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O Correio de ontem e de hoje

“A situação da imprensa local e regional é muito afetada com esses atrasos e muitos assinantes residentes em países estrangeiros não se conformam com longas demoras.”

Às sete da manhã, o vapor “Lima” lançava o ferro no “limpo” da baía das Lajes em mais uma viagem quinzenal, alternando com o “Carvalho Araújo que fazia a rota do norte pelo Cais do Pico.
À espera do velho navio de passageiros e de carga aguardavam na lancha “Hermínia”: o Delegado Marítimo, o Cabo-de-mar, um Polícia, um Guarda-fiscal, o Agente da “Insulana”, o funcionário da Alfândega e o Carteiro.
Aberto o portaló e colocada a escada, todos subiam, rapidamente, para as habituais diligências burocráticas, receber os manifestos da carga e passageiros e iniciar o serviço.
O Correio era carga prioritária. As malas da correspondência, após conferência pelo Carteiro, eram descarregadas para a lancha, através do portaló. As sacas de encomendas enviadas da América pelos filhos da terra emigrados, transportadas nos porões, seguiam mais tarde para terra.
Acompanhei, ainda em criança, este movimento, a pedido do meu avô – carteiro de reconhecida honestidade e competência.
Tio Chico, como era conhecido, ou Francisco Tesoureiro (antigo sacristão), não descansava enquanto não abria a mala da correspondência.
À espera de “Diários da República”e de outra correspondência oficial estavam funcionários públicos, pois a legislação onde constavam transferências de pessoal e concursos só tinha efeitos jurídicos após a sua chegada às repartições públicas.
Esse foi o tempo em que os telefones eram acionados por manivela. Para fazer uma chamada local os poucos assinantes tinham de contatar a estação telefónica mais próxima e pedir ligação ao número pretendido. Se fosse para o exterior o contato demorava horas e horas a ser estabelecido, pelo que se aguardava, normalmente pelo horário noturno.
Daí a atenção que se dava à correspondência e à distribuição da imprensa continental que, mesmo atrasada, pesava muito no saco do carteiro, aquando da distribuição a pé.
Outros tempos, sem paralelo nos atuais processos de distribuição dos CTT.
Ou talvez não…

                *  *  *

No passado dia 29 de maio recebi a última edição do jornal O DEVER, das Lajes do Pico, datado de 23 de maio. No dia anterior recebera o jornal ILHA MAIOR, editado na mesma data. Seis dias depois. Muito tempo na era das ligações eletrónicas e das comunicações, apesar de existirem pelo menos dois voos de ligação diários entre o Pico e Ponta Delgada.
Segundo fui informado, não residem no movimento aéreo as dificuldades de transporte da carga dos CTT, mas no lento processo de recolha da “mala” das diversas estações até chegar à estação da Madalena de onde é expedida.
Há correspondência que chega a estar retida durante um fim de semana numa estação, à espera que seja recolhida na segunda-feira para seguir seu destino.
O que se ouve, habitualmente, são desculpas assacadas à transportadora aérea.
A verdade, porém, é que o serviço público consignado à empresa privada dos CTT não trouxe benefícios, sobretudo às populações mais afastadas dos centros urbanos. Bem pelo contrário, como em tempos reclamaram entidades públicas.
Sendo certo que a correspondência física teve um enorme decréscimo desde o início da era digital, existem, porém, impedimentos de vária ordem que obrigam cidadãos mais idosos, a utilizar a emissão e receção de documentos oficiais, através dos CTT. Foi essa, aliás, uma das razões que levaram aquela empresa a criar um banco destinado a receber poupanças de pensionistas e de outros clientes.
Sucede, porém, que o serviço público de recolha e distribuição da correspondência é cada vez menos fiscalizado e defendido pelos organismos locais e regionais. Estas instituições deveriam, a todo o custo, pugnar pela defesa desse direito das populações, até porque as instituições públicas e privadas que não têm outra forma de fazer chegar “a carta a garcia”.
A situação da imprensa local e regional é muito afetada com esses atrasos e muitos assinantes residentes em países estrangeiros não se conformam com longas demoras. Estas, certamente, só lhes farão lembrar as décadas de 50 e de 60, quando uma carta da América demorava uma eternidade até chegar com um contrato de trabalho, indispensável para iniciar no consulado de Ponta Delgada o processo de emigração com destino aos Estados Unidos.
A rapidez de processos que a informática introduziu nas relações comerciais e familiares não se compadece, hoje, com a lentidão de séculos passados, quando o carteiro se servia do cavalo para distribuir o correio, fazendo-se anunciar às pacatas populações através do estridente e simbólico clarim.
Desses tempos recuados e das viagens do “Lima”, vale a memória apenas para relevar a eficácia com que os carteiros de então distribuíam o almejado correio o qual, de uma forma ou de outra, condicionava as suas vidas.

José Gabriel Ávila*

*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com

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