Ainda há na nossa Região quem acredite em milagres, sobretudo entre a classe política.
Quando aqui escrevo, há alguns anos, que estamos a ir num caminho errado, que construímos diariamente uma galáxia administrativa que emperra a região, que não teremos população suficiente nas próximas décadas para impor um bom ritmo de desenvolvimento e que o turismo é que nos vai salvando, aparecem logo os “milagreiros” do costume a dizer o contrário.
Isto não é ser pessimista, é ler a realidade e saber perspectivar o que aí vem, com base nos dados a que o comum dos cidadãos não tem fácil acesso, porque nesta região tudo é difícil de aceder oficialmente.
A prova de que não estamos bem e o caminho que trilhamos é de resultados medíocres, vem, agora, plasmada nos dados espalhados pelo Plano e Orçamento para 2025.
Quem se der ao trabalho minucioso de analisar o que lá está, facilmente conclui que a evolução do perfil produtivo da Região, ao longo dos últimos 10 anos, demonstra uma clara trajectória de especialização em actividades do turismo, sector responsável por 14% do VAB regional total, tendo quase triplicado o seu valor na última década (+174% entre 2011 e 2022).
É o próprio governo a reconhecer que o turismo já ultrapassou o peso do sector primário, tradicionalmente o mais rico da região.
O comércio vai surpreendendo, liderando com 24% do total do VAB em 2022, mas com o turismo a assumir uma preponderância ainda mais significativa, uma vez que representa 15,4% do pessoal ao serviço nos estabelecimentos em 2022 (mais 6 p.p. do que em 2011).
O sector primário já passou para o terceiro maior empregador da Região (12,0%), e há ainda a destacar a forte queda do sector da construção, que, em 2022, representava 10,1% do emprego, a par com o peso das indústrias transformadoras e serviços administrativos e de suporte (9,2% e 10,2%, respectivamente).
Com uma indústria fraca, um sector de serviços superdimensionado, uma população a envelhecer e com baixos níveis de qualificação, torna-se mais difícil alavancar a economia e o desenvolvimento dos Açores.
É o próprio governo a reconhecer, ainda no Plano e Orçamento para 2025, que “as dificuldades estruturais da Região no que respeita à internacionalização do seu tecido produtivo persistem, sendo possível observar pela sua reduzida intensidade exportadora em comparação com outras regiões portuguesas (só comparável com a realidade algarvia) e pela forte resistência à subida deste indicador ao longo da última década”.
Uma região que não cria riqueza, que importa quase tudo e exporta quase nada, está condenada ao fracasso.
É verdade que temos margem para crescer, mas é preciso criar políticas públicas robustas e reformas estruturais para dar a volta.
Aliado a isso, como também é reconhecido, “os baixos níveis de qualificação da população ativa ajudam, por um lado, a explicar as dificuldades persistentes de geração da riqueza da Região, uma vez que a percentagem da população ativa com o ensino superior completo é a mais baixa entre as regiões portuguesas (19,5% em 2023)”.
Para ajudar à festa, temos a conjuntura internacional e nacional, que influencia sobremaneira a nossa economia.
Segundo perspectiva o Governo dos Açores, “tem-se evidenciado uma desaceleração do ritmo de recuperação da economia europeia, com alguns Estados membros a enfrentar uma recessão. Em Portugal, observa-se um risco de contração do consumo privado que poderá pressionar negativamente a evolução económica da Região”.
Perante este cenário só nos resta mais uma oportunidade, que é “a execução dos 18 investimentos do Plano de Recuperação e Resiliência a realizar na Região Autónoma dos Açores, aos quais está associado um envelope financeiro superior a 725 milhões de euros”.
Se o PRR falhar e se a execução do Plano Operacional 2030 der para o torto, então desistem mesmo de acreditar em milagres.
Acho que vai ser mais fácil ver um porco andar de bicicleta do que ver os Açores, nos próximos anos, com um desenvolvimento pujante.
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BAGACINA AOS MOLHOS – Em qualquer país civilizado a situação na cadeia de Ponta Delgada seria um escândalo. No nosso, é uma situação normal.
Se até há quem fuja das prisões do país com uma escada, não se pode estranhar que a política de segurança e de justiça em Portugal seja coisa boa.
Depois dos governos anteriores, de António Costa, nos terem entretido com aquela história vergonhosa da bagacina nos terrenos para construção da nova cadeia, vem agora o actual governo dizer que o arranque da construção só lá para… 2027!
Ou seja, mais dois anos e uns pozinhos a marcar passo, só para dar início à obra. Imagine-se a sua conclusão…
Ainda acredita em milagres?!
Osvaldo Cabral
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