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As eleições antecipadas como sinónimo de inconstitucionalidade do sistema de governo das regiões autónomas

Por razões criminais o Primeiro-Ministro (PM) caiu e com ele o governo em nov.2023, e estão marcadas eleições para 10 de março. Por razões orçamentais o Presidente do Governo dos Açores (PGA) caiu e com ele o governo também em novembro, sendo que as eleições decorreram a 4 de fevereiro. E por razões criminais o Presidente do Governo da Madeira (PGM) caiu e com ele o governo em jan.2024, e provavelmente as eleições serão marcadas depois de maio. Destes três acontecimentos – sobressai um ponto essencial: a forma como tudo aconteceu. Isto é: no país os direitos fundamentais são iguais em todo o território nacional, mas o sistema de governo nacional é “semipresidencialista”, porquanto o sistema de governo das duas regiões é aparente “semipresidencialista regional” ou aparente “parlamentarismo regional”; e são aparentes porque estão baseados em quatro órgãos/poderes (tetrarquia) que, em rigor, a quantidade é sinónimo de má qualidade.
A nível nacional o PM pediu a sua demissão; a consequência foi a aceitação e a marcação de eleições antecipadas. A base da motivação do pedido, verbas avultadas e em envelopes no gabinete ao lado do PM, impediam que o Presidente da República (PR) evitasse as eleições antecipadas e mantivesse um governo de maioria absoluta com vários casos criminais. Na base da motivação o PR podia, ele próprio, demitir o PM, ou até dissolver e marcar eleições antecipadas atendendo aos ministros que, entretanto, foram saindo por motivos criminais ou de enorme confusão. Ou seja: o sistema de governo possui estadual uma entidade além e aquém do parlamento e do governo, e eleita por voto direto de todos os portugueses, que tem legitimidade e poder para realizar efetivo controlo político.
A nível regional, nos Açores os acordos de incidência parlamentar deixaram de apoiar a maioria de coligação. O PGA poderia ter pedido, ele próprio, a sua demissão, não o fez; foram os partidos com assento parlamentar que, dirigindo-se ao PR, disseram-lhe que não apoiavam aquela maioria. Ou seja, no modelo nacional o PR poderia demitir por sua iniciativa o governo e dissolver o parlamento; mas no modelo regional o PR não tem poder de demissão e, mesmo no caso de querer dissolver, ainda tem de constatar que não existem condições para formar novo governo. Isto é: não fora a concordância entre a maioria esmagadora dos partidos, incluindo a coligação, no sentido de se realizar eleições antecipadas, o PR apenas teria poder de dissolver se o orçamento regional para 2024 fosse rejeitado por duas vezes e, ainda assim, teria de fazer auscultações. Sendo a democracia portuguesa a mesma nos Açores; tendo os açorianos o mesmo direito aos direitos fundamentais – não faz sentido que os sistemas de governo regionais sejam tão diferentes do nacional. O sistema autonómico não contém ninguém que faça fiscalização política (que não seja apenas na fiscalização das leis com os vetos político e jurídico), logo, essa ausência de fiscalização puramente política é contrária à constitucionalidade das decisões políticas que o sistema nacional possui, mas que os sistemas regionais autonómicos, não possuem. Dito de outro modo: não existindo modelo de fiscalização política nas regiões autónomas, logo, estão as populações insulares bem mais sujeitas à precariedade da democracia.
No caso da Madeira o exemplo é mais gritante. A Assembleia tem uma maioria parlamentar por coligação e acordo parlamentar de um pequeno partido. Pela motivação criminal o PGM não quis pedir a sua demissão; teve de ser o mais pequeno partido parlamentar a impor as suas regras: tem de pedir a sua demissão, tem de se formar novo governo e, mais tarde, se necessário, eleições antecipadas. Perante a decisão de não ter pedido a sua demissão, o sistema não prevê que o PR o demita; e como este apenas poderia convocar eleições dois meses depois (por causa do parlamento ter sido eleito muito recentemente), ficou refém do sistema de governo. Este exemplo é colossal da menoridade do sistema de governo das regiões autónomas.
Ou seja, a teoria da incapacidade e, por conseguinte, a inconstitucionalidade do sistema de governo regional condiz com a prática.
Mas esse problema não foi criado apenas pelo Estado. Foi o Estado que o autorizou através da aprovação das leis dos respetivos Estatutos; mas o texto foi proposto pelas próprias regiões, ou nunca defenderam melhorá-lo. Desde sempre que as regiões autónomas se pautaram por manter e contribuir para que a Região fosse diferente, escudando-se na ideia de insularidade e especificidade; erradamente, porque estes conceitos são para resguardar o poder político regional no sentido da sua capacidade para fazerem leis e projetos inteiramente autonómicos porque específicas (não especiais) face aos nacionais que são diferentes. Uma coisa é o poder autonómico assente na insularidade; outra muito diferente, são os cânones políticos de qualquer democracia. Aliás: a autonomia política exige muito mais atenção face à sua singularidade, especificidade e duplicação de legislação que é, aliás, muitas vezes em sentido pejorativo se comparadas com as nacionais.

Arnaldo Ourique

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