Executar a gare marítima do Porto de Pipas, na Terceira.
-Projetar o reordenamento dos portos das Velas e da Calheta, em São Jorge.
-Proceder à requalificação e ordenamento do Porto da Horta, Faial.
-Operacionalizar o ordenamento da Baía do Cais do Pico e a proteção da orla costeira de São Roque do Pico. (Sobre estudos e obras no Porto Comercial da ilha nada é referido.)
-Ampliar o Porto da Praia da Vitória através da construção de um cais multiusos.
-Construir a nova gare marítima do Corvo.
-Investir na proteção e no reforço do Porto de Vila do Porto, em Santa Maria.
-Continuar o apetrechamento das infraestruturas portuárias dos Açores ao nível meios de movimentação horizontal, rebocadores e lancha de pilotos.
-Continuar o processo de proteção da orla costeira em todas as ilhas.
Por fim, a Agenda prioriza também uma série de problemas antigos na ilha de São Miguel e Terceira que as fortes chuvas das última semanas, várias vezes colocaram a nu:
-Melhorar as condições de escoamento da Grota do Contador, Outeiro, Arrifes (São Miguel).
-Reperfilar a Ribeira dos Mosteiros (São Miguel).
-Melhorar as condições de escorrência da Grota do Cadima, Capelas (São Miguel).
-Desenvolver a empreitada de encaminhamento de caudais da Grota do Saramagal para a Grota do Barril, Relva (São Miguel).
-Intervir no encaminhamento dos caudais da nascente do Posto Santo (Terceira). (pg 31)
Caricato é a Agenda considerar de resolução imediata a recuperação da Lancha “Espalamaca”, como se não existissem questões de urgência imediata para as populações nos domínios da saúde, da economia, da demografia, da mobilidade.
No setor dos transportes é de lamentar que a Agenda só admita “voltar a avaliar a possibilidade e viabilidade de alocar navios para a ligação sazonal entre São Miguel e Santa Maria e Terceira e Graciosa. (pg 63)”, impedindo as ligações de passageiros entre São Miguel, Terceira e as restantes parcelas do arquipélago. É uma visão parcelar, bairrista e retrógrada que impede a mobilidade e condena os açorianos de todas as ilhas a não viajarem pelo mar – estrada que une todas as ilhas. Ao arrepio da afirmação expressa na Agenda: “A Região deve ser vista como um todo, mas sem nunca esquecer um compromisso com cada uma das nossas ilhas. A coesão territorial é uma aposta clara. É imperioso tratar todas as ilhas com equidade, promovendo políticas de futuro, mas sem nunca esquecermos as nossas características distintivas. (pg.52)
As minhas opiniões e contributos foram-me sugeridos pelo propósito lançado pela própria “Agenda para a Década”, ao comprometer-se em “Abrir a governação aos cidadãos, dando-lhes a possibilidade de intervir, através das suas posições, ideias e propostas, na definição de projetos, obras, estratégias e produção legislativa.”
Quanto ao PS, o seu Programa de Governo que será a base da sua oposição parlamentar, parece-me mais bem estruturado. Apresenta linhas políticas de atuação nas diversas áreas, sem entrar em ações concretas. Muitas delas são, obviamente, coincidentes com as de outras candidaturas, tão reivindicadas são pelas populações. Veremos como serão negociadas e atendidas pela AD nos seus programas de ação.
Os açorianos, sobretudo os mais afastados dos bens e serviços essenciais, aguardam que as instituições autonómicas voltem a funcionar com a normalidade exigida, ao serviço do bem-comum, da justiça e da equidade.
José Gabriel Ávila*
*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com