A história ensina-nos que a ficção, muitas vezes, antecipa a realidade. No livro A Conspiração Contra a América, Philip Roth imaginou um cenário em que os Estados Unidos, sob uma liderança populista e autoritária, se afastam dos seus compromissos internacionais, mergulhando o mundo numa perigosa incerteza. Já a série Years and Years, de Russel T. Davies, projetou um futuro em que o populismo e o isolamento político levam ao colapso das democracias e à fragmentação global. Hoje, estas narrativas parecem menos ficção e mais uma premonição da realidade. A administração de Donald Trump, com o apoio de figuras como Elon Musk, está a traçar um caminho que ameaça não apenas as alianças históricas dos Estados Unidos, mas também a estabilidade global. Neste contexto, Portugal e os Açores surgem como peças fundamentais no tabuleiro geopolítico do Atlântico Norte.
As recentes declarações de Elon Musk, defendendo a saída dos Estados Unidos da NATO e da ONU, refletem uma visão isolacionista que enfraquece as bases da ordem internacional construída após a Segunda Guerra Mundial. Este posicionamento é agravado pelo autoritarismo crescente da administração Trump, que tem demonstrado desprezo pelas instituições democráticas e pelos aliados tradicionais dos EUA. A humilhação pública de Volodymyr Zelensky durante uma conferência de imprensa na Casa Branca é um exemplo gritante desta postura.
Este comportamento transacional e desrespeitoso para com aliados históricos levanta questões sobre o futuro das alianças globais. A possibilidade de os EUA abandonarem organizações como a NATO coloca em risco a segurança coletiva no Atlântico Norte e cria um vácuo geopolítico que pode ser explorado por potências autoritárias como a Rússia de Vladimir Putin.
É neste contexto de incerteza que os Açores, particularmente a Base das Lajes, ganham renovada importância estratégica. Historicamente, esta base foi crucial durante a Segunda Guerra Mundial e a Guerra Fria como ponto de apoio logístico entre os Estados Unidos e a Europa. Hoje, com o ressurgimento de tensões globais e o aumento da competição pelo controlo de rotas marítimas estratégicas, os Açores voltam ao centro do palco geopolítico. A localização estratégica da Base das Lajes permite monitorizar movimentos no Atlântico Norte e serve como elo vital entre os continentes americano, europeu e africano. Além do potencial valor militar, os Açores possuem uma Zona Económica Exclusiva vasta que oferece oportunidades significativas para a exploração de recursos marítimos e energias renováveis. Esta centralidade também traz riscos. A crescente influência russa no espaço atlântico e as relações perigosas entre Trump e Putin podem gerar instabilidade na região. Portugal deve estar atento às novas movimentações geopolíticas.
Os paralelos entre as distopias ficcionais de Roth e Davies e a realidade atual são inquietantes. O isolamento americano defendido por Trump e Musk ameaça desmantelar décadas de cooperação internacional e criar um mundo mais fragmentado e perigoso.
Se não aprendermos com as lições da história – reais ou ficcionais –, corremos o risco de repetir erros catastróficos num futuro onde todos seremos vítimas da conspiração em marcha contra a Europa.
Paulo Simões