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O amuleto de Bolieiro

Há quem diga que José Manuel Bolieiro tem um amuleto político.
Por onde passa, a sorte cai-lhe sempre nos braços.
Foi na Câmara Municipal de Ponta Delgada, com a saída de Berta Cabral em 2012, caindo-lhe o poder no regaço, e foi no arranjo da coligação após as eleições de 25 de Outubro de 2020, mesmo perdendo por uma diferença de 5 mil votos.
Agora, em 2025, a sua governação vai decorrendo em águas calmas, apesar de tantos falhanços, graças a uma oposição dividida entre a anestesia e a frouxidão.
Até o Pai Natal trouxe-lhe boas novas, com o anúncio, pelo INE, do crescimento do PIB acima da média nacional e só ultrapassado pela Madeira.
Já neste Ano Novo, mais uma boa nova: a inflação mais baixa de todo o país em 2024, com uns gratificantes 2,3%, dentro daquilo que o Banco Central Europeu exige aos estados membros, para baixar taxas de juro, projectando atingir os 2% em 2026. Ou seja, chegamos lá um ano antes.
O caso do crescimento do PIB é o mais significativo, porque mede o desempenho económico de cada Estado ou Região.
Em 2023, os Açores cresceram 3,4%, acima dos 2,5% nacionais, dos 3,3% do Algarve e Lisboa, mas abaixo dos 4,5% da Madeira.
Já em 2022, na saída do impacto da pandemia, os Açores tinham crescido 6,3%, abaixo dos 7% nacionais e muito abaixo dos 20,7% do Algarve, dos 16,5% da Madeira e dos 9,1% da Grande Lisboa, numa anomalia derivada do ano Covid.
O certo é que entre 2021 e 2023, os Açores crescem em linha com o país, mas menos do que as regiões de referência – Lisboa, Madeira e Algarve que tiveram um impulso maior do turismo a sair da pandemia.
A boa notícia, agora, é que os Açores crescem mais do que a média da Europa, razão pela qual o PIB da Região evolui, face à média europeia, de 65% em 2021 para 67% em 2022 e para 71% em 2023.
De recordar que entre 2010 e 2019, o PIB per capita açoriano divergiu face à média nacional.
Nem as melhores previsões do Governo Regional atingiam os 3,4%, já que o previsto nos documentos do executivo de Bolieiro era de apenas 2,5%.
Face ao país, o PIB per capita evolui de 88% em 2021 para 87% em 2022 e 88% em 2023, o que é um desempenho razoável, mas aquém das outras regiões.
No mesmo período, o mesmo indicador para a Madeira evolui de 97 em 2021 para 108 em 2022 e 109 em 2023.
A produtividade aparente do trabalho nos Açores (medida pelo Valor Acrescentado Bruto gerado por cada unidade de pessoal ao serviço) ficou-se pelos 88% em 2023 (o registo mais baixo de todas as regiões) quando na Madeira o valor foi de 106, acima da média nacional de 100.
Os ganhos de crescimento dos Açores ficaram substancialmente atrás dos da Madeira, que teve uma evolução mais robusta do turismo.
E é, exactamente, o turismo que está a puxar a dinâmica económica nos Açores.
O quase pleno emprego e as consequências do impacto do turismo noutras actividades estão a ter consequências positivas na economia regional.
Estamos todos absorvidos com o turismo e com os receios de um monociclo, que nem nos apercebemos que a evolução do PIB, como diz o INE, também se ficou a dever à actividade agroindustrial, que deu um forte salto, assim como o comércio e o alojamento.
Não fosse o turismo e estaríamos com os mesmos pobres indicadores de há uma década.
Outra coisa é a distribuição dessa riqueza.
Aqui a música fia mais fino, pois se é verdade que o turismo está a revelar-se como o factor mais importante para esta dinâmica, também é verdade que a distribuição da riqueza mantém-se, ainda, com fortes distorções, como revela também o INE, fazendo dos Açores uma das regiões mais desiguais do país em termos de coesão.
Olhando para as contas das famílias, o INE diz que a Região Autónoma dos Açores, apesar do crescimento do Rendimento Disponível Bruto (RDB) claramente inferior ao do país, apresentou uma variação do RDB de 8,0%, devido à redução fiscal ocorrida no âmbito da Lei das Finanças das regiões autónomas (com um contributo dos impostos de -0,1%, bem inferior a -1,4% do País) e ao aumento das prestações sociais superior à média nacional, com um contributo superior (2,2%).
Em resumo, os Açores (coeficiente de Gini em 33,8%) era a região do país com maior assimetria na distribuição dos rendimentos.
Como já aqui referi, noutras crónicas, há que reconhecer a evolução da economia e da riqueza açoriana nas últimas décadas, mas o problema é que as outras regiões cresceram mais depressa do que nós, e a nossa não conseguiu debelar as enormes assimetrias, daí as inúmeras bolsas de pobreza.
Temos ainda muito caminho para andar e o amuleto de Bolieiro não vai servir de muito se não tivermos políticas acertadas, com a gigantesca máquina da administração regional cada vez mais bloqueada pelo absurdo do seu funcionamento.
Ou fazemos reformas profundas no sistema ou não haverá talismã que nos salve.

Osvaldo Cabral
[email protected]

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