Os Açores foram atirados para uma crise política forjada na irresponsabilidade de dois pequenos partidos com representação na Assembleia Legislativa da Região Autónoma dos Açores e no aproveitamento oportunista do maior partido da oposição.
Antecipando as eleições de Outubro para o início do ano, em Fevereiro, os líderes dos três partidos responsáveis por este desfecho provocaram instabilidade política numa manobra meramente egoísta, porque somente motivada pelos seus interesses e vaidades pessoais; ou com a intenção de aumentarem a sua representatividade no Parlamento ou para voltarem a ser governo.
O Chega e a Iniciativa Liberal, os dois partidos que assinaram o compromisso de apoio ao presente governo de coligação, dificilmente conseguirão explicar aos seus eleitores as razões de terem rompido o acordo que fizeram no início da Legislatura.
O Chega, que tinha exigido o combate à corrupção e a diminuição do número de beneficiários do Rendimento Social de Inserção (RSI), viu ser constituído em 2020,o Gabinete de Prevenção da Corrupção e da Transparência, que iniciou a sua actividade com 12 inspectores (enquanto o seu congénere na República, o Mecanismo Nacional Antocorrupção (MENAC), funciona somente com 4 funcionários), e testemunhou em três anos a queda em 40% no número de beneficiários do RSI.
A Iniciativa Liberal, que tinha exigido uma descida de impostos e o controlo e diminuição da dívida pública dos Açores, assistiu a uma grande baixa de impostos, até ao limite permitido por lei, logo no início da legislatura, numa das primeiras medidas implementadas pelo governo.
A dívida pública aumentou consideravelmente com a acomodação de despesas isoladas, e não repetíveis, como os gastos decorrentes das medidas de prevenção e combate à COVID, os custos de reestruturação da SATA, da Lotaçor e da Fábrica de Conservas de Sta. Catarina, de acordo com o identificado pelo Tribunal de Contas nos seus relatórios anuais.
O aumento da dívida pública em cerca de EUR 1’000 milhões em pouco mais de dois anos, colocou-a perto dos 60% do valor do Produto Interno Bruto (PIB) dos Açores, mas do segundo para o terceiro trimestre do corrente ano, já se verificou a inversão da tendência de crescimento, com um pequeno decréscimo, dos EUR 3’150 milhões para os EUR 3’327 milhões, segundo dados do Banco de Portugal (BPstat).
O desempenho da Economia tem sido positivo, tendo-se verificado um crescimento sustentado após a contracção no período COVID. A receita fiscal em 2022 ficou mais de 7% acima da que tinha sido arrecadada em 2019, antes das dificuldades impostas pela crise pandémica.
O PIB cresceu 6.8% em 2022 face a 2021, de acordo com o Serviço Regional de Estatística dos Açores (SREA).
O desemprego, tendo descido 14,1% em Novembro face ao período homólogo, está em cerca de 3.9% do total da população activa nos Açores, estando, por isso a Região a viver um período de “pleno emprego”.
No campo social, e durante a vigente legislatura, foram mantidos e até reforçados os programas dos executivos anteriores bem como foram criados e operacionalizados outros tantos para apoio às famílias mais necessitadas.
Sem surpresa, nenhum destes partidos conseguiu apresentar, de forma clara e inequívoca, uma razão para chumbar o Plano e Orçamento para 2024, anunciando inclusivamente que voltariam a não aprovar qualquer novo Plano e Orçamento que fosse apresentado na Assembleia Regional, sem que para tal tivesse explicado por que razão o fariam sem saberem sequer o que lhes seria proposto.
Deliberadamente provocaram a crise política que levou à marcação de eleições, interrompendo o normal ciclo legislativo a meros oito meses do seu fim.
Um país, uma Região, ou uma cidade que não tem estabilidade no seu sistema político não consegue ser atractiva para captar investimento externo.
Todos os investidores ou empreendedores necessitam de estabilidade política e fiscal, para que consigam ter a previsibilidade de que carecem para conseguirem assegurar o retorno dos seus investimentos.
Só com estabilidade política se consegue garantir a estabilidade fiscal e dos processos administrativos e de licenciamento.
