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Nada é como dantes

Nesta época veranil ainda há quem vá casando, sempre escolhem o verão para casar e muitos nem devem saber a razão. Dantes, fazia sentido pois o único banho era na Páscoa e no verão ainda não se cheirava muito mal. O movimento de casamentos na igreja, hoje em dia, não é nada que se compare a outros tempos (nos últimos 20 anos muito mudou) em que todas as semanas alguém se casava… Este será talvez, e apenas, o terceiro casório desde junho, com a mesma parafernália de sempre, mas mais modesto que o anterior, pois o carro não é uma limusina de 8 metros mas um mero Mazda 5 descapotável e de cor sóbria.
Qual não foi a minha surpresa ao ver alguém sair da nave construída em 1877 com uma salva na mão, pensei até tratar-se daqueles implementos religiosos em que o padre converte a água em vinho ou similar, mas não, era um moderno drone que começou a sobrevoar as cabeças na escadaria da igreja e a gravar para a posteridade os momentos, as indumentárias e a imagética deste casamento. Já não há cá o porteiro da escola EB 2,3 da Maia, sr Luís Torres a tirar fotografias ou a fazer filmes de fim de semana, como dantes, para depois apresentar contas exorbitantes da sua arte.
Uma coisa sobressaía neste casamento, havia quase tantos mirones como participantes (e apenas meia dúzia de carros no desfile ruidoso de buzinas a apitar que deu a volta ao quarteirão, como é costume). Não há nada como um casamento para fazer sair da toca todo o bicho careto da terrinha, que terão motivo de conversa para muitas luas, e sempre são temas mais caseiros do que nas novelas televisivas
Continuam a sobressair os cetins e veludos, apesar do calor. São vestidinhos que sempre dão jeito pois podem ser usados, de novo, nas festas de Nossa Senhora do Rosário que se avizinham na última semana do mês de agosto e que são os dias mais importantes no calendário anual da Lomba da Maia. Agora seguem todos em cortejo ruidoso que nisto de poluição sonora, os Açores dão cartas a qualquer um (creio que batem chineses e espanhóis, sem problema) para um almoço que se irá prolongar ao sol-posto com as suas inevitáveis libações alcoólicas, que nisto de álcool, tabaco e drogas também o arquipélago não gosta de deixar o seu crédito por mãos alheias.
Ontem tivemos o dia mais quente da história aqui na Lomba da Maia: 28.9 ºC à sombra, mas os convidados nem se deram conta tão compenetrados estavam em repetir tradições na mostra de ostentação mais importante das suas vidas, o casamento, cuja importância só é secundada pelas festas da paróquia. Meia hora depois, os mirones dispersaram e a paz normal de uma tarde de sábado voltou a esta rua, apenas abalada pelas carrinhas de vaqueiros que ainda vai havendo na sua lufa diária.
Todos sabem como nós tínhamos o hábito de passado o primeiro aqui de festas em casa (2005) sempre que podíamos nos retirávamos para outra ilha na semana última de agosto, a fim de evitar o barulho da semana de festas. Apesar disso, o nosso filho sempre ia buscar umas moedas de doação para a comissão de festas, mas este ano (em que estou só nesta casa) competiu-me a mim, a hipocrisia de ir buscar as moedas para a festa que tanto critico e fiquei a pensar se deveria ter evitado contribuir e ser coerente ou se fiz bem fingir que apoio as festividades.
Entretanto pelas 16.00 a temperatura atingiu 29,5 ºC, novo máximo local, à sombra com a sensação térmica a 32 ºC…que nem a bruma das areias do Saara aliviam, dando um tom amarelado aos céus… quem diria? quando a média de anos transatos seria de 23 e o anterior recorde de 28 ºC em 2020. E fiquei-me deslumbrado com o silêncio que – por vezes – ainda acontece por entre as buzinas das carrinhas de fruta, de pão, de carne, de peixe, das carrinhas de vaqueiros e daqueles que saúdam quem vai na rua.

Chrys Chrystello*

*Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713

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