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Uma Autonomia Fragilizada

O regime autonómico de governação dos Açores e da Madeira é uma opção nacional para atender a especificidades regionais e assegurar a devida intervenção pública no processo de desenvolvimento convergente de todo o território nacional.
Este regime, portanto, é tanto responsabilidade dos governos e assembleias regionais como dos governos e assembleias nacionais. Os seus sucessos ou insucessos têm de ser imputados às partes na devida dimensão das suas responsabilidades em promover o progresso regional.
O regime autonómico fica fragilizado quando os objetivos de intervenção pública falham. Os grandes objetivos da convergência para indicadores nacionais e europeus têm falhado, conforme se confirma com indicadores na geração de riqueza, na educação, nos pagamentos em atraso, na pobreza e mesmo na saúde, onde uma esperança média de vida mais curta não pode ser dissociada de uma qualidade e acessibilidade mais reduzidas aos serviços de saúde.
Um regime autonómico fragiliza-se quando não produz os resultados esperados.
Uma parte das falhas está do lado da República, outra parte está do lado da Região.
A República é responsável pela adequação do modelo e da sua parametrização, como acontece, por exemplo, com a LFRA, uma lei nacional que fixa os parâmetros para o financiamento das despesas públicas sob gestão da Região. Esta lei, que implicou uma melhoria face à incerteza orçamental que existia antes da sua publicação, revela-se, no entanto, inadequada porquanto tem gerado sucessivos desacertos das finanças públicas regionais por estas não conseguirem acompanhar padrões nacionais de prestação de serviços públicos sem o recurso ao endividamento explícito ou encapotado. O problema tem-se repetido nas sucessivas versões da lei porque a lei não tem mecanismos que assegurem financiamento adequado de obrigações públicas carecendo de revisões frequentes, invariavelmente secundarizadas face a interesses políticos conjunturais. A última revisão é de 2013, já lá vão 12 anos. Neste tempo todo, os políticos ainda não encontraram um momento oportuno para corrigir o que é urgente corrigir.
Acresce a esta questão o abandono a que os governos centrais têm relegado o funcionamento de serviços não regionalizados, como se esse espaço não fosse da sua responsabilidade.
Neste sentido, o modelo tem falhado porque uma parte não cumpre cabalmente a sua função, invariavelmente por razões político-partidárias, com o tacticismo partidário a sobrepor-se ao real interesse público.
Se há responsabilidades a assacar à república, também as há a assacar às opções e à gestão regional.
A Região, através dos seus governos, não está isenta de responsabilidade no desfecho dos indicadores de desenvolvimento porque geriu muitas vezes mal, o interesse público. O desempenho tem sido demasiadas vezes, no mínimo, medíocre em políticas de transporte aéreo e marítimo, em políticas de saúde em políticas de construção de infraestruturas e em políticas para o setor empresarial da Região.
Para além da responsabilidade direta da Região, a colocação dos assuntos junto da república tem sido também ora ausente, ora escassa, ora ineficaz. Veja-se a título de exemplo o tempo que tem demorado a intervenção na recuperação dos estragos do Furacão Lorenzo, a construção da nova cadeia de S. Miguel a revisão da LFRA ou mesmo a recuperação de serviços centrais do Estado nos Açores.
Resulta daí o estádio atual, estrutural, em que se encontra a Região, com infraestruturas a clamar melhoria, sendo o HDES a mais evidente neste momento, e um estádio das finanças públicas fragilizado, não só estruturalmente, mas também por diversos acertos irrepetíveis (?) como foram as despesas extraordinárias da pandemia e a recapitalização da SATA. Regista-se um défice estrutural a exceder os 100 milhões de euros anuais, na mesma altura que se avizinha o fim do PRR com uma redução drástica dos investimentos. O cenário não é fácil de gerir sem mudanças.
A recalibração do regime autonómico exige várias mudanças começando com uma atitude mais colaborativa e menos de disputa partidária entre os governos regionais e os governos centrais, secundarizando o interesse público, passando pela revisão da LFRA e a ativação de projetos de interesse comum em várias áreas como a saúde, as infraestruturas portuárias, a política de transportes marítimos e a educação, por exemplo.
Sem um novo quadro relacional entre os governos da república e regionais e sem um desempenho melhorado dos resultados das políticas da responsabilidade da Região, o modelo autonómico da nossa governação vai continuar a fragilizar-se. É urgente construir um novo rumo para que não se chegue ao ponto de o modelo ser posto em causa por uma maioria dos eleitores.

Mário Fortuna

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