Andei a adiar este escrito muito tempo. Tempo demais diria até. Primeiro, porque não me assiste talento para a escrita, o que faz com que me veja obrigado a ligar ao amigo do costume, a pedir o favor do costume: “Podes dar-me uma vista de olhos num texto que escrevi?”; depois, porque já não é a primeira, nem a segunda, nem mesmo a terceira vez que alguém explana o assunto nas páginas dos jornais que leio, e, parece-me a mim, continua tudo exatamente igual, senão mesmo pior.
Aqui há dias, estava eu sentado a ver um bom filme com a família, e um estrondo absurdo tomou todos de assalto. Bastou um olhar pela janela para nos darmos conta de mais um acidente, com dois carros envolvidos e estragos avultados quer nas viaturas (duas), como em uma das condutoras, que não obstante ter saído pelo seu pé, bem tratada não ficou. O local da ocorrência começa já a ser um clássico dos acidentes: a Rua Maria Luísa Teixeira, uma zona residencial, com crianças e seniores em abundância, onde de um Supermercado que há no seu início ao final do percurso, quiçá 300 (?) metros à frente, os automobilistas adoram ir dos 0 aos 100. Acontece que finda a rua Maria Luísa Teixeira, a demarcá-la da Rua Melvin Jones, há uma perpendicular que tanto vê passar viaturas que escoam pela Rua Timor Loro Sae, como pela Rua Nova da Levada, ao lado. Esta receita, aliada à inconsciência dos que por ali passam a altas velocidades, já resultou em vários acidentes graves, e só ainda não em vítimas mortais -usando as palavras de um Senhor que lá ocorreu pós-sinistro- “por obra e graça do Divino Espírito Santo”. Pior que isso, nesse dia específico, foi uma roda de um dos carros ter sido projetada com violência para o jardim da casa de um morador (saltando mesmo o portão!), que passou a ser devedor do milagre de, naquele momento, não estar ninguém no pátio, ou no passeio, porque teria sido fatalmente atingido. Foi neste dia que começou o meu inconformismo de cidadão anónimo a remoer.
O cenário da Fajã de Cima é desolador: todos os dias, a todas as horas, a sensação de viver ao lado de um autódromo de F1 é real. Os roncos dos carros e das motas a altas velocidades são um escárnio à segurança no espaço público, um autêntico bullying exercido sobre quem tem amor à vida e respeito pelo bem comum.
Ali ao lado, a reta da Avenida Cecília Meireles, outro convite à tragédia. Para baixo e para cima, faça chuva ou faça sol, está mais para troço de carros de corrida que para rua onde diariamente famílias inteiras se deslocam nos dois sentidos. Uma rua familiar, transformada em roleta russa às mãos da delinquência.
Um pouco mais acima, a Rua Infante Dom Henrique, onde mora o meu sobrinho com os seus dois filhos, e o cenário se repete. Andam tão depressa, diz-me ele, que a própria mãe, angustiada pelo perigo, acende uma vela sempre que sai da casa dela com destino à sua.
Mas a tendência não muda nos arredores: todas as vias circundantes ao Parque Urbano, onde todos os dias acorrem dezenas de pedestres para os seus passeios diários, são fustigadas por condutores desrespeitosos da vida: da sua e da dos outros. Velocidades absurdas, infrações gritantes e total desprezo pelos índices mínimos de civilidade. Para piorar, as passadeiras insistentemente riscadas em cima das curvas, como que a chamar o pior dos cenários.
Como referi no início, já por várias vezes li nos nossos jornais apontamentos de cidadãos preocupados com o fenómeno da segurança rodoviária. Quantos mais acidentes/mortes para que sejam tomadas medidas sérias e irredutíveis contra quem não demonstra capacidade para viver em COMUNIDADE? E, da parte dos políticos e autoridades, quando é que irão aos sítios ver com os seus próprios olhos os sinais de alerta?
Uma noite com alguns agentes nos sítios certos seria quanto baste para começar a “varrer” das estradas pessoas que, claramente, não têm capacidade para circular na via pública. Os carros/motas/transportes, servem para nos deslocarmos do ponto A para o ponto B em segurança. Tudo o que contradiga esta evidência deve ser severamente combatido/punido.
Dirijo-me ao Presidente Bolieiro, aos Deputados, ao Presidente Nascimento Cabral, a todos os Presidentes de Câmara e de Junta da região-porque é um fenómeno transversal-, e, permitam-me o “egoísmo”, em particular, ao Presidente da Junta de Freguesia da Fajã de Cima, Nuno Almeida, e de São Pedro, José Manuel Leal, que têm a obrigação de exigir lombas, rotundas, retificação do local das passadeiras, enfim, todo um conjunto de medidas que nos permitam ficar a salvo dos “predadores” das estradas.
Dirijo-me à PSP, à PJ, à GNR, enfim, a todas as forças de segurança que têm em mãos a responsabilidade (mal remunerada, admito, e pouco reconhecida!) de zelar pela vida dos cidadãos e pela execução correta do código da estrada.
Dirijo-me aos Órgãos de Comunicação Social e aos seus Diretores, que têm a missão de repercutir os medos e inseguranças das comunidades: que não se calem e se debrucem sobre esta problemática, só aflorada ou tomada a peito quando a estrada nos ceifa alguém que amamos.
É uma masturbação de perigosidade que tem de acabar, porque chega de chorar vítimas inocentes e lamentar famílias dilaceradas pela desumanidade alheia. São os nossos pais, avós, irmãos, netos, amigos, primos, tios, enfim, concidadãos, que estão em risco de vida permanente. Não são outros.
Aqui há uns anos grandes, a RTP passava muitas vezes, nos intervalos dos programas e dos jogos de futebol, uma canção que falava exatamente de segurança rodoviária, “Somos todos iguais”, dos Ministars (disponível no Youtube). O refrão, simples, diz o seguinte: “Todos somos iguais, de vez em quando, somos peões deste xadrez, e só vivemos uma vez!”.
Sejamos sérios: é hora de agarrar o touro pelos cornos!
Por João Mendes