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Qual o valor do Estatuto dos Açores?

O Estatuto Político dos Açores vale muito, nomeadamente do ponto de vista constitucional, político, histórico e técnico.
Tem um valor supremo que é ditado pela Constituição: o Estado é unitário regional e por isso possui regiões autónomas dotadas de estatutos políticos.
Tem um valor político superior porque é através do Estatuto que a região autónoma se concretiza. Assim o atesta a Constituição: são esses estatutos aprovados pela Assembleia da República e através de um processo e uma hierarquia legal especiais face a todas as leis dos Estado à exceção da Constituição. E assim se concretiza nele próprio: o Estatuto prevê todas as normas políticas necessárias ao funcionamento da região autónoma, nomeadamente sobre os seus símbolos, os diversos níveis de autonomia, financeira, tributária, patrimonial, administrativa, órgãos legislativo, governativo e administrativo, matérias de capacidade criativa de leis de origem autonómica, e milhentos outros assuntos igualmente importantes.
Tem um valor histórico relevante: é a própria Constituição que justificando a criação da autonomia política numa maior e melhor participação política dos seus cidadãos insulares, determina que se baseia nas históricas aspirações autonomistas das populações insulares.
E tem um valor técnico importante: se a Constituição não previsse a existência da autonomia política e da própria região autónoma, de nada servira o Estatuto; mas prevendo, como o prevê isso em si mesmo já é uma enorme revolução constitucional, se não existisse esse Estatuto era essa autonomia impraticável, quer a autonomia política, quer sobretudo a região autónoma. Por isso mesmo, enquanto se preparava o texto constitucional em 1975, também se preparou os estatutos político-administrativos das regiões autónomas que se intitulavam de estatutos provisórios por isso mesmo: com a Constituição teria efeitos a partir de 25 de abril de 1976 foi necessário que, imediatamente, entrasse em vigor o respetivo estatuto político, como aconteceu no dia 30, caso contrário dar-se-ia um vazio político com consequências negativas, desde logo nas primeiras eleições regionais e subsequentemente na implementação dos órgãos autonómicos. A Constituição institui que o decreto legislativo regional da região autónoma tem a mesma dignidade que a lei da Assembleia da República e do decreto-lei do Governo da República; e prevê aliás igual sistema de controlo da constitucionalidade dos atos normativos (idêntico é o termo mais correto por via de várias diferenças; mas, no essencial, é efetivamente igual.
Com a Constituição, se faltar os estatutos políticos das regiões autónomas, fica incompleto o próprio Estado: ele é um Estado unitário regional e se não estiver concretizado existiria uma omissão constitucional muito grave e com consequências imprevisíveis.
Perante estes valores – inquestionáveis embora subjetivos na sua dimensão – temos de concluir que na ordem jurídica portuguesa o Estatuto dos Açores, e o da Madeira, são leis fundamentais e, como tais, têm de ser respeitadas pelas instituições sob pena de seguirmos a legalidade de forma errada e sobretudo parcial. Razão para a existência da obra “Leis Fundamentais de Portugal” que contém precisamente a Constituição e os dois Estatutos Políticos.
O Instituto Nacional – Casa da Moeda, INCM, possui há cerca de década e meia, no Diário da República Eletrónico, uma secção intitulada de Legislação Consolidada, a qual foi sendo paulatinamente aumentada no seu número de documentos legais do país: aqui encontram-se, efetivamente, as leis mais importantes do país, a Constituição Portuguesa, o Código Civil, o Código Penal, o Código do Trabalho e muitos outros, incluindo Registo Civil, Expropriações, Direitos de Autor, Propriedade Intelectual, Sociedades Comerciais, Procedimento Administrativo e Contratação Pública.
Seria de esperar que o INCM tivesse a grandeza de espírito democrático e ali também inserisse o Estatuto Político da Região Autónoma. Mas não tem e, por isso mesmo, nunca o quis fazer. Já se lhes sublinhou essa necessidade; mas sendo um instituto nem se dignam responder. Esse tipo de comportamento é uma regra geral no país para os institutos com personalidade jurídica de independência técnica, o que os leva a considerarem-se superiores às outras instituições democráticas, quando, em rigor, continuam sendo órgãos do Estado e, como tais, têm de obedecer à universalidade da cidadania. Não tem sentido que o Diário da República Eletrónico, isto é, o documento oficial do Estado e onde se publicam todas as leis portuguesas, incluindo as das regiões autónomas, não coloque naquele acervo distintivo as duas leis da Assembleia da República com o Estatuto Político dos Açores e o Estatuto Político da Madeira. Não é apenas uma questão de modernidade informativa; também é uma questão de respeito do Estado e pelo Estado.

Arnaldo Ourique

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