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Onésimo Almeida: “Há um segmento da comunidade portuguesa que virou republicano”

Onésimo Almeida, professor universitário nos EUA, escritor e ensaísta, colaborador do “Diário dos Açores”, concedeu uma entrevista ao jornal Público de ontem, onde explica a posição da comunidade portuguesa face às eleições de hoje nos EUA.
“Tradicionalmente, os portugueses eram do Partido Democrata porque era o partido dos católicos, da gente da mó-de-baixo, seguindo o exemplo dos emigrantes irlandeses, profundamente anti-establishement inglês e protestante. Na última década, um grande segmento virou republicano sobretudo por causa da hierarquia da Igreja Católica americana que transformou o aborto em tema de clivagem. A Igreja Católica, na sua maioria, virou à direita e deixou de seguir a velha regra de não envolvimento político. Intervém descaradamente em favor de Trump, tal como as igrejas evangélicas. Mas o fenómeno é mais complexo e não tenho espaço para aventar algumas possíveis explicações que tenho vindo a formular através de leituras e de contato direto com as comunidades portuguesas. Uma delas, e muito importante, é o facto de hoje já não se tratar propriamente de uma comunidade imigrante, mas sim de uma comunidade integrada – e muito bem – economicamente.
Quer dizer: pensam como republicanos”, afirma Onésimo Almeida.
O professor da Universidade de Brown, em Providence, concorda que há duas Américas diferentes “embora se tenham extremado nos últimos anos. Nos EUA e no mundo. Mas sempre se extremaram. Quando eu era jovem, a viragem era para a esquerda. Um professor meu, muito conservador, advertia-nos: Olhem que a história é um pêndulo. Daqui a mais uns tempos o pêndulo vai virar para o outro lado! O que nunca imaginei foi que os EUA fossem o grande líder dessa atual viragem do pêndulo.
A situação não me tira o sono porque durmo bem. Em jovem, até dormia pesadamente durante os abalos de terra açorianos, sem sentir nada, quando toda a gente fugia para a rua. Portanto, ainda durmo pesadamente. Mas logo de madrugada já estou desperto e atiro-me à leitura de notícias sobre a situação. O meu motor de busca já sabe que “Trump” é a palavra que mais teclo. Basta ecsrever T e vêm-me logo as últimas notícias sobre esse inominável”.
Onésimo Almeida explica ainda que “o trumpismo não nasceu com Trump. Estava latente e Trump ofereceu-se para seu porta-voz. Na Reforma protestante, Lutero e Calvino desempenharam papel semelhante. Estava latente o sentimento. O ser humano manifesta tendências instintivas básicas que têm resistido a alguns excessos do liberalismo (na Europa, equivalente a “esquerda”), e as redes sociais permitiram que eles emergissem e encontrassem um espertalhão (leia-se Trump) que, instintivamente, soube aproveitar as águas turvas. Prometeu secar o pântano e agora nada nele à vontade e impunemente”.
Afirma, ainda, que “o meu receio é o caos que poderá rebentar. O 6 de Janeiro foi arquitetado por Trump (não estou a inventar; basta ler os dados disponibilizados pelo tribunal). O perigo de uma guerra civil não é apenas fruto de imaginações medricas”.

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