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Azores Airlines desnorteada no Porto… e na Madeira

O resgate milionário do Grupo SATA pelos contribuintes foi justificado pela garantia teórica e politicamente imposta de que a conetividade das ilhas dos Açores entre si e com o mundo depende desse Grupo. De facto, as opções estratégicas de política pública em matéria de transporte aéreo ao longo de décadas tem esse resultado desnecessário.
Aceitando a realidade que temos, é muito díficil enquadrar a decisão tomada pela Azores Airlines de lançar voos diretos sem escala entre o Porto e os destinos de Boston, Toronto e Nova Iorque, como mesmo conceito aplicado à Madeira também – são voos semanais, sazonais e operados em horários pouco comerciais que irão exigir autênticos “saldos” tarifários para terem passageiros.
Estes novos voos diretos não passarão pelos Açores e estava previsto serem operados pelos Airbus A321LR da Azores Airlines de 180 lugares, utilizando tripulações fora das bases e, por isso, com custos mais elevados e com a respetiva perda de produtividade. O plano inicial era mesmo esse: um dos poucos aviões da pequena frota da Azores Airlines estaria inteiramente dedicado a rotas que não tinham qualquer ligação aos Açores.
Enquanto isso, as operações sazonais da ilha Terceira para esses mesmos destinos norte-americanos serão operados por um avião espanhol alugado. Se este plano original já era ilógico e arriscado de um ponto de vista comercial e operacional, o que impressiona é ter passado pelo crivo de uma análise de risco financeiro minimamente racional. Mas…o que dizer agora que o plano inicial piorou ainda mais? Para honrar os tais voos diretos do Porto e da Madeira, a Azores Airlines anunciou que, afinal, terá de alugar um Boeing 767-300 e a respetiva tripulação. Com ou sem passageiros nestes voos, com ou sem rentabilidade tarifária, a Azores Airlines acrescentou com isso mais um custo fixo que rondará, pelo menos, os dois milhões de euros. Como se isso não bastasse, este avião alugado obriga as equipas comerciais a venderem mais quase 100 lugares por voo e o consumo de fuel é superior em, pelo menos, mais 30%.
Na prática, todos os pressupostos financeiros, comerciais e operacionais iniciais destas rotas sofreram uma enorme mudança…para pior. Neste contexto, será que o aluguer deste avião era a única solução à disposição da Azores Airlines ou haveria outras capazes de proteger melhor o interesse público e o dos acionistas-contribuintes? Em linguagem bolsista e numa análise que nos remete para os investimentos em mercados de alto risco, como start-ups e criptomoedas, este é o paralelismo apropriado que aqui posso traçar em matéria de oportunidade, legitimidade e responsabilidade desta decisão da Azores Airlines. É sabido que naquele tipo de investimento se pode ganhar muito…ou perder tudo.
Estes voos nunca configurarão o primeiro caso, mas poderão facilmente resvalar para grandes prejuízos – financeiros e de imagem. Estando em causa a decisão de uma empresa pública que recebeu ajudas estatais milionárias e que tem um processo de privatização suspenso, quem assume o risco deste voos, destas decisões e com que propósito?
Os voos diretos do Porto e da Madeira para os EUA e Canadá assumidos nestes termos pela Azores Airlines não são essenciais à missão da empresa: não oferecem nenhuma vantagem em termos de mobilidade, de turismo, de emprego ou da diáspora.
Esta operação de aluguer de avião e de tripulação por um período curto em temporada alta – que estimo rondar os 2 milhões de euros – levanta sérias dúvidas quanto à sustentabilidade e rentabilidade destas operações. Para além disso, considerando que a Azores Airlines já foi publicamente declarada como responsável por 90% dos prejuízos do Grupo SATA, não deveria haver aqui um maior escrutínio? A distinção entre empresas privadas e empresas estatais é fundamental quando se trata de assumir riscos e tomar decisões estratégicas.
Na minha visão, enquanto que as empresas privadas têm de explicar aos seus acionistas os riscos que correm com determinadas decisões e enquanto essas empresas são submetidas a um enorme escrutínio – inclusivamente bolsista se for o caso – nas empresas estatais existe, em teoria, uma responsabilidade acrescida para com os cidadãos e para com a economia pública como um todo.
Quando essas empresas públicas tomam decisões arriscadas e quando agravam o índice do risco como é agora o caso da Azores Airlines, onde fica a responsabilidade política do Estado e da tutela? Quem assume o papel do acionista privado preocupado com o rumo, com o risco e com as decisões estratégicas tomadas e o seu impacto financeiro? Ou será que nas empresas públicas essa responsabilidade apenas se exerce em inquirições “post mortem” como a comissão parlamentar regional sobre o “cachalote”? Como podemos garantir uma proteção do interesse público no caso de empresas estatais que seja tão eficaz quanto a proteção do interesse acionista omnipresente e profissional nas empresas privadas?
A ambas preside uma ação responsável e transparente, mas no caso de empresas públicas o prejuízo é, em último caso, assumido pelos contribuintes. Pode correr tudo bem, é verdade… mas, e se não for o caso? Quem e como explicará isso ao contribuinte?

Pedro Castro*

*Consultor em Aviação Comercial e Turismo

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