Recorro, frequentemente, aos meus livros sobre História e Cultura Açorianas. É lá que obtenho explicações sobre o viver das nossas gentes e a construção permanente da nossa identidade.
É um exercício saudável e compensador porque nos transmite conhecimentos sobre figuras e fatos que nos conduziram até aqui.
Ainda hoje, são muito procuradas as biografias de determinadas personalidades que assumiram posições sociais destacadas.
Evoco hoje, o nascimento de D. João Paulino de Azevedo e Castro, a 4 de fevereiro de 1852, nas Lajes do Pico. Foi Bispo de Macau durante 15 anos, onde faleceu com 66 anos. Os seus restos mortais foram transladados para a sua terra natal, em 6 de fevereiro de 1923, encontrando-se na capela-mausoléu mandada construir por amigos e admiradores.
D. João Paulino foi um dos cinco Bispos açorianos em Macau.
O primeiro foi D. Manuel Bernardo de Sousa Enes, (1814-1887), natural de São Jorge. Seguiu-se-lhe D. João Paulino. Depois foi nomeado outro picoense D. José da Costa Nunes, mais tarde Patriarca das Índias Orientais e Cardeal Vice-Camerlengo da Santa Sé (1880-1976). Sucedeu-lhe em Macau o micaelense D. Paulo José Tavares (1920-1973) e, finalmente, D.Arquimínio R. Costa (1924-2016), também natural do Pico, último Bispo português daquela ex-colónia portuguesa. Outros dois Bispos picoenses serviram a Igreja Católica no Oriente: D. José Vieira Alvernaz (1898-1986), Patriarca das Índias (Goa, Damão e Diu) até à ocupação daqueles territórios pela Índia e D. Jaime Garcia Goulart (1908-1997), primeiro Bispo de Timor.
João Paulino de Azevedo e Castro, era filho de Amaro Adrião de Azevedo e Castro e de Maria Albina Carlota da Silveira Bettencourt, morgada das Lajes.
Fez a instrução primária na sua erra natal e com doze anos foi tocador fundador da Filarmónica Lajense. Cursou o Liceu da Horta de 1868 a 1872. Seguiu depois para a Universidade de Coimbra onde obteve o bacharelato em Teologia. Aí “andou por livreiros e alfarrabistas a juntar livros paraeniar para as Lajes a fim de ser fundado o Gabinete de Leitura Lajense, ao qual sucedei o extinto Grémio literário Ljense”1. Em 1879 foi ordenado sacerdote, tendo celebrado a primeira Missa nas Lajes, juntamente com seu irmão Francisco Xavier de Azevedo e Castro, então viúvo.
Colocado como professor no Seminário de Angra foi nomeado, em 1888, Vice-Reitor.
Lecionou as cadeiras de Teologia dogmática, Sacramento e Moral, História eclesiástica, Direito canónico, Geografia e História geral, Francês e, também, Filosofia. A ele se ficou a dever a criação do Museu de História Natural no Seminário que obteve importantes espécimes.
Designado cónego da Sé catedral de Angra, João Paulino com uma forte aceitação social, exerce um importante papel na promoção da recente devoção a Nossa Senhora de Lurdes, através do Jornal “O Peregrino de Lourdes”. Em resultado disso, são instaladas imagens da Virgem de Massabielle em várias igrejas: Sé de Angra, Feteira no Faial, Lajes, Madalena, Piedade e Prainha do Norte, na Ilha do Pico2 ,Santo o Antão, em São Jorge, onde paroquiava o Pe Francisco Xavier, irmão do Pe João Paulino e Capelas em São Miguel.
“Era uma das figuras eclesiásticas mais distintas de então, desempenhando vários cargos de responsabilidade e de honra”.
Com tantas e excelentes qualidades morais e de serviço, a sua elevação a bispo de Macau foi um acto, como já alguém disse, agradavelmente esperado. Monsenhor cónego Ferreira, revela-nos que “Angra toda, a começar pela sua sociedade mais distinta, tinha pelo preclaro sacerdote a maior estima e simpatia, o que se revelou a flux por ocasião da sua elevação ao episcopado”. 3
D. João Paulino foi nomeado pelo Papa Leão XIII, por bula de 9 de Junho de 1902.
A sua sagração efetuou-se a 27 do mês de dezembro desse ano, na igreja do antigo Convento de S. Francisco de Angra, então anexada ao Seminário. Foi sagrante o bispo diocesano D. José Manuel de Carvalho, transferido da Diocese de Macau para a de Angra.
O novo Bispo partiu de Angra a 23 de março de 1903 e deu entrada solene na Diocese a 17 de junho desse ano, tendo dirigido uma Carta Pastoral aos fiéis onde se afirma temeroso pela responsabilidade do novo cargo: “um grande abalo se produziu em nós e quasi nos sentimos desfalecer em meio da luta de sentimentos opostos que se debatiam na nossa alma”(Avila,1993:79). Com ele seguiu José da Costa Nunes seminarista-teólogo que lhe havia de suceder no cargo.
D. João Paulino, fundou logo que chegou, em 1903, o Boletim Eclesiástico da Diocese de Macau, que viria a ser apelidado o rei dos boletins, onde escreve toda a história do seu episcopado.4
No ano seguinte visita as missões do Estreito e lança a primeira pedra da igreja de São José de Singapura, aberta em 1912. Visitou também Timor em 1905, e no ano imediato conseguiu que os Salesianos ingressassem na diocese macaense, a quem confiou a direção do orfanato da Imaculada Conceição, de que foi primeiro diretor D. Luís Versíglio depois bispo de Shiu-Show e mártir. A estes religiosos entregou D. João Paulino a missão do distrito de Heung-Sán. Fundou escolas, organizou colégios em Malaca, Hong-Kong, Cantão, Japão, etc.
Já em 1907, por sua influência, o Vaticano anuiu à troca de Hainan por Shui-Hing, que passou à jurisdição de Macau e que viria mais tarde (1913) a ser dividida em duas missões, sendo a do norte à conta dos jesuítas e a do sul ao apostolado dos padres seculares.
Macau, em sua honra, atribuiu o nome do Bispo picoense a uma artéria da cidade, onde viveram e se estabeleceram outros picoenses.
Em Angra, o tesouro da Sé guarda o seu báculo, oferecido pela família ao Bispo D. Guilherme Augusto.
1 ÁVILA, Ermelindo, FIGURAS & FACTOS, (Notas Históricas), Edição da ADPIP,CâmaraMunicipal das Lajes do Pico, 1993
2 ÁVILA, Ermelindo,CULTO MARIANO na Ilha do Pico,Companhia das Ilhas, 2016
3http://macauantigo.blogspot.com/2009/08/bispos-naturais-dos-acores.html
4 LIMA, Gervásio, BREVIÁRIO AÇORIANO, Tip. Andrade, 1934
José Gabriel Ávila*
*Jornalista c.p.239 A
http://escritemdia.blogspot.com