“Não se referiu ao estado da cozinha e do refeitório que, presumimos, por se situarem na ala poente, e relativamente perto do foco de incêndio, estarão inoperacionais (…)”
Na última semana tivemos duas notícias de conteúdo muito significativo, a propósito da requalificação e construção de Unidades de Saúde do SNS que, infelizmente, não encontram qualquer correspondência na nossa Região.
“A ministra da Saúde, Ana Paula Martins, e o ministro Adjunto e da Coesão Territorial, Manuel Castro Almeida, assinaram os contratos para a construção e requalificação de 68 centros de saúde, num investimento total de 70,2 milhões de euros, dos quais 44,191 milhões para novos equipamentos e cerca de 26 milhões para a beneficiação de existentes.
Estes projetos fazem parte do total de 124 novos centros de saúde, num investimento de 272,8 milhões de euros, e a requalificação de 347 unidades já existentes, orçada em 274,9 milhões de euros…num total de mais de 547 milhões de euros para infraestruturas de cuidados primários.”
in HEALTH NEWS,4/6/24
“O Tribunal de Contas (TdC) deu o chamado visto prévio à Parceria Público-Privada (PPP) para a construção e manutenção por 30 anos do novo Hospital Lisboa Oriental,….mas o parecer agora conhecido revela afinal que o tribunal ‘sugere’ uma “firme, incisiva e solene advertência à entidade fiscalizada (…) a incluir no projeto de execução da obra, também, a solução de sistema de isolamento de base, para além de garantir um sistema rigoroso e eficaz de monitorização do projeto de estruturas e fundações”.…O não acautelamento destes riscos, acima descritos, num país, como o nosso, com um traço geológico tão impressivo na nossa história, não pode ficar a pairar sobre a responsabilidade dos decisores e também sobre quem tem o dever público e constitucional de fiscalização jurisdicional de um contrato com este alcance financeiro e estrutural. Sendo que não parecerá suficiente considerar que este aspeto será de novo analisado na fase de revisão por terceira entidade na fase de elaboração do projeto de execução”, insistem os relatores, os juízes-conselheiros Nuno M. P. R. Coelho e Miguel Pestana Vasconcelos.”
in ECO, 7/6/24
- E por cá, o que se passou nesta última semana?
Tivemos a Senhora Secretária na Comissão Parlamentar da Saúde a dar explicações a questões levantadas pelos Senhores Deputados, afirmando que, afinal, está tudo bem (pelo menos do meio do hospital para nascente), nas condutas de ventilação e A/C, no sistema de distribuição de águas sanitárias, na rede de esgotos, na cabelagem da rede de comunicações internas, nos equipamentos laboratoriais e de Radiologia, e que até já vai ser possível reabrir o conjunto de enfermarias da ala nascente com 178 camas.
As sedes dos equipamentos de Laboratórios, de Radiologia e a maioria das Consultas Externas situam-se na área central do corpo do edifício e estão igualmente operacionais. Não se referiu ao estado da cozinha e do refeitório que, presumimos, por se situarem na ala poente, e relativamente perto do foco de incêndio, estarão inoperacionais (como vão ser alimentados os doentes e profissionais e qual o tempo previsível para a superação desta impactante dificuldade infraestrutural?) E, como tinha aventado antes, avançou com a revelação de um plano para a concretização, a curto prazo, da construção de uma Unidade Modular, nas áreas do heliporto e envolventes, que irá dispôr de um Serviço de Urgência, Unidade de Cuidados Intensivos, Blocos operatórios (2?) e, ainda, de enfermarias para alojamento de 100 camas e respectivos doentes. Com esta estrutura montada, e a funcionar, a primeira das medidas de reconstrução do HDES-clínico (a outra, diz respeito às partes do edifício ardido e que aloja os PTs, geradores e armazéns gerais) está em vias de avançar e tem como pano de fundo “a necessidade de fazer regressar ao perímetro do HDES importantes estruturas de cuidados médicos e força de trabalho…e de nos libertarmos da ocupação na CUF”, disse ela. Atrás do pano estará então a primeira das “janelas de oportunidade”: uma profunda reconstrução das mesmas estruturas no seio do hospital – muito, pouco ou nada afectadas, não o sabemos -, o núcleo duro da dita “renovação e modernização do HDES”. Será este, portanto, o figurino do “Hospital-HDES Novo”, o tal que será para os próximos 30 anos? O anúncio velado deste plano um pouco requentado (em parte, apresentado pelo governo PS, em 2016, e duramente contestado pelo PSD da altura), cujo estádio de desenvolvimento se imagina inicial, pode prenunciar um período prolongado de um hospital amputado de componentes determinantes do seu corpo (só compensados parcialmente com a Unidade Modular). Mais uma vez esperamos informações e esclarecimentos cabais para tais soluções -já que se vão gastar muitos milhões – nomeadamente, sobre se estarão garantidas as condições que o TdC, apoiado na excelência de opinião de peritos chamados ao assunto, sugere fortemente para a construção do novo Hospital Lisboa Oriental. Aqui, por razões de força ainda maior, conhecidas que são, à saciedade, os defeitos estruturais graves e congénitos do nosso hospital. - Uns dias mais tarde voltámos a ter a Senhora Secretária, agora a reunir com os sindicatos médicos. Segundo o jornal AO “o encontro serviu para “estabelecer um protocolo negocial, e o respetivo calendário”, visando alcançar um acordo que “permita a valorização profissional dos médicos e a melhoria das suas condições de trabalho”. Curioso constatar – por nos parecer a destempo – que neste momento de grande aflição e debilidade do SRS, em termos de condições dos cuidados assistenciais prestados aos doentes e, também, de défice de condições de trabalho dos profissionais, haja premência nesta preocupação e disponibilidade dos Sindicatos Médicos e da Senhora Secretária para discutirem as matérias anunciadas. Como se estivéssemos em tempo de perfeita normalidade existencial. Tudo bem!
Será que esta retoma de negociações também conflui para o desenvolvimento conceptual da(s) “Janela(s) de Oportunidade?”. Na nossa opinião, outros aspectos, talvez bem mais importantes de momento, poderiam assegurar a inversão presente e futura da “diminuição dos direitos laborais dos médicos e da deterioração dos cuidados de saúde aos utentes” e, por isso, constituírem-se como mais que necessários motivos de ponderação, de diálogo aberto e transparente.
É o que pretenderemos abordar em escritos próximos (cont.).
Guilherme Figueiredo*
*Reumatologista, ex-Director do Serviço de Reumatologia do HDES/
Dir. Executivo da CAL-Clínica