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Aprovação de programa de governo e o Direito Constitucional Autonómico

Num texto “A aprovação do programa do XIV governo regional” (publicado no Diário dos Açores a 21 de março e no dia seguinte no Correio dos Açores), focamos a nossa atenção às regras de aprovação do programa dos governos regionais. Voltamos a este assunto para o esclarecimento da cidadania.
Quatro palavras prévias. 1.ª palavra prévia: temos de admitir que os especialistas de Direito Constitucional e Ciência Política estão sujeitos à máxima social de que em todas as profissões, embora possam constituir-se como especialistas, podem estar ao serviço de interesses, sejam partidários, sejam profissionais. É expetável, por exemplo, que quem colabora com uma região autónoma produza pareceres favoráveis a essa região; assim como quem defenda posição favorável a quem lhe possa servir num futuro próximo. Isso, aliás, não é matematicamente considerado como aquele que recebe de pareceres favoráveis, mesmo que muito erróneos para manter o status quo, sobretudo quando é financeiro; pois, como é consabido, por regra o direito pode permitir duas ou mais perspetivas, às vezes até antagónicas entre si. Conheço, aliás, um parecer que o seu autor pugnava por uma interpretação corretiva da lei – o que em si mesmo é contra, não só no âmbito da hermenêutica jurídica, como é manifestamente inconstitucional porque o Estado e todas as entidades públicas e privadas têm de obedecer à constitucionalidade das leis e ao princípio da legalidade.
2.ª palavra prévia: a Constituição possui dois tipos de normas: as regras gerais de toda a panóplia de assuntos e as regras políticas. Enquanto as primeiras são promessas e garantias e por isso exigem interpretações cuidadas e muito desenvolvidas; as políticas são mais diretas. As regras políticas, aquelas por que se regem as entidades políticas, estão plasmadas tendencialmente com rigor; aliás, uma Constituição é democrática exatamente porque as regras governativas essenciais estão plasmadas e sem reservas na Lei Fundamental. Caso contrário, através da mera interpretação, que é sempre admissível e nos termos anteditos, os governos fariam as interpretações à sua vontade.
3.ª palavra prévia: as regras estruturais do poder político estão diretamente na Constituição, como o escopo do sistema de governo, as atribuições de cada um e as suas formas de decisão,a tipologia dos atose publicitação; em muitas matérias, se não estão, estão os princípios como é o caso das leis eleitorais, orçamentais e muitas outras; e outras ainda que não constando exaustivamente de modo direto, ditam regras que são depois desenvolvidas pelas leis, como os regimentos parlamentares.
4.ª palavra prévia: a aprovação do programa do governo não é apenas um emblema político; ela tem uma função essencial: entre o programa eleitoral e o programa de governo pode haver diferenças de tal ordem que o parlamento tem de o sujeitar à legitimidade direta do diálogo parlamentar. Longe vão os dias em que quem ganhava as eleições tinha, de modo automático, a concordância de todo o parlamento para a formação de governo, para a aprovação do seu programa e até do orçamento. Hoje, com o evoluir do sistema partidário e social, isso já não é verificável. E ainda bem. Temos de continuar a relembrar o que os antigos defendiam, como Aristóteles: não podemos facilitar a vida a quem nos governa, sob pena de contribuirmos para o engodo e a corrupção.
Com estes dados, pois, percebe-se com facilidade o que se dirá agora: enquanto o sistema de governo nacional está quase inteiramente na Constituição, porquanto apenas alguns pormenores estarão em leis como o orçamento de Estado e o Regimento da Assembleia da República; já no sistema de governo da região autónoma, para além da Constituição, aplica-se o Estatuto Político, e depois ainda, como no caso nacional, as leis dos orçamentos regionais e os regimentos parlamentares das assembleias legislativas.O sistema de governo regional é em tudo diferente do nacional, mas não quanto à aprovação do programa de governoque em que tudo é igual no essencial, conforme quadro 1 infra sobre asnormas de aprovação dos programas de governo, e quadro 2 infra sobre as formas de provação dos programas de governo:

Quadro 1: Normas de aprovação dos programas de governo
Sistema de governo, normas de aprovação dos programas de governo
Nacional Regional autonómico
Artigos 156.º, alínea g), 163.º, alíneas d) e e), 166.º, n.º 4, 180.º, n.º 2, alíneas h) e i), 188.º, 192.º, 193.º a 195.º da Constituição, e sobretudo os artigos 163.º, 166.º e 192.º.

Artigos 214.º a 223.º do Regimento Parlamentar, especialmente artigo 217.º.
A Constituição não prevê regras sobre aprovação do programa de governo regional.

Artigos 34.º, alíneas a), f) e g), 44.º, n.º 4, 47.º, n.º 5, alíneas a), b) e c) e 86.º, n.º 1, alíneas d), e) e f) do Estatuto Político dos Açores, sobretudo os artigos 34.º, alínea a) e 47.º, n.º 5, alínea a).

Artigos 94.º, 95.º, 99.º e 162.ºdo Regimento Parlamentar dos Açores, em especial os artigos99.º, n.º 2 e 162.º, n.º 5.

Quadro 2: Forma de aprovação dos programas de governo
Sistema de governo, forma de aprovação dos programas de governo
Nacional Regional autonómico
O programa de governo é aprovado, na forma de moção (porque é um ato político e não um ato normativo), desde que não exista uma maioria absoluta dos deputados em efetividade de funções de votos contra.
Não confundir o poder de se propor, durante entre o debate e a aprovação, uma moção de censura ou um voto de confiança; são moções diferentes. A tipologia do ato de aprovação e moções de censura e de confiança designam-se, nos termos do artigo 166.º, n.º 4 da Constituição, “moções”
Igual ao nacional, mas pelo Estatuto, não pela Constituição. Nos Açores o empate na segunda votação equivale a rejeição, artigo 99.º, n.º 2 do Regimento Parlamentar.

Igual ao nacional, mas pelo Estatuto, artigo 44.º, n.º 4.

Nota: na Madeira é o mesmo processo, conforme artigos 36.º, n.º, alínea a, 41.º, n.º 2, 47.º, alínea a) e 57.º do Estatuto Político, e artigo 191.º e ss. do seu Regimento Parlamentar, mas não tem paralelo como o artigo 44.º, n.º 4 do Estatuto.

Arnaldo Ourique

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