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A Boa Nova da romaria e dos ananases na Fajã de Baixo

No local onde foi construída há uns 150 anos, para mais do que para menos, a Cadeia da Boa Nova, hoje com a designação de Estabelecimento Prisional, em Ponta Delgada, existia uma Ermida sob a invocação de Nossa Senhora da Boa Nova, que foi demolida para dar mais espaço para o então novo edifício, hoje muito velho e degradado. Segundo se sabe, seria uma Ermida pequena e modesta, como a própria designação faz supor.
Preservaram – e muito bem! – a bonita tela que representa a Senhora da Boa Nova, que curiosamente não foi transferida para a Igreja Paroquial de São Pedro, mas para a privada Ermida de Nossa Senhora do Loreto, situada precisamente no Largo do Loreto, ao início da freguesia da Fajã de Baixo.
Nos meus limitados conhecimentos, posso referir que Loreto é uma localidade italiana onde existe o célebre Santuário da Santa Casa do Loreto, mariano, alvo de peregrinação desde o século XIV. Quanto à designação Boa Nova, significa a chamada Boa Notícia de que Jesus Cristo viria ao mundo para redimir e salvar a humanidade.
Vamos agora à Ermida de Nossa Senhora do Loreto. A data de 1820, inscrita no seu frontispício, não corresponde à sua construção, pois foi concretizada a partir de 1699, por iniciativa do capitão Lourenço de Frias Coutinho. Esta família tradicional Frias Coutinho teve intervenção em vários acontecimentos históricos na ilha de São Miguel. Vários dos seus elementos, ao longo do tempo, desempenharam funções públicas. Recordo, por exemplo, Amadeu de Frias Coutinho, proprietário rural e que foi presidente da Câmara Municipal da Ribeira Grande durante vários anos antes da instauração da democracia em Portugal e que ainda hoje é recordado com saudade e consideração.
A data de 1820 que se vê na Ermida de Nossa Senhora do Loreto relaciona-se, sim, com a reconstrução da fachada, feita para a harmonizar com o solar ali existente do século XVIII e em cujo conjunto se integra, que passou por vários proprietários, mas foi a conhecida e ilustre família Cymbron Borges de Sousa que durante mais tempo ali se fixou, tendo também vários dos seus membros desempenhado papéis importantes na vida pública açoriana, como foi o caso do engº Augusto de Oliveira Cymbron Borges de Sousa. O conjunto arquitectónico em referência está classificado como de “interesse municipal”.
A atual proprietária, senhora dona Margarida Read, foi quem recuperou a tradição da romaria à Senhora da Boa Nova, cuja imagem em tela exposta no interior do pequeno templo, atribuída a André Reinoso, remonta ao início do século XVII. Reinoso foi o primeiro pintor barroco português e esteve ativo entre 1610 e 1641. Existem pinturas dele em vários monumentos religiosos no nosso país: Mosteiro dos Jerónimos, em Lisboa, Convento dos Capuchos, em Sintra, e Convento do Carmo, em Moura. Em Lamego e em Óbidos também existem obras atribuídas a este famoso pintor. Portanto, é obviamente valiosa a tela representando a Senhora da Boa Nova que se encontra guardada e preservada há muitos anos na Ermida de Nossa Senhora do Loreto, na Fajã de Baixo, a “capital” do ananás micaelense.
A Ermida de Nossa Senhora do Loreto é também conhecida como Ermida de Nossa Senhora da Boa Nova, pelo facto, precisamente, de lá estar a referida tela representando a Senhora da Boa Nova e que veio, como assinalei, da antiga Ermida da Senhora da Boa Nova que existiu onde hoje se encontra o Estabelecimento Prisional de Ponta Delgada.
Eu ainda gostaria de dizer que os velhos estufeiros das estufas de ananases mais próximas da Ermida de Nossa Senhora do Loreto, ao aproximar-se a celebração da Senhora da Boa Nova, diziam com alguma graça que “a Senhora da Boa Nova está puxando pela fruta”, querendo dizer que os ananases estavam quase prontos para a colheita e para serem vendidos. Quando se realizava a romaria já mencionada, que esteve interrompida durante vários anos, surgiam ananases à venda nas tabernas e mercearias das redondezas ou junto aos portões de prédios de estufas.
A tradicional romaria anual da Senhora da Boa Nova, que se realizou no dia 1 deste mês, é um momento de culto e de festa, com a participação tanto de moradores da Fajã de Baixo como de outras localidades da ilha de São Miguel, que ali encontram um bálsamo para os problemas da vida. Este é o meu modesto contributo para a tradição da Senhora da Boa Nova na Fajã de Baixo, onde nasci há 65 anos.

Tomás Quental Mota Vieira

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