Edit Template

A minha visão das Florese do Corvo (2013) Parte 3 (II)

3.2. Como vi o Corvo 2013

Amanheceu mesmo em frente à janela da suíte e talvez pela primeira vez (desde que me lembro) vi o sol nascer sobre o mar, momento inolvidável de beleza e magia que iria marcar o resto do dia dedicado à viagem ao Corvo. Saímos com outras 12 pessoas num Zodiac, barco semirrígido, para uma viagem de pouco menos de 40 minutos (15 milhas) ao custo de 30 Euros por pessoa, com direito a ver grutas. O guia navegador, há 20 anos metido nisto, apoia a Universidade dos Açores e seus biólogos, e deu explicações detalhadas sobre cagarros, a pesca do atum e aspetos da vida marinha.
A viagem correu bem sem sobressaltos, mas se vislumbrarem os prometidos golfinhos nem baleias (cachalotes). Muito calor à chegada ao pequeno cais, o Porto da Casa, onde 3 carrinhas de 9 lugares nos esperavam para levarem os visitantes ao Caldeirão e suas lagoas, ponto obrigatório de visita dos turistas, a um custo de 5 euros por pessoa, creio eu. Ainda não chegara a névoa e via-se tudo bem. Muitas pessoas desligaram-se do grupo e foram caminhar pelos trilhos, monte acima, ou monte abaixo, descendo depois os 8 km a pé até à capital da ilha e única povoação. Perguntei ao motorista como era a vida no Corvo, face às noções que fui acumulando ao longo dos anos, sobre as suas privações, a sua pouca população (menos de 400 pessoas), as longas noites de invernia, mares de vagas de doze metros, semanas sem comunicação com o mundo exterior de barco ou avião (a fibra ótica está quase a chegar). O motorista disse que agora já não era tão mau como o fora até há alguns anos, pois as pessoas tinham meios para se abastecerem e fazerem face aos cortes de suprimentos causados pela falta de comunicações marítimas. O ilhéu que parece uma bota, onde as suas gentes se confinaram à outrora chamada Vila Nova do Corvo (hoje Vila do Corvo) sem ocupação efetiva da terra como local de moradia nas terras mais altas. A altitude do Caldeirão do Monte Gordo é de 300 metros, a sua crista fica a 600 metros, mas o Morro dos Homens atinge 718 m. Tem um diâmetro de 2 mil metros com pequenos lagos, dois ilhéus compridos e cinco ilhéus arredondados tendo-se formado há cerca de 1,5 milhões de anos. Na estrada de ascensão à Caldeira havia muito movimento para uma ilha tão pequena e despovoada: carrinhas de vaqueiros, pequenos tratores, moto-quatro conduzidas por idosos, jovens e até por uma mulher (a igualdade de género já chegou ao Corvo). Na vila vimos vários camiões e equipamento pesado de construção a indicar um surto de edificação bem necessário. A ilha aparenta muita pobreza, sujidade, falta de cuidado na manutenção e pintura dos velhos edifícios, nalguns dos quais se via o carabelho, fechadura típica que só recordo ter visto no distrito de Bragança (mais propriamente em Rio de Onor). Alguns edifícios mereciam ser recuperados, e mantidos nas suas estreitas canadas que lembram aldeias medievais, como aliás é a origem do Corvo, de casas quase encostadas umas às outras (mas com pequenas ou minúsculas passagens entre elas). A degradação do parque urbano habitacional, se bem que parcialmente explicado pela desertificação humana e emigração, carece de uma política mais proativa para a sua recuperação, pois no estado atual é um mau cartão de visitas da ilha. Vi muito (mas mesmo muito) lixo atirado para as ruas e canadas, por entre os prédios seculares, muito mais do que se esperava ver numa terra que ostenta modernos ecopontos com contentores ecológicos de separação de conteúdos. É necessário fazer campanhas de sensibilização de lixo. Um mau cartaz para o turismo.
Ao lado da assustadoramente pequena pista do aeródromo, estavam, três moinhos a serem reconstruídos, dois caiados e outro mantido com a pedra original à vista. Qual não é o meu espanto ao ouvir chamar o meu nome (ó professor! Ó professor!) e deparar com o mestre carpinteiro José Moniz, da Lomba da Maia, e o mestre José Alberto, da Lombinha da Maia, os quais costumam fazer todos os trabalhos de manutenção da minha casa. O mundo é assaz pequeno. Fiquei satisfeito por encontrar conterrâneos 1 , ali, tão longe de casa e observar o importante trabalho para que foram chamados por serem especialistas no restauro deste tipo de moinho de vela triangular, muito rara nos Açores. Uma excelente recuperação do património histórico.
O resto da estadia no Corvo foi passado em curtos passeios a pé na pequena vila, entrecortado por um almoço na Traineira, único bar e restaurante em funcionamento na ilha naquela data, depois de outro mais moderno mesmo sobre a pista de aviação ter falido. A ementa com 4 alternativas e sobremesa foi económica, 8,50€ PAX. Muito calor preencheu esta estadia. Havendo ainda tempo antes de reembarcarmos para observar a manobra de carga de gado num navio que chegara de manhã com mantimentos. Curioso ver a vaca a ser transbordada. Dantes era bem pior e mais desconfortável para os animais.
A viagem de regresso foi mais agitada, contra o vento, e ondulação mais forte com o semirrígido a bater bem na mareação. O momento alto surgiria na visita a pequenas enseadas, ilhotas e quedas de água espantosas em grutas. Senti-me verdadeiramente transportado para o cenário de Os Salteadores da Arca Perdida…
Uma rocha furada em círculo evocava o dedo de deus na costa de Toledo no norte de São Jorge, mas havia outras peças da arquitetura da natureza com uma beleza que só ela consegue.

1 Apesar de não ser nativo dos Açores, senti-me irmanado de um açorianismo que me levava a considerar conterrâneo daqueles dois vizinhos. Era quase como ver familiares num país distante.

Continua

Chrys Chrystello*

*Jornalista, Membro Honorário Vitalício nº 297713

Edit Template
Notícias Recentes
Açores com 58 zonas balneares “Qualidade de Ouro”
2 Cruzeiros trazem hoje a Ponta Delgada 8.700 visitantes
Francisco César é Candidato a Líder do PS-Açores
Doentes transferidos para o Posto Avançado da Cruz Vermelha
Zonas balneares da Lagoa distinguidas com Galardão Bandeira Azule qualidade de ouro
Notícia Anterior
Proxima Notícia

Copyright 2023 Diário dos Açores