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Das intenções às ações ou vice-versa

A nenhum eleitor, no passado dia 18, foi perguntado se queria fazer qualquer revisão da Constituição da República, muito menos para lhe “retirar o caráter ideológico” e atacar o regime democrático, ou retirar dela as principais obrigações sociais do Estado, e a obrigatoriedade dos inerentes serviços com caráter público, para com os cidadãos…
Depois das eleições, repentinamente as direitas mais extremas (Chega e IL) passaram a proclamar aos quatro ventos que é necessário “Aproveitar a ocasião” para rever a Constituição, com os fins já citados. E eu não resisto de imediato a fazer uma pergunta inocente: Se é para retirar o carácter ideológico à Constituição, porquê então “aproveitar” a ocasião em que, pela primeira vez uma só ideologia, a das direitas, ficou com o suficiente número de deputados (2/3), para impor ao País a revisão da Lei Fundamental, caso a AD queira?
Levantadas estas duas questões, a conclusão é uma só: Esta gente está a enrolar-nos pura e simplesmente, e a servir-se das votações obtidas para enganar os seus votantes e tentarem satisfazer as suas reais intenções, que são, afinal, as de pura e simplesmente proceder ao ajuste de contas com a revolução de Abril, a sua Constituição e o caráter genuinamente democrático desta.
A Constituição está longe de ser ideológica, como pretendem convencer-nos as direitas extremas, pois foi escrita e aprovada em 1976 por deputados de todos os partidos (esquerdas e direitas, com exceção do CDS) eleitos exatamente com a finalidade de a escrever. O que não quer dizer que seja uma Constituição neutra, sobretudo em relação ao regime fascista cuja condenação consagra, como condição do restauro da Democracia, e que parece haver quem, passados 51 anos, depois de muitas juras hipócritas de amor ao seu conteúdo e de cravo ao peito, pretenda agora reabilitar, acusando a Lei de “ideológica”…
Mas nem só de teorias ideológicas nós podemos viver, e de facto o que decididamente marca o caráter prático e útil da Constituição de Abril não é o “socialismo” que todos os constituintes deliberaram incluir no preambulo histórico do seu texto (e que nem sequer está na lei propriamente dita), mas sim os direitos que ela consagra: o direito universal, público e gratuito, à saúde e à educação; o direito à habitação e à mobilidade, sem submissão à lógica do lucro; o direito a ter direitos no trabalho; o direito à Cultura ou à Proteção Social, no combate às desigualdades e contra o domínio dos grandes grupos económicos. Tudo direitos que, votos mais ou menos conscientes à parte, continuam hoje a ser exigidos e desejados por milhões de portugueses.
Se amanhã, um governo português, melhor que aqueles que temos tido, decidir aumentar salários e pensões, alargar prestações sociais, reforçar a capacidade de resposta dos serviços públicos, garantir o controlo público das empresas e setores estratégicos, apoiar efetivamente a produção nacional e regional e enfrentar com firmeza a vontade política de dominação por parte dos grandes grupos económicos, poderá sempre fazê-lo invocando a atual Constituição Portuguesa. Percebe-se assim melhor a intenção das direitas e dos mais poderosos, subjacente à sua desejada revisão constitucional: Além de tudo o que já têm feito ao longo de anos de maus governos para contornar ou negar medidas políticas como as acima citadas, trata-se agora de acabar de vez com a legitimidade constitucional das decisões governativas para a sua aplicação.
Entretanto do outro lado do mundo, depois de muito silêncio e cumplicidade criminosa, num acesso de lucidez de vários países da UE, passou-se finalmente a condenar Israel pelos monstruosos crimes continuados de genocídio que prosseguem em Gaza e na Cisjordânia. Só é de lamentar que, logo de seguida, esta condenação, incluindo do nosso ministro Rangel, apareça gravemente embrulhada em muitas palavras e bem poucas ações…

Mário Abrantes

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