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Politicamente (in)Correto

É sexta-feira, 5 de abril. Aterrei há seis horas em Kigali, a capital do Ruanda.
Ninguém diria, passando por estas ruas bem tratadas, rodeadas de árvores frondosas, cruzando-me com gente humilde mas sempre sorridente, que há trinta anos aqui se mostrou a humanidade no seu pior, culminando uma guerra civil de quatro anos com o genocídio de 250 mil pessoas.
A rivalidade quase inexplicável entre Hutus (os mais humildes, quase oitenta por cento da população ruandesa, tendo muitos deles origem nos vizinhos Burundi e Uganda) e Tutsis (uma espécie de elite política e decisora, potenciada pela posição então dominante da Bélgica neste território do centro-leste de África), mostrou ao Mundo que o ser humano é ainda capaz do pior, desde que reunidas condições de vingança, de incompreensão e de incapacidade de perceção das necessidades e do posicionamento do outro.
O conflito armado e o consequente genocídio do Ruanda piorou ainda mais as condições de vida na generalidade das cidades do país. O esforço dos últimos trinta anos para reconstruir a sua pátria é digno de uma vénia. Este pequeno país, cuja lateralidade é assegurada pelo Quénia (a leste), pelo Uganda (a norte) e pelo Burundi (a sul), sendo mesmo Bujumbura mais próxima de Kigali, desdobra-se em esforços para requalificar estradas, dotar as cidades de cuidados essenciais de saúde, com hospitais de qualidade, melhorar infraestruturas que têm também uma componente essencial de imagem do país para o mundo. Hotéis e aeroportos começam a ganhar forma e a tornar-se “hubs” importantes em termos regionais, num continente africano em qua a mobilidade é, historicamente, um dos problemas mais complexos de tratar e a mentalidade pouco consistente e estratégica são, por norma, os grandes obstáculos à evolução.
Mas o Ruanda, para que este pequeno-grande milagre dos últimos trinta anos se verificasse (afinal, o genocídio terminou apenas em julho de 1994), teve de estabilizar a sua estrutura política e constitucional. Independente da Bélgica desde 1962, protagonizou a maior história de evolução do continente africano, com um modelo de desenvolvimento exemplar. O salário médio triplicou nos últimos dez anos (embora com valores muito baixos para os europeus, conseguiu ultrapassar claramente a média africana), e o país é um “role model” a nível internacional, funcionando como placa giratória de importantes marcas e atraindo a atenção dos CEO’s de muitas multinacionais, que aqui vêem a possibilidade de crescer a nível continental e de, a partir de Kigali, projetarem as suas empresas.
Um país que, há 16 anos, elegeu na sua legislatura nacional uma maioria de mulheres e que teve em Kigali a primeira cidade africana a ser reconhecida com o “Habitat Scroll of Honor Award” (o reconhecimento da sua “limpeza, segurança e conservação no modelo urbano”, merece ser visto como um “case study”. Na evolução dos parâmetros sociais, na estabilidade do modelo político e na visão que o projeta como caso único em África e muito raro no planeta.
Tão diferente de países e regiões bem mais próximas de Portugal, cujo alarmismo social, a instabilidade, a incoerência das opções públicas e a falta de rasgo e visão dos responsáveis políticos são, as mais das vezes, os grandes entraves aos índices de desenvolvimento.
Uma última nota, à distância, para a notícia que tive mal aterrei em Kigali: a nomeação de Pedro Dias para Secretário de Estado do Desporto. Uma grande notícia, feita de competência e vontade de progresso. O Pedro é uma referência no dirigismo desportivo em Portugal, pode emprestar ao novo governo de Montenegro uma visão estratégica única, e está no lugar certo para ajudar o país.
A coragem ou a capacidade que outros governantes não têm demonstrado em nomeações ou falta delas, revela-a o novo primeiro-ministro com o convite a Pedro Dias.
O futuro e a História registarão as mais-valias.

Rui Almeida*

*Jornalista

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