Duas décadas antes de abril de 1974 a vida, em S.Miguel, decorria mais ou menos assim: alguns compatriotas nossos lutava em três frentes nas ex-colónias.
Os nossos compatriotas juravam defender a Pátria e lutavam com dedicação e sentido de missão.
As dificuldades que encontravam eram imensas e muitos perderam a vida.
Nesses anos, as dificuldades de índole económica para a generalidade das pessoas faziam-se sentir.
Nessas décadas, as terras produziam, milho, trigo, chicória, amendoim, chá e ananás em diferentes localidades, beterraba, uvas, batatas para exportar, tabaco e muito mais. A força braçal era determinante. Para se fazerem algumas sementeiras era necessário preparar a terra executando uma tarefa designada por cavar terra para a vala.
Tal como escreveu Nemésio, em 1929: ”O micaelense… é ele que levanta a enxada mais alto, a crava mais fundo, lhe extrai a terra já dócil ao grão e já penetrável ao turbéculo”.
Observei algumas vezes o processo de recrutamento de homens no designado canto. Os mais capazes saíam em primeiro lugar.
Os homens compareciam de pé descalço, sacho ao ombro, cesta no braço com o almoço. Alguns desses almoços faziam-se à custa de pimenta moída que depois de fritada numa frigideira era barrada em pão de milho branco e/ou amarelo. Os invernos eram rigorosos, em geral.
Andar de pé descalço nas freguesias era muito frequente. Muitos homens usavam alpercatas feitas com frações de pneus de carros.
Na escola primária, os recursos eram muito escassos. Os professores usavam da sua imaginação e empenho para os superar. Nos feriados nacionais mais relevantes nas escolas faziam-se discursos, exibiam-se pequenas peças de teatro que estimulavam a memória e as capacidades de falar em público. Como disse o poeta e escritor, José Jorge Letria: “a memória vive do exercício da mesma”. As famílias, muitas vezes numerosas sentiam imensas dificuldades em fazerem três refeições, no decurso de cada dia.
A falta de cuidados à saúde infantil, em particular, determinava muitas vezes desfecho inevitável: a vida curta.
Enfim, caros compatriotas, antes era mais ou menos assim a vida…
Boanerges Melo