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Liberdade e Liberalismo

Liberdade sem o fim da guerra e a consagração da paz, não é liberdade…Liberdade sem alimentação suficiente e regular, não é liberdade…Liberdade sem direito à habitação, não é liberdade…Liberdade sem cuidados de saúde, não é liberdade…Liberdade sem ensino e educação, não é liberdade…
Há 50 anos, um imenso povo (o Povo Português) invadiu as ruas de alegria e fraternidade humanas fazendo uso, ao fim de 48 anos, da conquista da liberdade de expressão e opinião para reclamar estas outras liberdades, universalizadas no seu contexto único da “Liberdade a sério” pela canção de Sérgio Godinho lançada com a revolução que os militares haviam iniciado. A elas acresciam outras, também reclamadas por esse mesmo povo, como a liberdade da criação e fruição culturais, ou a liberdade de trabalhar sem ser explorado.
E assim se começou a fazer imediatamente a seguir ao derrube do regime de Salazar e Caetano: Libertaram-se os presos políticos, decretou-se a paz e acabou-se com guerra nas colónias, instituíram-se o salário mínimo, as reformas, o direito às férias, as prestações sociais, o controlo público da banca e das grandes empresas estratégicas, a criação dos serviços de apoio à habitação e a eliminação das barracas, a criação do Serviço Nacional de Saúde universal e gratuito, a alfabetização, o ensino obrigatório e os apoios generalizados à universidade e à cultura.
Progressivamente, ao longo dos anos que sucederam ao golpe de 25 de novembro de 1975 e particularmente depois da adesão do país à então Comunidade Económica Europeia (CEE), os governos controlados pelos dois partidos que habitualmente foram tendo mais votos começaram, por vezes ao abrigo de tratados da União Europeia sobre os quais o povo não teve sequer uma palavra a dizer, ou em contraponto aos direitos soberanos da pátria portuguesa, a refrear e condicionar o pleno exercício da “Liberdade a sério” de que a revolução portuguesa se reclamava defensora, para progressiva e paulatinamente a trocar pelo nome da (sempre invocada como razão última) “liberdade dos mercados e da livre circulação dos capitais” na economia, a qual, por sua vez se queixava imensamente do considerado asfixiante domínio que o Estado (democrático, note-se) lhe impunha.
E assim se foram instalando as teorias do capitalismo como o fim da história, do “menos estado melhor estado”, dos “menos impostos para a economia” e mais benefícios e dinheiros públicos para as grandes empresas e para a banca, tudo em prejuízo dos investimentos públicos indispensáveis para garantir a “Liberdade a sério” que a revolução de há 50 anos iniciou.
E assim chegámos aos fortíssimos índices de desigualdades, baixos salários e empobrecimento de uma parte vergonhosamente significativa da população portuguesa, muita dela mesmo trabalhando.
E assim vemos governos que mal tomam posse tratam de enganar os portugueses sobre a baixa dos seus impostos (IRS), deixando intocáveis quase metade das famílias que devido aos seus baixos rendimentos já estão deles isentas, e de imediato garantem, isso sim, a redução de 21% para 15% do IRC sobre as empresas, o que do ponto de vista financeiro só assume real significado para as grandes acumulando estas, ainda por cima, milhões em borlas fiscais…
Liberdade e Liberalismo nos tempos de hoje só têm mesmo de igual as primeiras 4 letras. De resto em tudo se vão revelando, aos olhos de quem viu nascer Abril e para cada vez maior número de portugueses, de um incontornável antagonismo.

Mário Abrantes

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