A captação de investimento externo é essencial para o crescimento económico dos Açores e para a valorização do seu tecido empresarial.
Sem investidores externos, a Região continuará refém dos empresários locais que estão, na sua grande maioria, totalmente dependentes da subsidiação do Governo Regional e dos Fundos Europeus.
Muito recentemente, dois dos representantes máximos dos empresários micaelenses, da Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada e da Associação Agrícola de S. Miguel, reivindicaram um conjunto alargado de medidas que, no seu entender, são de responsabilidade do governo.
Muitas das medidas visam o garante de estabilidade fiscal, a simplicação e a desburocratização dos processos da Administração Pública, e a promoção da estabilidade e previsibilidade a médio prazo, que são efectivamente responsabilidade de um governo.
Mas este conjunto inclui também medidas que, pela sua natureza, se deviam circunscrever à esfera privada: a criação de estruturas de acompanhamento da competividade das principais fileiras produtivas, assegurar um novo modelo de transporte marítimo que despenalize os utentes privados e faça reduzir o excessivo custo destes serviços para o utente, combater a sazonalidade no turismo com a captação e fixação de novas rotas aéreas, promover a formação contínua dos trabalhadores em todos os sectores de actividade,
Ora, a competitividade de toda e qualquer indústria é da inteira responsabilidade dos seus empresários, a implementação de um modelo de transporte de mercadorias menos penalizador da economia pode ser rapidamente executada pelos incumbentes, sócios da Câmara de Comércio e Indústria de Ponta Delgada, que funcionam em regime de cartel há muitas décadas, a captação de turistas em época baixa faz-se com uma oferta competitiva fora dos meses de pico e a formação contínua dos trabalhadores deve ser promovida pelas próprias empresas privadas.
A estabilidade política é efectivamente essencial para a promoção do desenvolvimento económico e da coesão das ilhas açorianas e para a captação de investimento externo vindo de empresários que tragam uma verdadeira dinâmica empreendedora ao tecido económico da Região, rompendo assim com a “subsidiodependência” vigente.
Por isso, aqueles que egoisticamente e irresponsavelmente, promovem a instabilidade em prol de interesses partidários e de uns poucos, não têm o sentido de estado necessário às funções que lhes foram confiadas pelo voto popular.
O actual quadro partidário dos Açores alberga algumas lideranças que, em meu entender, não têm estado à altura da confiança que nelas foi depositada; e digo isto com enorme pesar, porque sendo militante socialista, vejo o meu partido a tomar atitudes de grande irresponsabilidade e de pouca maturidade política e mesmo até democrática.
Uma oposição responsável é aquela que é construtiva, que expõe o que não está bem e o complementa com o que devia ser feito para melhorar.
E não são poucas as áreas que podem melhorar muito, como a fraca taxa de execução dos fundos Europeus quando comparada com o que era executado nos governos anteriores, como a deterioração da qualidade do transporte marítimo de passageiros, que viu rotas serem canceladas no período COVID e que nunca mais foram repostas, como a falta de medidas que promovam o reforço da coesão económica e social no arquipélago, como a incapacidade para inverter a deterioração da qualidade do ensino, com resultados muito medíocres dos estudantes açorianos nas provas de avaliação oficiais, como o baixo investimento na cultura e na ciência, como a incapacidade de aligeirar a pesada burocracia na Administração Pública, como a enorme purga promovida para colocar um alargado contingente de “boys” simpatizantes dos três partidos da Coligação, como a falta de destreza política do executivo para manter coesa a solução política que encontrou para formar governo, depois de ter perdido para o PS as eleições de Outubro de 2020, etc., etc..
No próximo dia 4 de Fevereiro os açorianos serão novamente chamados a exercerem o seu direito e dever de voto.
Apelo a que todos exerçam esse direito e que com o voto depositem a confiança em quem tenha mostrado ser merecedor da mesma e em quem considerem estar melhor preparado para trazer um sólido e estruturante desenvolvimento económico, social e educativo a todas as ilhas do Arquipélago dos Açores.
Nuno Domingues