Perdoe-me o leitor, mas, nestes dias, do que mais se ouve falar é de deputados, pouco de deputadas. Elas estão em minoria nas listas e o futuro Parlamento traduzirá, certamente, essa desvantagem.
A mensagem que pretendo transmitir respeita a todos os que pretendem representar-nos a partir de 10 de março.
Sou um simples cidadão. O meu voto vale tanto como o de qualquer recluso, de um sem-abrigo, ou do mais qualificado académico. Há, no entanto, uma diferença: nem todos têm possibilidade de fazer ouvir a sua voz, ou porque não têm acesso à imprensa nem pertencem aos quadros partidários, ou porque não integram qualquer instituição sócio-económica, profissional, ou outra. Isso faz toda a diferença.
As luzes da ribalta na nossa sociedade acendem-se, habitualmente e projetam-se em quem tem poder económico, social, político, cultural e religioso e isso é condição suficiente para se ser levado em conta.
Quem afronta os poderes mais sonantes é catalogado de “contra”, mas quem aplaude o “establishment” é considerado “dos nossos” e mais dia menos dia integra a “família dos eleitos”.
Não sei qual o percurso de ascensão do candidato ou candidata a quem dirijo “estas mal traçadas linhas”, mas reconheço que, se o povo lhe der a sua confiança para representá-lo no Parlamento Nacional assumirá uma enorme responsabilidade e carregará um peso sobre si.
Como sabe, – não sei se o sente na pele -há por aí muita gente empregada, mesmo da classe média, que passa imensas dificuldades para pôr na mesa o pão aos filhos, para pagar as contas mensais e as dívidas contraídas com a aquisição de uma casa. Sim, mesmo de uma casa simples e pequena, pois os terrenos estão pela hora da morte e os preços da construção subiram, subiram e ninguém disse ainda: Pára! Já chega de tanto lucro, chega de baixos salários! A situação abrange agora a mão de obra da atividade turística.
E não me digam que a atividade económica cresceu e que o desemprego baixou. De que serve isso se a vida da maioria dos cidadãos está cada vez mais difícil e os índices de pobreza não param de subir para vergonha de todos nós?
Senhor ou senhora candidata:
Há quem diga que o tempo das ideologias passou.
Eu por mim ainda sigo a velha cartilha. Fui educado a aprender e a saber distinguir os princípios sociais e políticos dos ismos (capitalismo, socialismo, comunismo, fascismo e das suas variantes que agora começam a afirmar-se) e dou por bem empregue os livros que li de mestres que fizeram escola. É por essa grelha que avalio as propostas dos que pretendem representar-me no Parlamento Nacional.
Noto porém, que há propostas políticas que se contradizem. Proclamam certos direitos fundamentais, como o direito a vida, à saúde, à habitação, ao emprego, etc, mas logo os negam defendendo restrições a apoios sociais, ao direito à habitação, a salários justos, a uma vida digna, seja em que país for.
Mais grave ainda é fazer a defesa das liberdades, dos direitos cívicos e da democracia, e negar aos cidadãos mais frágeis e periféricos benefícios sociais só existentes em regiões onde as médias salariais atingem os mais elevados patamares.
Estas injustiças têm de ser denunciadas, doa a quem doer. De contrário os eleitos e eleitas não representarão o povo. Serão autómatos da “bolha” parlamentar desintegrados do território que os elegeu, passando o tempo em plenários e comissões que alimentam mais contendas políticas do que o bem-estar e o progresso nacional, fazendo número na aprovação de leis e a aplaudir discursos inflamados mas inócuos.
Desses deputados não necessitam os Açores.
A Região não carece de deputados que “defendam” a Autonomia, mas sim que a promovam, dignifiquem e lutem pela ampliação das suas competências, acompanhadas das respetivas transferências financeiras estatais a que os açorianos, como cidadãos nacionais têm direito. O pior que pode acontecer a um regime político é os seus agentes serem pedintes e andarem, permanentemente, de mão estendida, como se depreende de alguns “out-doors”.
O estatuto das Ilhas Adjacentes e dos Distritos Autónomos passou e deixou má memória.
A distância do Terreiro do Paço era tão grande que, nem mesmo durante as visitas ministeriais, os governantes nacionais, brindados com lautos jantares e almoços, se sensibilizavam com as graves e gritantes necessidades. O resultado foi o êxodo migratório para os EUA e Canadá e a consequente desertificação demográfica. Tema cada vez mais atual e complexo, que não vi discutido nem na última campanha eleitoral nem na presente.
O declínio demográfico não se traduz apenas na falta de mão de obra na construção civil. Envolve questões relacionadas com o ambiente, a conservação da natureza e da paisagem humana, do parque habitacional, do património construído, da identidade cultural, da educação, da saúde das populações e, necessariamente, a necessidade da imigração e a sua complexa inserção no meio. Mas, sobre tudo isto há um silêncio resistente e preocupante que trará consequências ao desenvolvimento sócio-económico das nove ilhas. Isto para não falar do aproveitamento da plataforma marítima açoriana, do desenvolvimento científico e do aproveitamento geoestratégico dos Açores nos recentes conflitos.
Como vê, senhor(a) candidato(a), não lhe falta matéria para dizer ao eleitorado o que pensa. Já falta pouco tempo. Ou é agora, ou depois será tarde pois o habitual é os deputados eleitos enclausurarem-se na “bolha” partidária e parlamentar e só passearem em atos oficiais e religiosos a sua “importância” e visibilidade.
Se este é o seu conceito de representante democrático, aconselho-o(a) a retirar-se antes de domingo.
A representação popular exige abertura ao diálogo, aceitação das diferenças e da cidadania, espírito de serviço e dedicação à causa republicana.
Se for eleito(a) não se cale perante as injustiças. Proclame a verdade (não apenas a sua verdade) e defenda, a todo o custo a liberdade, a dignidade humana e desempenhará bem a missão.
José Gabriel Ávila*
*Jornalista c.p.239 A
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